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Bom dia?

Mil ossos se partindo.

Parecia que tudo em meu corpo estava fora do lugar e não obedecia as minhas ordens.

Eu sentia meu rosto molhado e sabia estar mergulhada em lágrimas, mas estava tudo dormente demais.

Sempre tive raiva das mulheres em vídeo que vi gritar de dor durante o parto e pensava no quanto deveriam tentar ser mais discretas, mas agora minha garganta ardia e tudo o que eu queria era que...

-Alguém tira essa coisa de dentro de mim! - berrei no meio da dor.

Me chame de escandalosa se quiser, não é você que está colocando um bebê para fora pela vagina.

Eu passei a porra do dia inteiro e da noite anterior em trabalho de parto. Minha bolsa estourou às três horas da manhã e por volta das quatro da tarde me levaram para a sala de parto, agora eu estava no inferno com um anjo segurando minha mão.

-Ei, eu estou aqui - ouvi a voz suave de Carina ao meu lado.

Como caralhos ela conseguia estar tão calma com o mundo acabando aqui?

Ah, sim..

-Então coloca essa porra pra fora no meu lugar, caralho - gritei, mas o máximo que consegui de Carina  foram suas sobrancelhas erguidas antes que ela se abaixasse e no exato segundo em que uma nova contração me partia ao meio, beijou minha testa.

Não tenham filhos.

Repetindo minhas instruções no começo disso tudo: não transem com idiotas que não saibam usar a droga de uma camisinha.

-Empurre junto com as contrações, Maya. Vamos, está quase lá - a voz de fundo do meu filme de tortura orientou.

Eu estava suada, pegajosa e aberta, sendo rasgada até a alma por aquela criaturinha que carreguei por longos nove meses.

Era assim que ela me agradecia por todo o cuidado e abrigo que dei?

Que merda as pessoas tem na cabeça de dizer que esse é o momento mais lindo de suas vidas?

Olhei para cima e flagrei um olhar estranho de Carina mudar para neutro ao encontrar meus olhos. Era quase uma tristeza...

Então, junto a mais um grito de dor, me dei conta de que aquela seria a última vez que a veria.

Minha doce Carina  iria embora e minha vida voltaria ao que era antes do conto de fadas mais bizarro já pensado pela humanidade.

-Mais uma vez, Maya, quase lá! - já estavam falando aquilo há o que... quatro horas? Quatro dias?

Me joguei novamente na onda da contração - talvez esteja ficando boa nisso - e gritando pensei ter ouvido um "eu te amo" murmurado pela voz rouca onde me agarrava.

Minhas pernas fraquejaram e se me mandassem empurrar de novo eu mandaria para a puta que pariu porque já não tinha mais forças, eu só queria chorar e mandar o mundo parar.

Por que tudo tinha que ser tão injusto?

E então eu ouvi um gritinho, algo como um miado de gato.

O que um gato estava fazendo no meu local de parto? Isso não era nada higiênico.

-Aqui está ela! - ouvi, completamente confusa.

-Hora de nascimento: dezessete horas e vinte e seis minutos.

Houve uma movimentação diferente e estranha no quarto, as pessoas indo e vindo apressadas, Carina  com uma expressão assustada, quase como se estivesse se dando conta naquele exato momento de que estava no século vinte e um, em uma sala de parto do nascimento da própria filha.

Espere...

Meus olhos se encontraram com os de Carina, que estavam cheios de lágrimas, o miado como som ambiente do momento.

-Maya... - ela murmurou e eu neguei com a cabeça - Maya...

-Não.

Perto de Carina estava o carrinho onde eles levavam os bebês para lá e para cá no hospital. Eu não queria olhar, pois sabia o que estaria lá.

Mas olhei.

Era um pacotinho de tecidos cor de rosa típico do hospital, uma cabecinha vermelha de fora e quase nada de cabelos claros.

-Maya , nós..

-Não! - a interrompi, erguendo os olhos para Carina e piscando rápido tentando inutilmente segurar as lágrimas - vá, por favor, só vá...

Duas grossas lágrimas escorreram pelas bochechas de Carina quando ela piscou.

-Você...

-Não.

-Maya...

-Vá!

-Maya ...

-Vá! - implorei, mal a vendo por causa das lágrimas - por favor, a leve. Só vá...

A vi assentir enquanto recuava, a bebê indo a frente.

-Carina  - a chamei antes que cruzasse a porta e ela parou, derramando um rio de lágrimas de seus olhos castanhos.

Eu sabia que não precisava e não haviam dúvidas, mas eu tinha que ouvir mais uma vez diretamente de sua boca.

-Promete que vai amá-la?

Um sorriso frágil tremeu nos lábios de Carina .

-Com todo meu amor, Maya Bishop, eu prometo - me disse e com isso, me lançando um olhar de quem implorava para que eu a chamasse novamente, Carina Deluca se foi, eu não a chamei e a porta cerrou nosso contato permanentemente.

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Vão me matar?

Tem um epílogo ainda e depois nos encontramos  na segunda temporada 😬😉

With All My Love ( PRIMEIRA TEMPORADA) Onde histórias criam vida. Descubra agora