16/05/1958

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Não senti coragem para me levantar após a noite em claro. Meus olhos estavam inchados por conta do choro, e tinha a impressão de que minhas costas poderian se abrir a qualquer momento. Tentei ao máximo não me mover, a pele ardia, ainda havia sangue quando eu tocava.

Uma freira entrou no quarto, eu tentei ignorar sua presença, mas ficou impossível quando ela me virou de costas para o colchão, me fazendo gritar.

- Levante-se - Ela mandou. - Arrume-se, esteja pronta para o desjejum.

- Não... - Disse, me controlando para não começar a chorar. - Não consigo.

- Está bem. Então chamarei a madre.

- Espera! - Eu a impedi quando ela estava prestes a sair. - Eu vou fazer isso. Estarei pronta.

A freira assentiu, em seguida percebo que deixou um outro colar daquele sobre a mesa.

Já estava sentada a aquela altura, então tentei executar a próxima tarefa: Levantar. Meus olhos lacrimejaram quando fiz isso, o tecido incomodava minha pele marcada. Quase não consegui colocar o colar, que parecia menor do que o antigo, e mais tarde eu descobriria o motivo.

Não havia espelho no quarto, mas consegui ver um pouco meu reflexo pelo vidro da janela, meu rosto esboçava uma expressão de dor, eu tentei sorrir mas ficou pior.

Respirei fundo antes de tirar a camisola e substituir pelo vestido preto apertado de noviça. Não consegui apertar o espartilho, e fechar os pequenos botões era uma tortura. Estava chorando quando terminei de fazer tudo. Não consegui arrumar meu cabelo da forma certa, mas deveria ser o suficiente.

Sai do quarto, a mesma freira estava me esperando. Ela saiu em minha frente, enquanto eu segui com uma postura totalmente diferente das outras garotas. Meus ombros estavam para baixo, eu encarava o chão. Ao chegar na mesa, eu me sentei no lugar que já conhecia, deveria ser uma espécie de marcação. Ivy, do outro lado da mesa, me olhou de relance antes de dar uma mordida em seu pão. Eu não sentia apetite.

A madre não conteve um sorriso discreto quando me viu, eu tive uma verdadeira vontade de matá-la. Enquanto ela parecia distraída comigo, duas garotas ao lado de Ivy cochichavam e sorriam, olhando para mim em seguida. Eu encarei o prato com uma sopa estranhamente nojenta, que tinha a cor verde. Não ousei experimentar aquela coisa, e aproveitando meu olhar para baixo, chutei as pernas delas. Eu bebi um gole de água depois disso, e não encarei ninguém.

As duas quase ficaram histéricas, mas acabaram se contendo ao ver que sorriam delas.

- É inaceitável! - Uma delas disse, a madre encarou ela com um olhar mortal.

- Inaceitável são seus cochichos na mesa, senhorita Turgueniev - A madre disse. - Não são modos para boas moças.

- Mas... - Ela tentou rebater, a madre se irritou e lhe deu um tapa.

- O desjejum está encerrado - A madre anunciou após se levantar. - Se dirijam até suas atividades de rotina.

- O que são atividades de rotina? - Perguntei hesitante.

- Encontre um espaço para você em alguma delas.

Foi tudo que ela disse antes de sair. As garotas levantaram, um burburinho começou, mas eu permaneci sentada, e Ivy também.

- O que você faz? - Perguntei. - Costura?

- Eu aprendo a como organizar um jarro de flores.

Revirei os olhos, parecia terrivelmente chato, mas eu deveria saber que era uma das melhores aulas.

- Então vá para as aulas de música, assim como todas as outras. - Ivy sugeriu.

- Não sei onde fica.

Ela se levantou, em seguida eu fiz o mesmo, e mordi com força meus lábios ao sentir o tecido se movendo em minhas costas.

- Não foi uma das melhores noites, não é?

- Está tão óbvio assim?

- Eu ouvi - Ela disse, encarando o chão e engolindo em seco. - Ouvi seus gritos, ontem a noite.

- Assim como todas, imagino.

Duas freiras se colocaram ao nosso lado, então paramos de falar no mesmo instante.

- Para que aula você vai? Senhorita Cortez. - Uma delas perguntou. E eu me perguntava como tantas delas moravam ali.

- Música.

- O coral está cheio. No entanto, pode tocar piano.

- Está bem. - Eu disse, olhando de relance para Ivy, que entrou numa sala com algumas flores.

- Espero que saiba o que está fazendo. Não admitimos falhas.

Me senti idiota pela decisão que tomei. Exigiria movimento, coisa que não conseguia fazer tão bem no momento.

- E se falhar... - A freira disse, seu tom parecia macabro. - Poderá rever algo que lhe deixou desse jeito. Tão aflita.

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