Aryn saiu da tenda sem acordar os dois homens que dormiam. Ao chegar ao lado de fora da tenda, uma onda de cheiro de morte e podridão invadiu a Deusa. Aryn abraçou o próprio corpo quando se arrepiou com a sensação da morte passar pelo seu corpo. Ser Deusa da morte significava sentir quem morria perto de si e neste momento várias almas deixavam o mundo para se juntarem ao desconhecido.
- Não devias estar a dormir? – Perguntou Aryn para o anjo que estava encostado a uma árvore.
- Digo-te o mesmo.
- Decidi dar um passeio, qual é a tua desculpa?
- Eu nunca consigo dormir depois de uma batalha, muita informação para processar. – Respondeu Rohan com as mãos feridas.
- Queres acompanhar-me num passeio noturno?
Rohan assentiu e seguiu Aryn pelo acampamento, como a seguiu no passado e vai seguir no futuro. Durante uns bons minutos o anjo e a Deusa caminharam em silêncio.
Aryn observou o anjo ao seu lado, o cabelo azul clarinho agora parecia mais branco que azul, continuava curtinho como no passado, a barba azul congelante já ligeiramente grande, os olhos roxos que brilhavam com a luz da lua. Rohan passou a língua pelos lábios o que chamou a atenção da Aryn que em tempos faria de tudo para sentir a textura deles contra os seus lábios, mas que agora não causavam nenhum efeito na mente e corpo dela.
- Eu amo-te Rohan! – Aryn parou a meio do caminho. – Não da maneira que eu te amei há vinte anos atrás, é mais amor de irmão.
- Eu sei, tu amas o Rafy, ele é quem realmente amas.
- Como é que sabes?
- Os teus olhos brilham quando vocês estão juntos, se antes eles brilhavam comigo, então agora, com ele, é como se houvesse estrelas no teu olhar.
Aryn pensou por alguns segundos, tinha acontecido muito desde que ela tinha saído da prisão. Ela não era a mesma inocente que foi presa durante anos, ela era uma besta pronta para atacar e esfomeada por sangue.
- Eu precisei de muito tempo para entender os meus sentimentos e tu em um mês percebeste-os. Até precisei de partir o pescoço da Ollein para perceber.
- Espera um segundo, tu partiste o pescoço da Deusa da verdade?
- Sim. – Aryn deu de ombros como se fosse normal.
- Ela está morta!?
- Estamos a falar da Ollein, aquela mulher não morre facilmente como Perfesios.
- Podes explicar o que aconteceu? – pediu Rohan.
Aryn explicou tudo ao anjo, desde a transformação até o encontro com Ollein, omitindo certas partes, como o que aconteceu naquela noite nas profundezas. No final, ambos continuaram a caminhada, mas desta vez era Aryn que seguia Rohan.
O sol começava a nascer entre as montanhas dando uma cor alaranjada ao céu, como se estivesse a pegar fogo.
- Então tu tens asas... - Rohan espreitou, rapidamente, para as costas da Deusa, mas não viu nenhum indício de asas.
- Eu tenho, muita coisa muda na minha segunda forma. – Aryn tocou na ponta dos dedos como se ainda pudesse sentir o ferro frio.
- Posso vê-las? – Rohan perguntou, quando já estavam perto da tenda dele.
Aryn mexeu os ombros como se tivesse a preparar e então enormes asas apareceram abertas mostrando a beleza e o horror.
Quando Aryn abaixou as asas, Rohan tocou nelas gentilmente sentindo a textura suave e fria na ponta dos seus dedos calejados.
- Elas são lindas. – Comentou Rohan baixinho admirado com o que tinha a sua frente.
As asas eram negras, mas tinham nervuras que aparentavam ter uma luz roxa que percorria toda a extensão das asas.
- Combina contigo, Deusa da escuridão e da morte, seria estranho se não fossem de outra cor. – brincou Rohan olhando para Aryn.
Aryn ia falar, mas viu Mirian a sair da tenda do casal e sorriu para ela.
- Descansa um pouco, temos que partir para Briliones. – Murmurou Aryn antes de abandonar o anjo.***
- Vamos tentar isto uma última vez, temos duas horas até a partida para Briliones e eu não saio daqui até ficarmos ligados. – Falou Aryn olhando para os olhos dourados do dragão, o mesmo bufou soltando o ar quente. – Fedorento.
"Vamos ser sinceros desta vez?"
- Eu sempre fui sincera, ruivinho. – Aryn olhou indignada para a criatura enorme, já ele olhava séria enquanto inclinava a cabeça para o lado direito. – Ok, já entendi. Sinceridade total.
"Olha para os meus olhos e vê aquilo que tens que ver"
Aryn concentrou-se no ouro do olhar do Rafy e deixou-se levar pela magia que corria entre ambos. Ela não esperava ver aquilo que viu.
Os olhos verdes da mulher brilhavam enquanto esta sorria para o Rafy, ela estava nua só com um lençol a tapar o seu belo corpo. O sol entrava no quarto e batia no cabelo negro dando um certo brilho, e o som dos pássaros a cantar davam uma alegria ao ambiente.
A mulher beijou Rafy com paixão e ternura, as mãos do dragão pousaram nas bochechas da Deusa.
- Eu amo-te Aryn Mournmoon.
Aryn voltou ao normal chocada e cheia de questões.
"Tua vez de te revelares Deusa" Rafy sentia-se aliviado por ter exposto os seus sentimentos para a mulher de cabelos negros.
- Aqui vai tudo ou nada!
Ambos se voltaram a concentrar e rapidamente a magia fez o seu trabalho.
Um enorme campo de Delias balançava conforme o vento, Aryn andava sentindo as ervas nos seus pés descalços e as Delias tocarem a ponta dos seus dedos.
- Devíamos voltar para dentro de casa, estão todos a nossa espera.
Quando Aryn voltou-se para a voz atrás dela, o homem sorriu ao ver a sua esposa com uma barriga grande. Aryn pegou na mão do homem e ambos entraram na pequena casa que era aquecida por uma lareira.
- Finalmente, já estava a morrer de fome. – Naxos falou.
Todos se sentaram a mesa. Naxos, Hoddy, Fauser, Rohan, Mirian, o pequeno Jon, Sanrya, Brisana, Caspian, Mor, Haus, Azessian, Aryn e Rafy. A família dela, os únicos que ela precisava para se sentir feliz e livre.
- Em breve vamos ter que aumentar a mesa. – Brincou Hoddy referindo-se ao bebé que crescia na barriga da Deusa.
Rafy pousou a mão na barriga da sua esposa e sorriu para a mesma orgulhoso dela.
Quando a visão do desejo mais íntimo da Aryn se quebrou o dragão sorria com o olhar.
Uma onda de magia atravessou o corpo de ambos e de certa forma, ambos começaram a sentir algo amplificado entre os dois.
- Como um só. – Sussurrou Aryn lembrando-se do livro que leu.
"Agora se tu morreres, eu morro, mas se eu morrer tu continuas a viver na dor de perder o teu dragão." Explicou Rafy antes de voltar à sua forma normal.
- Tu tens muito para explicar, ruivinho.
- Não sou o único, Deuses não querem filhos ou casas pequenas. – Brincou o homem ruivo.
- Talvez eu seja uma falsa Deusa como os habitantes de Windrom pensam.No final o que parecia tão complicado como criar uma certa conexão con o parceiro, acabou por ser a coisa mais simples e aliviante. O que é um parceiro? Não é um marido, isso é certo, mas muitos acabam por se apaixonar é verdade. Mas um parceiro, é um melhor amigo, um confidente, alguém que possas confiar de olhos fechados e que possas rir até a barriga e as bochechas doerem. Um parceiro é alguém que esteja lá a te segurar a mão no teu último segundo e que te diga que tudo vai ficar bem.
Aryn olhou para o belo rosto do Rafy e sorriu de felicidade e paixão, quando o dragão ia tomar a iniciativa de beijar a mulher de cabelos negros, alguém os interrompeu.
- Está na hora de ir. – Avisou Azessian.
- Eu só não te mato neste momento porque fazes falta para ganhar esta merda. – Rosnou Rafy.
- O que é que eu fiz?
- Esquece Az, ele deve ter acordado com os pés fora da cama. – Aryn riu-se. – Vamos meus queridos, temos Deuses para matar e cabeças para arrancar.
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Para Além das Sombras
FantasiaSinopse: Aryn estava habituada à escuridão da sua cela e à companhia de quatro homens que não tinham onde cair mortos. Uma noite enquanto a realeza festejava, eles fugiram. Na sua luta pela liberdade, Aryn morreu nos braços do homem que ela pensava...