28/05/1958

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As manhãs passaram a ser mais toleráveis, porque eu tinha a companhia de Ivy e Hannah também. Na manhã após minha visita à Ivy, da conversa do telhado nós começamos a conversar muito mais. Se pudéssemos, faríamos questão de passar o dia juntas.

Foi então que algo estranho, mas bem emocionante, aconteceu naquele mesmo dia.

Durante a noite, Ivy e eu iríamos ficar responsáveis pela limpeza da cozinha. Tínhamos nossas tarefas apesar das freiras estarem ali, mas éramos obrigadas a ajudar. Senti que quando a escolhida para ficar comigo foi Ivy, aquilo teve uma ajuda de Elisa, que sempre sorria para nós duas.

- Fica com a mesa. - Ivy me disse, e entregou um espanador de pó.

Fiz como minha mãe tinha me ensinado, e naquele momento eu comecei a pensar nela, e no quanto eu a odiava por ter me deixado ali.

Limpei as mesas, os armários vazios e eu ia limpar as prateleiras, mas vi uma garrafa de vinho e mostrei para Ivy. Era segurou como se fosse um troféu ou algo assim. Depois beijou a garrafa e me olhou.

- Isso nunca esteve aqui. - Ela falou séria, como as mães quando fazem algo errado e nos mandam ficar caladas. Foi tipo isso, e eu só assenti.

Ivy escondeu a garrafa em seu hábito, e pela primeira vez eu tinha visto ela sem aquilo. Vi seu rosto por inteiro, percebi também o quanto seu cabelo era bonito, um ruivo lindo. Aquilo me fez ficar vermelha, e piorou quando Ivy olhou para mim, o ar meio sorridente.

- O que vai fazer com isso? - Perguntei quando ela havia terminado de esconder perfeitamente a garrafa.

- Vou beber. Depois encarar uma terrível ressaca, mas serei feliz por algum tempo.

- As freiras não vão perceber?

- Mesmo que percebam, o que irão dizer para a madre?

Eu assenti, percebendo que fazia sentido.

Ivy também havia terminado, e estava quase na hora de sairmos dali, então saímos antes. Lembro que andamos devagar pelo corredor enorme, a ruiva segurando a garrafa sem muita força, para não ser suspeita, mas parecia estar suspeita o suficiente.

- Ah, Cortez, já que não tem medo de nada por aqui - Ela começou, e se atreveu a colocar a mão na minha cintura, mas eu havia gostado, então deixei. - Poderia beber comigo.

Sua proposta era loucura, mas naquele lugar eu só tinha duas opções: a) parecer louca, fazendo o que eu tinha vontade ou b) deixar que aquele lugar me enlouquecesse de verdade.

Então eu concordei, e entrei em seu quarto mais uma vez.

- E se alguma freira nos ver? - Perguntei, me sentando no chão do canto do quarto.

Ela se sentou ao meu lado, e abriu o vinho usando um saca-rolha. Achei estranho que ela tivesse um e conseguisse esconder, então recordei que eu escondia esse diário aqui.

Depois do primeiro gole, a garrafa foi passada para mim. Eu a encarei, queria que entendesse que eu nunca tinha bebido, mas eu fiquei calada, e peguei a garrafa mesmo assim. Eu fiz uma careta, e ela riu.

- Nunca bebeu antes?

Eu fiz que não, e devolvi a garrafa, mas o gosto era bom, então depois que bebeu, eu quis mais um pouco.

Ivy riu de novo, e eu olhei para seus lábios avermelhados. Eu tive a sensação estranha de querer beijar ela, igual as atrizes da televisão quando encontravam o homem dos sonhos, mas ao invés de bancar a atriz, eu balancei a cabeça e passei a garrafa.

Eu comecei a me sentir meio tonta depois daquilo, e apoiei a cabeça na parede. Pisquei os olhos, e balbuciei algo que nem eu mesma entendi.

Então, enquanto eu lutava para entender o que estava acontecendo, uma possível resposta da pergunta que eu fiz para Ivy pareceu surgir, e quis falar para ela.

- Então uma mulher pode pegar barriga depois de uma noite de amor? - Eu questionei, e Ivy gargalhou alto, jogando a cabeça para trás. Mas eu não me senti boba e ri também.

- Por que acha isso?

- Eu não sei o que acontece numa noite de amor também - Confessei, encolhendo os ombros e balançando a cabeça. - Mas essas noites acontecem antes de uma mulher aparecer com barriga, então pode explicar.

Ela me passou a garrafa, e eu bebi mais um pouco. Queria saber se ela estava igual a mim, mas como seria possível?

- Ivy. - Chamei, e olhei para ela.

- O quê? - Perguntou, passando o polegar pelos lábios.

- Como é que você sabe sobre essas coisas?

- Eu nunca disse que sabia.

Eu pisquei algumas vezes, confusa.

- Mas eu sei que sabe - Eu falei, e naquele momento ela me encarou também. - Então me diz o que acontece numa noite de amor.

Ela balançou a cabeça.

- Acho melhor você ir para o seu quarto antes da inspeção. - Ivy disse, e se levantou.

Peguei a garrafa, e ao perceber que estava vazia, grunhi.

A parte maluca começou quando Ivy se deitou em sua cama, e aquilo era um sinal para que eu fosse embora, mas fiz ao contrário e me deitei ali também, onde eu pude olhar ela nos olhos.

- Você não vai me dizer? - Eu falei, me ajeitando na cama.

- Não acho que precisa saber disso. É estúpido.

- Não é estúpido se envolve amor.

Senti a tontura de novo, mas mantive os olhos abertos.

- Em uma noite de amor... - Ivy começou, eu escutei tudo com atenção. - Duas pessoas vão demonstrar seu amor de uma forma diferente. Quando você tiver a sua, então você e a outra pessoa irão tocar um no outro, mas de um jeito diferente, em lugares onde apenas você toca.

- Mas eu não terei - Eu disse. - Sou noviça, não vou conhecer um rapaz e me apaixonar por ele.

Ela riu de novo, e eu não acompanhei.

- Tem razão - Falou. - Não deveria ter te colocado no meio dessa história.

Então eu me levantei, porque de repente comecei a pensar em ter uma noite de amor com ela.

- Preciso ir antes da inspeção.

Ela assentiu, e a deixei sozinha.

Eu cheguei em meu quarto a tempo, mas fiquei pensando no que ela falou. Mas durou pouco, porque um cansaço repentino me tomou, então eu fechei os olhos e dormi.

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