13/07/1958

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Naquele dia de domingo eu acordei com um misto de emoções, e todas elas me davam um aperto no peito. A primeira chamada para a missa havia tocado, mas eu não liguei para isso, continuei deitada, encolhida e apavorada, sem saber o que estava acontecendo com Ivy.

Aconteceu que, depois da minha última carta, ela não me escreveu mais. Patrick não ia me entregar as cartas que chegavam, por isso eu não podia enviar mais, e aquilo me preocupava. Lembrei de um telefone que havia na casa da minha vizinha, e naquele momento eu queria um daquele, assim poderia falar com Ivy e ouvir sua voz.

A porta se abriu, meu coração se acelerou com o susto, e eu fechei os olhos para fingir que dormia.

— Cortez! — Era Mirtes. Depois daquele dia, ela estava me atormentando cada vez mais. Eu cerrei meus punhos, determinada revidar caso ela encostasse um dedo sequer em mim. — É hora de acordar.

Senti o colchão afundar um pouco, significava que ela havia se sentado, e quando eu senti sua mão em meu rosto, eu imediatamente segurei seu pulso e abri meus olhos, ela parecia assustada.

— Hija de Puta! Se afasta de mim. — Eu falei, e segurei ainda mais forte em seu pulso, com raiva da sua proximidade. Ela pareceu preocupada quando viu que eu não iria soltar.

— Me solte, ou levarei você até a madre.

— E eu vou contar o que vêm fazendo comigo.

Mirtes tentou se soltar, eu não tive pena e tentei dar um soco em seu rosto, tentei fazer isso por mim e por Ivy, mas ela segurou minha mão antes disso.

— Não seja tão rebelde, Cortez.

Outra vez ela havia tentado se aproximar, eu a soltei e me levantei rapidamente, correndo até a porta e pegando o crucifixo, porque estava trancada.

— Vai embora — Eu disse, tremendo. — Agora.

A freira se levantou, eu comecei a derrubar coisas de propósito, para chamar atenção de qualquer pessoa que estivesse passando. Isso a fez correr mais rápida até mim, eu acertei o crucifixo em sua testa e ela cambaleou para trás. Sangue escorreu pelo seu rosto, ela colocou a mão, tentando esconder, e depois saiu.

Despenquei no chão, nervosa, com medo do que aconteceria comigo depois daquilo.

Alguém abriu a porta. Não tive coragem para levantar a cabeça e ver quem era, mas a voz de Maryonice ecoou pelo lugar, e era impossível esquecer sua voz.

— Levante-se e me diga o que aconteceu, Maria Cortez.

Eu respirei fundo e levantei, meio atordoada.

— Deveriam tirar Mirtes daqui. Esta mulher é o demônio!

Maryonice ficou em silêncio, esperando por uma resposta mais sólida.

— Mirtes não é como vocês. Ela é uma pecadora — Relembrei do que ela havia dito para Ivy. Não queria usar as mesmas palavras, não queria me chamar assim, mas foi preciso naquele momento. — Ela não segue a lei natural da vida.

Os olhos da freira se arregalaram, ela saiu do quarto, e eu fiquei sem saber o que fazer, então troquei minha camisola pela roupa de noviça e coloquei meu hábito. Me arrumei o mais rápido que pude, e quando eu saí, vi Mirtes acompanhada de outras freiras, ela estava saindo da sala da madre, e tentava resistir.

— Soltem-me, essa garota está mentindo!

Me encolhi, e assim que pensei em voltar para o quarto, a freira me viu, e seu olhar era furioso.

— Eu farei de tudo para que sua vida seja um inferno, Cortez. Eu farei isso, você ainda não estará livre de mim.

Comecei a chorar, assustada demais com tudo que estava acontecendo, e senti uma agonia em mim mesma quando relembrei o que ela havia feito comigo. Fechei meus olhos com força e tentei ignorar as palavras de ódio ditas contra mim.

— As novas freiras estão prestes a voltar de Londres — Ouvi Aline dizer, então levantei minha cabeça e a vi conversando com o madre, que olhava para Mirtes. — O que devemos fazer, madre?

— Deixe que venham. Mirtes não será um problema.

Estávamos no mesmo lugar, esperando pelas mesmas pessoas. Eu estava sentada ao lado de Hannah, e Catalina não estava ali.

— Soube do acontecido — Hannah cochichou, e assenti. — Agora ficará tudo bem, ouvi dizer que ela foi para longe daqui e não poderá mais exercer suas atividades como freira.

— O que mais pode acontecer com ela?

— Ela pode ser presa. Ou morta.

— Pelo que fez ou pelo que é?

Naquela altura, Hannah havia me entendido. Não me culpei por não ter contado tudo, aquela história me deixava com nojo de mim e da freira também, que me fez passar por aquilo. Só que, se ela fosse morta, eu saberia qual seria a minha punição caso um dia deixasse transparecer o que eu sentia por Ivy.

— Isso eu não sei dizer, Maria. — Hannah suspirou, provavelmente pensando o mesmo que eu.

As portas se abriram, eu levantei minha cabeça e tentei me manter parada e fingindo que não me importava, eu tive medo.

Comecei a olhar atentamente enquanto elas entraram, mas apenas Catherine e outras duas garotas haviam retornado, incluindo Diana. Agora elas eram freiras, e poderiam fazer parte daquele inferno como seres superiores a nós. Catherine ficaria mais insuportável.

Só que eu comecei a me preocupar quando vi que ninguém mais ia entrar. Hannah se levantou e sorriu para Diana, e eu continuei sentada, nervosa demais. Meu coração acelerou, me senti ansiosa, pensando no que aquela maldita poderia ter feito com Ivy.

— Maria — Hannah me chamou. — Você está bem?

Eu balancei a cabeça, não conseguia pensar em mais nada além do que poderia ter acontecido com o meu amor.

A madre apareceu na sala, cumprimentou as novas freiras e pegou um papel grande, que parecia ter algo importante.

— Algumas das freiras ficaram em Londres — A madre começou, meus olhos marejaram, senti meu peito apertar. — Outras saíram da Inglaterra, mas o importante é que estão fazendo seu trabalho como servas da palavra verdadeira.

Saber daquilo não me deixou menos apavorada.

— Quem ficou em Londres? — Perguntei, me levantando.

Catherine deu uma risadinha.

— Isso preocupa você, Cortez?

A madre também me olhou, esperavam uma resposta.

Eu as deixei na sala, estava sentindo uma irritação, estava sob pressão e queria quebrar alguma coisa naquele momento. Florence falou algo, provavelmente algum tipo de piada que não fiz questão de ouvir.

Entrei em meu quarto, meu coração estava acelerando cada vez mais e minhas mãos tremiam. Hannah estava muito bem para me consolar, e não a culpei.

Olhei para minha janela, planejando algo que se desse certo ou não, eu tentaria por Ivy.

Ela precisava estar bem e estar em Londres.

Eu precisava de um plano e coragem.

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