29/07/1958

41 8 0
                                    

Quando acordei, eu ouvi uma mulher falando perto de mim. Abri meus olhos devagar, sentindo a claridade do sol contra mim e me deixando incomodada.

A mulher se virou para mim, ela falava um idioma que eu não conseguia compreender e parecia irritada.

- Lo siento! Lo siento! - Falei e saí dali o mais rápido que pude.

Se ela estava reclamando comigo eu nunca iria saber.

Minha barriga roncou. Eu estava com fome e sem rumo algum mas vários cheiros tomavam a rua onde eu estava e aquilo chamou minha atenção. Segui um dos cheiros e vi que alguém fritava peixes em um tipo de chapa velha e suja. Ele falava rápido e eu mal consegui compreender o que disse. Ao seu lado, uma mulher estava bebendo e brigando com os peixes que não assavam. Os ignorei e continuei andando.

Quando passei em frente a um café chique eu olhei de relance para dentro e vi quão bem vestidas as pessoas estavam. Eu vivi numa bolha por muito tempo mas se as pessoas pareciam ricas então aquele lugar não era para mim.

No fim eu acabei comprando uma maçã de um velho que vendia várias fritas em uma carroça. Lhe paguei e fui caminhando até avistar algo parecido com um lago, onde as pessoas tomavam banho. O sol deveria ser suficiente para me secar, então eu terminei a maçã e cheguei perto das pessoas. Hesitei por um instante, mas entrei também e deixei o hábito do lado de fora, protegendo o dinheiro, as cartas e o diário. Uma pedra o segurava.

As pessoas me olharam com estranheza, eu quase desisti da ideia mas não poderia ficar sem tomar banho para sempre. Estava frio, as crianças choravam por causa disso e eu passei alguns minutos junto com as pessoas ali.

- Você não deveria estar num convento? - Uma voz desconhecida perguntou. Eu olhei para trás e vi uma garota tão parecida com Catherine que me espantei. Seu cabelo era loiro e estava escorrendo pelos ombros, a pele era tão lisa e branca quando a de uma boneca de porcelana.

- O quê? - Perguntei, confusa.

- Essa sua roupa de freira não disfarça muito. Você nem é daqui, não é?

Comparando com as pessoas da região eu realmente não me encaixava ali. Todos pareciam aquelas pinturas europeias e eu não. Eu parecia uma linda pintura de alguma garota colombiana.

- Eu não tenho outras roupas. - Disse, envergonhada.

Seus lábios vermelho-cereja abriram um sorriso sincero, ela parecia gentil.

- Por que está aqui mesmo?

Eu hesitei, então balancei minha cabeça.

- Eu preciso ir. - Falei, e me virei para chegar até a margem, onde meu hábito estava.

- Espere! - Ela segurou em minha mão, eu afastei ela imediatamente. - Você pode usar alguma roupa minha eu estava mesmo pensando em me livrar de alguns vestidos. Calças são a nova moda agora.

Calças. Naquela momento eu tive curiosidade e desejo para saber como era usar uma daquelas.

- Isso é uma fantasia? - Ela quis saber, chegava mais perto de mim. - Você me deixou curiosa. Como se chama?

- Eu tenho que ir embora. - Sai do lago sem mais delongas. Enrolei meu cabelo para tirar a água e espremi uma parte da minha saia.

Olhei para trás e a garota estava atrás de mim. Sua blusa branca estava molhada e grudando em seu corpo e ao olhar para baixo eu vi que usava calças até a metade das pernas.

- Você sabe que não sou daqui, não quero arrumar confusão - Eu disse, nervosismo me tomava. - Então, por favor, não me siga mais.

- Meu nome é Jill. - Ela estendeu sua mão para me cumprimentar. Eu apertei e ela sorriu.

- Eu me chamo Maria. - Falei rápido e num tom baixo.

A desconhecida continuou segurando a minha mão e me encarando de um jeito estranho. Eu soltei e olhei para o lado.

- Eu não moro muito longe daqui. Você pode ir comigo até lá e escolher novas roupas. Quem sabe pode até me dizer porque é tão misteriosa.

- Não. Obrigada.

O chão quente começou a queimar meus pés, Jill percebeu isso e se intrometeu:

- Pode escolher um novo sapato também. A loja de sapatos do meu tio fica sob minha casa.

- Seria ótimo, mas eu tenho que ir.

Então eu saí em passos rápidos, com medo que ela me seguisse.

Quando achei que estava distante o bastante eu olhei para trás e me senti aliviada ao perceber que ela não me seguia.

Passei o resto da manhã e toda a tarde andando pela cidade à procura do convento onde Ivy estava, mas eu não obtive sucesso e conforme a noite chegava os meus pés latejavam mais e cansaço me tomava.

Andando até o fim de uma rua eu vi uma casa trancada com correntes e um grande cadeado enferrujado. Eu observei um pouco o lugar e decidi que ficaria ali, então pulei o portão e senti o piso de madeira sob meus pés. Eu estava acostumada, era necessário pular portões e grades na minha casa quando a chave se perdia.

Eu olhei ao redor antes de adentrar na casa e assim que fiz isso foi possível ver a quantidade de poeira ali. Acendi uma vela que estava quase acabando e olhei ao redor.

Era uma casa pequena, os móveis pareciam ter sido escolhidos por alguém de mais idade que provavelmente morava sozinho. Eu retirei um lençol que cobria a cama e me deitei ali, assustada e deixei o meu hábito ao meu lado para não perder.

Meus olhos estavam arregalados, eu temi que alguém invadisse a casa assim como eu tinha feito ou que o dono aparecesse. Minha mente não relaxou, e mesmo cansada eu não conseguia dormir.

Então levantei e busquei por mais uma fonte de luz, achando um abajur na parede que ficava piscando o tempo inteiro. Não havia uma lareira para me aquecer.

Observei o lugar; As paredes tinham um papel florido por cima que estava perdendo a cola. O chão estava coberto por um tapete liso e verde musgo, que terminava na cozinha. Eu fui até lá, abri os armários, a geladeira e o fogão, que estavam vazios. Voltei para a sala e tentei procurar por livros ou mapa, mas não havia nada além de um móvel usado para colocar televisão e um sofá rasgado.

Era um lugar horrível e com cheiro de mofo, mas eu me senti mais segura do que no convento.

Convent | ⚢ Onde histórias criam vida. Descubra agora