Capítulo 4 - Solidão

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Tinha noites, quando eu estava mal, me sentindo pra baixo, ou com raiva, eu acabava descontando em mim mesmo, me mutilando com cortes no meu braço, causados por minhas próprias unhas ou com qualquer objeto cortante que eu encontrasse. De alguma forma, isso me fazia sentir melhor, a dor física me fazia esquecer um pouco a dor psicológica, não tem dor pior que essa, ninguém nunca notava como eu estava, nem ao menos percebiam as marcas no meu braço.

Dia 03 de março de 2014. De alguma forma a confusão entre o Dani e o Junior por causa da Nichole serviu para aumentar a popularidade do Junior, ele agora tinha mais amigos, até o Caô "Carlos Otávio" que adorava zoar ele tinha virado amigo "eu acho que o Caô achava que o Junior era gay, depois do beijo na Nichole, ele mudou de idéia". Eu até tentei acompanhar ele, mas essa nova turma dele já não tinha nada a ver comigo.

O professor entra na sala - formem duplas - Vou fazer com o Junior, eu pensei, ele já estava com um dos novos amigos dele, tudo bem, vou com Nichole, tava a Babí, é claro, já sei, a Jude, quem era aquela garota que estava com ela mesmo, há não importa, eu estava sozinho de novo, devia saber que isso iria acontecer, eu sempre acabava ficando só, parece que o problema era eu, porque em todo lugar era assim, mas eu não podia ter raiva de mim, então eu tinha que odiar todas as outras pessoas.

No fim das contas, outro garoto também ficou sem dupla, mas por que ele preferiu fazer sozinho, era o Dani, ele até preferiu fazer sozinho, mas o professor colocou a gente em dupla, droga, eu pensei.

Na saída...

- Dani, agente pode fazer o trabalho hoje na sua casa...

- não, na minha casa não, a gente faz amanhã na sua.

- por que não pode ser na sua?

- porque não, não importa, não vai ser na minha e pronto.

Chega um carro preto, com um cara dentro.

Dani: - vô nessa.

- é seu pai?

- não interessa.

Essa noite foi uma daquelas noites ruins, mas no dia seguinte alguém percebeu. Quando eu estava saindo da escola a Nichole mim pergunta...

- o que foi isso no seu braço?

- an... nada, não foi nada.

- Gabriel, ninguém se machuca desse jeito por acaso, foi você?

- eu não quero falar sobre isso.

- mas você precisa, eu achei você diferente hoje, você geralmente é tão bem humorado, o que tá acontecendo?

A gente vai andando e senta perto da entrada de um restaurante "Restaurante Menino Daniel".

- vai me dizer o que tá acontecendo? - Nichole diz.

- tô numa má fase, normal.

- isso aí não é normal, você tem depressão?

- claro que não, eu tenho total controle sobre mim.

- então porque você fez isso?

- você não entenderia.

- deixa eu te ajudar.

Era o que eu precisava ouvir, eu dei um abraço nela.

- isso me ajudou.

Quando a gente estava abraçado, eu vi o Dani saindo do restaurante, ele olhou pra gente, virou o rosto e foi embora.

Mais tarde ele chegou à minha casa pra fazer o trabalho.

Dani: - é aí, o quê que a gente vai ter que fazer mesmo?

- é, trabalho de literatura, agente tem que fazer uma pequena biografia de algum autor.

- que autor?

- a gente que escolhe.

- tá, e você não pensou em nada ainda?

- você já ouviu falar em Álvares de Azevedo?

- é o nome da nossa escola.

- é mais que isso, Álvares de Azevedo foi um poeta do ultrarromantismo.

- hã?

- olha, eu imprimi algo dele aqui.

- nossa, é meio mórbido.

- eu achei legal.

- é, você é diferente.

- você acha, você tem um jeito meio estranho também, é sério, mal humorado.

- mas eu não gosto de morte, eu só não gosto da minha vida.

- eu detesto a minha.

- você é o cara mais inteligente da sala.

- isso não significa nada, eu acho que eu não sei viver, tenho dezessete anos e a minha ainda é praticamente só da escola pra casa.

- você tem a maior cara de virjão.

- eu n... claro que...

- sim, eu sou virgem ainda também.

- sério, eu achei que ninguém da minha idade...

- foi uma escolha minha.

- religião?

- não, eu sou tradicional.

- problema pra arranjar mulher você não tem, eu já ouvi umas garotas falando de você.

- eu acho que esse que é o seu problema.

- é mais ou menos isso.

- já que a gente tá falando disso, você vai entrar na disputa?

- hã, tá falando da Nichole?

- é, Nichole Bianchi, essa mesma.

- você gosta dela?

- se eu não gostasse, eu não teria dado aquele soco no Junior.

- o Junior, ele era seu amigo, né? O que aconteceu?

- isso já faz tempo, o Junior é meio estranho, ele já falou de mim pra você?

- algumas vezes.

- ele é apegado demais.

- ele só sente falta do amigo de infância, natural.

- vou só te dar uma dica, não se aproxima muito dele, você não tanto sobre ele quanto eu sei.

- pode deixar, eu já aprendi, eu nunca mais vou me aproximar muito das pessoas, por que elas se afastam de repente e quanto mais estávamos próximos, mais vamos sofrer.

- se é sobre o que eu fiz com o Junior...

- não, é sobre mim, sobre o que eu aprendi.

- eu já aprendi isso faz tempo, por isso eu não tenho amigos, eu já tenho todas as pessoas que eu preciso.

- sua família?

- não vamos falar da minha família, todas as pessoas que eu preciso vivem em mim.

- qual o problema com sua família?

- não interessa, quer saber, eu vou nessa.

- mas você acabou de chegar, e o trabalho?

- a gente começa amanhã, tem muito tempo ainda.

O Anjo - Vidas & MortesOnde histórias criam vida. Descubra agora