Capítulo 32

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CARLA 

Abro os olhos tentando me acostumar com a luz solar que já invadia todo o meu quarto, e agarro os lençóis com força ao sentir as lágrimas ameaçarem cair novamente. Eu havia perdido completamente a noção de quanto tempo havia passado chorando, mas até agora dormir havia sido a única forma de fugir do sofrimento que parecia esmagar meu coração. Tudo em mim doía, e respirar começava a se tornar uma tarefa mais do que difícil. Durante esse tempo eu tentei fugir do meu passado, acreditei que poderia ser verdadeiramente feliz, mas agora percebo que isso sempre foi apenas um sonho bobo. Não importa o quanto eu tente ou lute, o inferno em que vivi há anos atrás sempre voltará a me perseguir por onde quer que eu vá, e não posso arrastar Arthur comigo para o abismo onde estou destinada a cair. Relevar o meu passado além de me fazer lembrar de tudo o que passei, me mostrou que nunca poderei ser a mulher que Arthur merece ter. Nunca serei a mulher que teve uma infância feliz, pais amorosos e uma família estruturada, muito pelo contrário. Serei a mulher que foi abandonada pela mãe, abusada pelo pai e aterrorizada pelo sangue que ainda tenho em minhas mãos. Arthur havia trazido a luz que nunca imaginei ter em minha vida, mas o seu amor só me lembrava o quanto eu não o merecia.

Me obrigando a reagir respiro fundo e me sento na cama, não demorando a caminhar em direção ao banheiro. Cada gota de água que caía em minha pele parecia queimar todo o meu corpo, tornando a minha dor ainda maior. Por um momento fecho os olhos e abraço a mim mesma, sendo atingida logo em seguida pelas lembranças que haviam alimentado a minha esperança de um dia poder ser feliz. Eu lembrava do exato momento em que vi Arthur pela primeira vez naquele quarto de hospital. Lembrava da forma como seu olhar parecia ser o único a me transmitir segurança, e de todo o processo que passamos até eu me sentir pronta para toca-lo pela primeira vez. A verdade é que parte da minha aversão ao toque masculino nunca foi somente de ser machucada novamente por um homem, mas sim de ser obrigada a ferir alguém de novo. O que havia acontecido naquela fatídica noite não havia tirado somente a vida do monstro que um dia chamei de pai, mas sim uma parte de mim mesma que talvez nunca pudesse ser recuperada. Eu chorava por tudo o que havia acontecido comigo, por perder Arthur e por saber que jamais seria boa o suficiente para ele. Eu nunca conseguiria aceitar o seu amor, e ainda chorando sinto meu corpo fraco desabar até o chão do banheiro molhado com a água que caía do chuveiro e com as lágrimas que banhavam todo o meu rosto.

Tudo para mim parecia ter perdido o sentido, e após o que pareceu um século ajoelhada ali, volto a caminhar até o quarto antes de vestir uma peça de roupa qualquer. As paredes ao meu redor pareciam roubar todo o meu ar, e em um tentativa desesperada de conseguir voltar a respirar saio de casa, não demorando a iniciar uma longa caminhada. Eu não sabia para onde estava indo, mas após andar sem rumo durante horas, me vejo parada em frente a casa de Mara. Todo meu corpo parecia ter sido anestesiado, mas sentindo que desabaria há qualquer momento toco a campainha, vendo a porta se abrir para mim logo em seguida. Automaticamente vejo o sorriso de Mara desaparecer bem diante dos meus olhos ao ver o estado em que eu me encontrava, e sem suportar mais toda a dor que parecia me consumir de dentro para fora, me lanço em seus braços sendo acolhida imediatamente pelo calor de seu abraço. Eu chorava pela forma como havia conhecido a maldade do mundo desde cedo, pelo jeito que a vida continuava a me lembrar de que eu não havia nascido para ser feliz, e por finalmente perceber que a causa de toda essa angústia não é por ter perdido o homem por quem estou apaixonada, mas sim por ter perdido o homem que eu amo. Pois mesmo não o merecendo, essa é a verdade. 

Eu amo Arthur Picoli!

- Querida, o que aconteceu? Por que você está chorando tanto, meu amor?

- E-Eu o perdi! Eu p-perdi o Arthur! 

NARRADORA

Completamente espantada com aquela notícia a mais velha puxa a loira para dentro de casa e a senta no sofá enquanto tentava acalma-la.

Fire - CarthurOnde histórias criam vida. Descubra agora