18/06/1958

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Me proteger. Do que ela queria me proteger? Eu podia crer que não havia como me proteger daquele lugar e nem das freiras. Então o que Ivy quis dizer?

Voltei a olhar para a pilha de saias dobradas em minhas mãos que Elisa colocava. Ela estava dobrando cuidadosamente, e fazia isso cantarolando. Parecia feliz e animada, coisa que não era comum por aqui. Seu véu nunca era colocado de maneira totalmente correta, e por isso eu percebi que seu cabelo era preto, além de ser cacheado. Eram poucas as vezes que eu parava para observar esses detalhes nas pessoas, mas acontecia.

— Esta é a última. — Elisa informou, colocando a saia junto da pilha e pegando da minha mão.

— Devo deixar os pares de roupas no quarto de cada uma?

A freira assentiu, e assim que terminou de separar os pares numa cesta, entregou para mim.

— Tente fazer isso antes das outras terminarem as atividades de rotina. Algumas não gostam que entrem em seus quartos.

Concordei com a cabeça e saí para fazer o trabalho.

Olhei de relance para a escada que subi na noite em que conheci aquele maldito chicote e pude sentir minha pele coçar. Isso se somou ao olhar sombrio da madre, que estava sobre mim. Respirei fundo e olhei para frente, me concentrando na tarefa. Eu poderia ter ficado apenas com a limpeza da cozinha, mas precisava distrair minha mente de Ivy. Que, aliás, era a dona do primeiro quarto.

Eu não bati na porta porque ela deveria estar na sua atividade, e ultimamente Ivy nem estava muito presente, de qualquer forma. Deixei o par de roupas sobre sua cama e rapidamente toquei no lençol que usava. O quarto tinha seu cheiro, eu olhei para a bagunça e sorri de leve.

Segurei forte a alça da cesta e segui meu caminho entre as portas dos quartos. Fiz a mesma coisa de antes, mas ao chegar no número oito, a porta estava trancada. Bati algumas vezes e fiquei surpresa quando Diana abriu.

— Novas roupas. — Informei, e ela assentiu rapidamente, parecia que iria quebrar o pescoço.

— Maria? — Alguém perguntou. Uma voz misteriosa, vindo de dentro do quarto.

Só soube que Hannah era a dona quando ela se posicionou atrás de Diana, que ficou com o rosto todo vermelho.

— O que faz aqui? — Perguntei, espantada. Olhei ao redor por garantia. Não parecia ser permitido o que estavam fazendo.

— Depois eu explico. — Hannah disse, e puxou Diana para dentro, fazendo ela fechar a porta do quarto.

Terminei meu trabalho alguns minutos depois, e aproveitei para entregar a cesta a uma freira qualquer e fui para a sala de música, onde o coral ensaiava a todo vapor para a apresentação na capela, com alguns moradores sendo convidados. Eu iria tocar piano para todos eles, e estava nervosa. Daisy, a freira que coordenava o coral — Descobri isso enquanto ouvia secretamente a conversa dela com Maryonice. Elas não são muito de falar seus nomes. — Falava alto e se agitava entre todas nós. As roupas serviriam para essa apresentação, e eu poderia ter me adiantado e trocado, mas estragaria a surpresa.

— Para o piano, Cortez! — A freira ordenou, e eu obedeci.

Comecei a tocar a mesma música que ensaiamos mil vezes e a mesma história se repetia. Uma noviça errava, Daisy gritava. Uma noviça errava, Daisy gritava.

E assim por diante.

Eu só precisava ficar quieta, tocando o piano, que aprendi escondido do meu pai. Nunca entendi como minha mãe se submeteu ao casamento com meu pai. Sim, eu sei muito bem até hoje que alguém fez uma regra e ordenou que as mulheres fossem obrigadas a casar se quisessem respeito. Mas, sendo honesta, minha mãe era uma mulher incrível antes dos cinco anos de casamento. Aprendi piano porque ela me ensinava quando ele saía. Depois que se tornou ranzinza, deve ter se arrependido de me ensinar. O ponto é que meu pai morreu, e eu achei que ficaria feliz, mas isso a tornou pior, e fez com que eu parasse num convento no interior da Inglaterra.

Convent | ⚢ Onde histórias criam vida. Descubra agora