— Oi. — Me aproximo de Helena, passando a mão pela bancada ainda sem graça.
— Oi, e aí? — Seus olhos desviam do celular, mostrando que já estava esperando por mim. — Ele já foi?
— Sim, tem dois eventos ainda hoje.
— E aí, vai me contar ou eu vou ter que ficar perguntando?
Meu rosto não nega nada do que estou sentindo.
— Acho que vou explodir — Falo sentindo o meu sorriso chegar às orelhas — Tenho que me preocupar?
— Só em contar cada detalhe para mim. — Ela para e pensa por alguns segundos — Não exatamente cada detalhe... só conta tudo o que aconteceu antes de eu chegar.
Dou pulinhos animados, sentindo o meu rosto quente. Parece que quanto mais eu falo, menos frases eu consigo formar.
Gargalhamos com cada frase que eu formo e misturo com o inglês, atrapalhada.
— Ele foi delicado e ao mesmo tempo seguro...
— Masoquista?
— Um pouco. Mas acho que ele me colocou mais como prioridade, sabe? — Sento na bancada, ficando ao seu lado.
— No prazer?
— É, né! Ele quis me satisfazer primeiro... e foi tão maravilhoso.
— Gente! Além de bonito e rico, o menino é talentoso em tudo?
— Eu sei que não é nada concreto, mas o jeito que ele me trata e, na maioria das vezes, me coloca como prioridade... isso me deixa tão confusa.
— Calma, calma. Você está confundindo já as coisas. — Ela gesticula com as mãos. — Vocês estão tendo um lance, ok. Mas isso não quer dizer nada, Made.
— O que você quer dizer?
— Não quero ser pessimista, mas por um lado a Thalita tem razão. Não quero te ver mal Madelyin, então não fica imaginando coisa.
— Eu já disse, não quero nada também. Só tô deixando as coisas irem normalmente...
Ela se levanta e pega um refrigerante e o seu pão dentro no eletrodoméstico.
— Além disso, você contou para ele?
— Sobre? — Seu rosto fica sério. Eu sei exatamente o que é. — Ainda não. Depois eu conto, não é nada demais mesmo.
— Madelyin. É uma doença séria.
— Helena, eu sei.
Me levanto e vou até a cafeteira, pegando uma caneca cheia de café. Caminho até o meu quarto e olho ao redor, onde estava a minutos atrás feliz.
De repente toda a alegria e energia somem. O meu corpo se apaga e o meu humor evapora.
Como eu odeio isso.
Doença.
Que palavra mais feia.Pego o meu antigo diário, onde a minha terapeuta pediu para que eu escrevesse sempre que me sentisse solitária ou mal.
Não estou solitária, agora menos do que nunca. Mas é só pensar em leucemia e o meu subconsciente chora.
Não escrevo, me perco na mensagem que Hariel manda.
"Queria ficar mais tempo com você. Tá foda."
— Não consigo. Não vou conseguir — Volto para a sala, fazendo Helena tirar os olhos do livro.
— O que, exatamente? — Ela arqueia uma sobrancelha.
— "Não Hariel, não se apega muito a mim. Tô fazendo tratamento para Leucemia Mieloide crônica dês dos meus sete anos de idade" — Meus olhos se enchem de lágrimas — Não dá Helena, ele não merece.
Seu rosto é tomado por lágrimas, assim como o meu. Ela se levanta e me abraça.
Normalmente, sempre que eu precisava, ligava pelo Skype para ela. Eu ordenava que ela engolice o choro e só me escutasse sempre que tinha novidades nos tratamentos, ela nunca foi de fazer o que eu pedia.
— Eu sei, Made. — Ela funga — Mas dessa vez vai dar certo, quer dizer, já está dando. Está reagindo bem aos medicamentos, o transplante foi um sucesso, pôde até beber duas vezes!
— E por que eu sempre tenho que voltar nesse assunto com alguém? — Seguro o choro, olhando para cima — Ele me trata tão normal, não tem dó de mim.
— Porque é o junto. — Seu olhar é firme. — Você está bem, mas se por alguma eventualidade alguma coisa acontecer e ele estiver com você, ele vai saber.
— Não vai acontecer nada.
— Made, eu te amo, mas se você não pretende contar, então eu conto.
— Deixa de ser dramática.
— Então acaba com isso Madelyin. Se acha que é drama, deixa o menino ficar com quem não minta para ele. Eu acho melhor do que acordar e te ver suando e tremendo, sem saber o que fazer. — Seus olhos me encaram, sérios. — Os efeitos colaterais estão vindo, exatamente como os médicos falaram. O seu corpo vai ficar bem, mas antes ele vai te enganar a ponto de te enfraquecer.
— Eu já sei, Helena! Não precisa ficar me lembrando disso. — Me afasto.
— Eu prometi para os seus pais. O seu problema é que você não aceita que é doente! — Seu tom aumenta. — Essa é a pior mentira. Não está tudo bem, vai ficar, eu acredito que vai, mas até lá aceite e lide com isso.
Não falo nada, afinal, eu sei que ela está certa.
Tenho um tipo de Leucemia rara, não para os adultos, mas para uma criança.
A única terapia curativa para a Leucemia Mieloide Crônica ainda é o transplante de medula óssea alogênico. Desde criança comecei a fazer quimioterapia, sem sucesso.
Eu sei, eu sei. Estão se perguntando como uma criança de seis anos conseguiu... a resposta é, talvez, milagre.
Há quase dois anos atrás, fiz o transplante de medula óssea alogênico, e deu certo. O único problema são os efeitos colaterais.
Eles não tem data exata, mas tenho grandes chances de começar a ter agora, vinte meses depois.
O efeito colateral mais grave do transplante alogênico é a doença enxerto hospedeiro. Isso pode ocorrer quando as células do doador reconhecem as células do receptor como estranhas e iniciam um ataque contra elas, afetando muitos tecidos do corpo.
Bom, em relação às células do doador negarem o meu corpo, eu estou livre de qualquer problema, os médicos me garantiram. Até porque, eu nem estaria aqui caso isso acontecesse.
...
Já podemos nos formar em medicina? Que doideira, né. (obs: os efeitos colaterais mencionados não são reais. Pelo menos não que eu saiba, não confirmei em sites seguros).

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HIPNOSE
RomantizmMadelyn se apaixona mais pela cidade quando encontra motivos para permanecer. +14 | +16 28 capítulos - concluído. //2022