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Homem de Lata Agora eu sei que tenho um coração, porque ele está partido.

(0 mágico de Oz)

Acho que só quem já passou por isso sabe o que é ter o co ração arrancado do peito. A sensação é exatamente essa, como sc estivesse faltando um órgão vital dentro de mim. Como se eu estivesse sangrando por dentro.

Depois daquele momento de decepção, a Gabi agiu rápido. Pegou as nossas planilhas, entregou para o professor e me enfiou dentro do primeiro táxi que passou. Foi a conta. As lágrimas co meçaram a rolar e a cada minuto parecia que aumentavam mais, a ponto do motorista perguntar se a gente queria que ele nos levas se para algum hospital. A Gabi agradeceu e só pediu para ele tirar a gente dali da frente do colégio o mais rápido possível. Ele obede ceu sem perguntar mais nada e só quando a gente já estava a uns dois quarteirões de distância voltou a perguntar para onde a gente queria ir. Eu continuava chorando, e a Gabi então pediu pra ele nos deixar no BH Shopping, já que ela sabia que naquele estado eu não ia querer ir pra casa nem pra lugar nenhum por perto.

Nós fomos direto pro banheiro, eu lavei meu rosto, mas as lágrimas simplesmente não paravam. Ficamos lá dentro um tempo, a Gabi tentando me consolar, dizendo que tinha sido melhor assim, que agora cu ia fazer intercâmbio sem amarras aqui e também que, da próxima vez, era para eu me apaixonar por alguém da minha idade, sem perigo de ser ca sado. Falou mal do Marquinho, que ele era um "galinha", que devia fazer isso com qualquer aluna que se interessasse por ele, que ela viu que ele estava me dando bola e que, sen do ele casado, isso só provava o quanto ele era mau-caráter e não merecia as minhas lágrimas.

A gente saiu do banheiro, eu munida com metros de papel higiênico, e fomos sentar perto da sorveteria, porque, segundo a Gabi, sorvete tem um componente que inibe as glândulas que fabricam lágrimas... não acreditei, mas pelo menos consegui achar um pouco de graça no esforço que ela estava fazendo para me animar.

Ela foi comprar os sorvetes, eu fiquei sentada guardando a mesa (naquele horário, às duas da tarde, o shopping estava começando a encher) e comecei a olhar na direção do cine ma, tentando ver se tinha estreado algum filme novo que eu não estivesse sabendo. Bati o olho na fila da bilheteria e de repente avistei as últimas pessoas que eu queria ver naquele momento: o Leo e a Vanessa.

Eu ainda tentei disfarçar, olhei pro outro lado rápido, co loquei a mão na cara, mas foi tarde demais, eles já tinham me visto. Ou, pelo menos, ele tinha, já que veio vindo na minha direção enquanto ela continuou na fila.

Ele chegou, abaixou pra me cumprimentar com beiji nhos e de repente recuou, franziu as sobrancelhas e perguntou todo preocupado: "O que houve? Por que você está chorando, Fani? Aconteceu alguma coisa?".

Eu não estava mais chorando, mas não sei o que acontece

comigo que sempre que alguém fala que eu estou fazendo ou sentindo alguma coisa - mesmo que eu não esteja - aquela coisa vem. Por exemplo, se alguém fala que eu estou verme lha de vergonha, eu fico vermelha. Se me falam que minha orelha está coçando, daí a um segundo ela começa a coçar. Não me pergunte o porquê, eu também não sei.

E então foi a conta de falar que eu não estava chorando que as lágrimas recomeçaram. Ele sentou à mesa comigo, f. cou passando a mão no meu cabelo, tirando a franja do meu rosto e dizendo: "O, minha linda, assim eu fico triste também, me fala o que aconteceu que eu vou lá e resolvo pra você.. Mas isso só me fez chorar ainda mais, e aí, nesse momento,

chegaram a Gabi e a Vanessa, cada uma vindo de um lado.

A Gabi colocou um sundae gigante na minha frente e ficou falando que, se isso não acabasse com o meu choro, quem iria chorar era ela... eu enxuguei as novas lágrimas com o resto do papel higiênico, o Leo continuou a me olhar meio sério, para certificar se eu estava parando mesmo, aí eu olhei pra cima e vi que a Vanessa estava atrás dele com uma cara meio fechada, e a única coisa que ela falou foi: "Nossa, eu ia chorar é depois de comer um sorvete desse tamanho, vocês sabem quantas calorias tem nisso aí?".

O Leo levantou rápido, perguntou se ela já tinha com prado os ingressos e se podia fazer o favor de esperar por ele na fila de entrada. Ela revirou os olhos, me lançou um olhar de desprezo, deu um beijo no rosto dele, virou as costas e foi andando em direção ao cinema, sem falar mais nada.

O Leo deu um suspiro, sentou de novo do meu lado, ficou me olhando bem de pertinho e aí falou: "Posso provar pra ver se esse sundae está gostoso mesmo?".

Eu dei uma colherada pra ele. Ele "hummmm", virou pra Gabi e disse: "Você estava certa, com provou, um sorvete desses qualquer motivo pra choro desaparece!", e aí levantou, beijou a minha cabeça, falou pra eu ficar bem falou e que ele ja me ligar mais tarde. Deu tehau pra Gabi e foi andando pro cinema.

Eu fiquei olhando ele indo, vi que se encontrou com a Vanessa no saguão e eles começaram a discutir alguma coisa, mas aí entraram na sala e não deu pra ver mais nada.

Depois de terminar o sorvete e já com o choro realmen le controlado, demos umas voltas pelo shopping, mais para dar um tempo até que o meu rosto desinchasse. A Gabi foi comigo até em casa, perguntou se eu queria ver um DVD ou alguma coisa assim, eu falei pra ela que estava tudo bem, que eu precisava só de tomar um banho e colocar meus pen samentos em ordem. Ela então me deu um grande abraço, falou que, qualquer coisa, qualquer hora que eu precisasse, era pra ligar pra ela, até de madrugada.

Depois do banho, fiquei pulando de canal em canal da televisão até anoitecer e, quando eu estava quase dormindo, o Leo me ligou. Perguntou se eu tinha melhorado e se eu queria conversar sobre o assunto que tinha me deixado da quele jeito. Eu falei que não. Ele não insistiu, só falou que em qualquer problema eu podia contar com ele, que mesmo que ele estivesse meio distante - e nessa hora ele deu uma pau sa - continuava gostando de mim do mesmo jeitinho, que não queria que eu o deixasse de fora da minha vida.

Nos despedimos, eu desliguei, apaguei a luz do abajur e, sem perceber, comecei a chorar de novo, bem baixinho, até cair no sono e, enfim, esquecer a dor.

fazendo meu filme Onde histórias criam vida. Descubra agora