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Janet

Yeosu, Dezembro de 1685

Taehyung tomou seu espaço e virou-se em direção a janela do fim do corredor. Meus ombros relaxaram e consegui respirar sem ser jugada pelos olhos escuros e afiados do Kim. Ainda estava no mesmo lugar e curvei a atenção para meu corpo rígido, recostado na cômoda. Não senti até aquele momento minhas unhas forçando contra a madeira maciça do móvel. Podia perceber filetes pontiagudos nas pontas da pele fina.

─ Pinta?

Kim tocou nas pinturas e encarou os desenhos feitos por minha mãe, emoldurados em armações douradas. Eram fragmentos de lugares das nossas terras. Ela pegava seu banco, sua tela, os pincéis e as tintas e me levava para um ponto diferente. Por sua vontade, toda a fazenda estaria gravada em telas, mas não teve tempo para terminar.

─ Gostaria, mas não. Só aprecio.

Omiti a autoria e ansiei que não o questionasse. O sentimento de estar desprotegida e vulnerável me descontrolava e não permitia que desse um passo de onde estava, nem falasse sobre coisas que me eram especiais. Nossas fraquezas são detalhes a serem postergados. Não pretendia dar-lhe as minhas.

─ São lugares das nossas terras, caso queira conhecer.

Continuei a insistir em algo, ele gostava de caçar. Nossas terras eram ótimas para isso. Aqui o faria ser menos infeliz? Se Kim não estivesse satisfeito com as circunstâncias, nada seria razoável para mim. A estabilidade de um marido refletia na sua família.

─ Terei muito tempo para isso.

Taehyung não expressava seu estado emotivo. Sucedia em manter sigilo de suas opiniões na face tesa, mas sua voz entregava algo para mim. Estava zangado, sua voz tinha um tom abaixo do normal e forçava em sílabas que não havia entonação, mas ele a colocava. Inclinei o rosto para esconder minha surpresa. Eu poderia lê-lo por sua voz, talvez ele nem percebesse seu descuido.

─ Eu também. Se me der licença. Devo me recolher.

Cruzou o pequeno espaço que havia entre mim e a parede do corredor e seu cheiro ficou no ar. Parecia ser de poucas palavras, ou só talvez não quisesse manter diálogos com uma desconhecida. Tomei meu caminho e roguei aos céus para conseguir lidar com aquele jantar. Tinha uma certeza em mente, poderia desvendá-lo se o ouvisse bem, mas para isso, ele precisaria fazer algo muito simples: falar.

As horas se passaram lentamente enquanto me mantinha reclusa entre as paredes do quarto. Dália indagava muitas coisas sobre a família e minha resposta sempre era vaga. Ainda havia muito a se desenredar. Quando tomamos os devidos lugares na mesa com todos já famintos, ficamos ansiosos para provar a comida que tomou a sala com o maravilhoso aroma.

─ Querida, você vai se apaixonar quando conhecer meus netos. São as coisinhas mais preciosas do mundo. Às vezes, esqueço que já sou uma avó.

Soyah tinha brilho em seus olhos quando falava sobre os netos e apenas pude sorrir em retorno. Eles apreciavam bastante sua terceira geração e não escondia o intuito de aumentarem esse número com o filho mais novo. O almoço estava ocorrendo de uma forma tolerável e sempre tinha um assunto a ser discorrido.

─ Qual o nome deles?

Apenas nós duas tínhamos alguma interação enquanto os homens comiam silenciosamente. Kim não olhava em minha direção para nada e mantinha a cabeça inclinada.

─ Benjamin e Melina.

Não tinha tanto contato com crianças, já que limitava meus passeios apenas ao campo, mas possuía um desejo singelo de ser mãe algum dia e dar amor a meus pequenos. Entretanto, queria que fosse de maneira natural e desejada pelos dois, não seguindo uma linha de obrigação, muito menos com um marido tão insípido.

MARQUESA • kthOnde histórias criam vida. Descubra agora