11/06/1958

104 14 20
                                    

O silêncio de Ivy era uma tortura, e eu não entendia o motivo para essa distância que ela tomou de mim. Parei de chorar por isso e comecei a ter raiva daquele silêncio. Também não questionei mais aquele tipo de coisa com Hannah, porque deveria ser uma idiotice da minha cabeça. Hoje eu poderia comemorar meu aniversário de um mês no convento, mas é claro que não fiz isso, porque odiava aquele lugar, e estava sozinha, além de tudo.

Não era certo ficarmos andando pelo convento sem alguém para nos monitorar, mas eu fiz isso mesmo assim e cheguei até uma biblioteca que eu nunca tinha ouvido falar. Acho que noviças não eram permitidas, mas eu entrei mesmo assim.

Não tinha ninguém. O cheiro forte me fez espirrar, e naquele momento tive certeza de que morreria ali mesmo. Não era novidade a rejeição do meu corpo quando se tratava de poeira. Meu nariz parecia fora de controle e eu espirrava até não aguentar mais. Pensei em voltar, mas estava entediada e aceitei o risco. Puxei o tecido da minha roupa para cobrir o nariz e acendi um abajur para ver melhor. Não adiantou muito porque ele parecia escuro. Desci os três degraus com cuidado e tentei adaptar minha vista para ler no escuro.

Não tinham apenas bíblias como pensei. Por mais que fosse pequeno, haviam livros de contos, e queria saber como aquilo parou ali naquele convento. Peguei um deles. Parecia uma história infantil. Olhei rapidamente para os outros, mas e estava julgando pela capa, então peguei um livro que falava sobre um tal príncipe. Voltei para o corredor de onde tinha vindo e soltei a blusa. Espirrei na mesma hora por causa da grossa camada de poeira, mas segui meu caminho.

Abri o livro e passar as páginas fez a coceira em meu nariz aumentar. Soltei um grunhido e me recostei em uma das paredes, largando o livro em um móvel perto de uma porta qualquer.

Aline estava se aproximando de mim. Ela saiu de um dos corredores e olhou seriamente para mim com aquela sua cara assustadora parecendo um fantasma.

— Onde arranjou isso? — A freira questionou, segurando o livro.

— Achei que poderia ler para me distrair... — Eu respondi, e ela olhou ao redor.

— Você irá... — Ela parou de falar um segundo. Havia um barulho estranho vindo de uma das portas. Aline pareceu espantada, fez uma prece e me puxou dali.

Olhei para trás, mas ela colocou minha cabeça para frente de novo.

— A madre? — Perguntei, aparentemente sem medo, mas por dentro eu estava com vontade de gritar.

Outra vez o barulho. Soando como um grito.

— Saia daqui. Agora. — Ela ordenou, e não questionei mais nada.

Acabei sem o livro, mas pelo menos não fui levada até a madre.

Uma lição que aprendi sem ajuda de uma freira foi que não deveria existir uma religião, porque as pessoas sempre vão acabar achando que a delas é a única correta e que deve ser seguida. Como em meio a tantas crenças apenas uma seria certa?

Parei de prestar atenção na freira que nos dava lição e olhei para o lado, onde Ivy se sentava. Ela chorava em silêncio, mordendo o lábio com força, e machucando seu próprio braço ao afundar as unhas na pele. Outras noviças olhavam para ela, então eu propositalmente derrubei a tinta em minhas roupas. O foco das outras de voltou para mim, e percebi o quanto eram idiotas.

— Garota bagunceira! — A freira disse, e jogou a bíblia em cima da sua mesa. — Vá limpar suas roupas — Ela olhou para fora. — Irmã Teller!

Seu chamado foi ouvido e a tal irmã Teller veio até mim.

Ganhei roupas diferentes e uma bronca, mas nada disso importava enquanto eu não descobrisse o que acontecia com Ivy.

Convent | ⚢ Onde histórias criam vida. Descubra agora