• Capítulo 01 •

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13/03/2014, Connecticut - EUA

Maraisa encarou seu reflexo no retrovisor mais uma vez, ajustando seus cabelos escuros que iam até o meio das costas, antes de pegar a bolsa e sair do carro. Travou as portas com a chave-controle e pegou o caminho para entrar no prédio de Direito da universidade de Yale enquanto falava com seu irmão ao telefone.

- Eu sei disso, mas eu já disse que não posso! - bateu o pé. - Para de insistir, caramba. Você me deixa mal falando assim, me sinto culpada.

Ergueu o olhar, semicerrando os olhos, e fez careta quando encarou o familiar céu nublado. Bufou, impaciente tanto com o clima que praticamente nunca esquentava, quanto com seu irmão que não parava de falar do outro lado da linha, tentando convencer ela a aparecer em uma festa de família comemorando as bodas de diamante de seus avós.

- Eu não vou repetir, César! - bradou com impaciência. - Não posso e ponto-final. Desculpa, tá legal? Minha carreira é mais importante. E é o último ano de faculdade, depois estarei livre para mais momentos em família. Mas, agora, eu não vou ficar mais louca do que já estou para encaixar uma viagem para uma festa sem importância na minha agenda abarrotada de compromissos. Desculpe - disse e desligou sem esperar o irmão responder. Um sentimento de culpa entalou em sua garganta e ela forçou a engolir, convencendo-se de suas prioridades. Não conseguiria fazer mais de duas viagens ao Brasil por ano, uma nas férias e um no Natal que já emendava no aniversário dela e de sua irmã. Duas já era complicado, se adicionasse mais uma ela enlouqueceria. Não tinha tempo para aquilo.

Por falar em tempo e compromisso, Maraisa pegou a agenda minúscula, mas eficiente, da bolsa e a abriu no dia treze, observando as coisas listadas que ainda não receberam o "check" ao lado. Coçou os olhos quando as letras de sua própria caligrafia começaram a dançar em sua visão. Não conseguia se concentrar e acabou por reprimir um bocejo pelo cansaço. Xingou-se mentalmente por ter se permitido ficar acordada até às quatro da manhã finalizando um trabalho e estudando, sendo que sempre precisava acordar às seis, dando a desculpa de que estava acostumada ao sono precário.

Era apenas uma meia verdade. E ela precisava de café.

Claro que sua rotina era uma loucura, claro que já havia ficado noites em claro estudando até a exaustão, e claro que as pessoas a olhavam torto quando Maraisa dizia que gostava mesmo assim. Mas tinha como não gostar? Ela havia batalhado muito para estar ali, não era o mínimo dar tudo de si para permanecer e se tornar destaque?

Estava em New Heaven, Connecticut, havia um pouco mais de cinco anos. Cursava o último ano de Direito e lembrava como se fosse ontem de como tinha se matado para conseguir chegar onde estava - ter passado em seu curso desejado em uma faculdade renomada de seus sonhos. Quando viu o "aprovada" ao lado de seu nome, o choro foi inevitável e ela teve certeza de que poderia voar com o alívio que tomou seu corpo, teve a certeza de que todo o sufoco tinha valido a pena.

Claro que tinha seus contras, como a precariedade de sua saúde mental em função da faculdade, mas, principalmente, ter que morar do outro lado do mundo, longe de sua família, daqueles que mais amava, e as saudades do território brasileiro quente e familiar. A fase de adaptação tinha sido difícil, mas ela superou. Estar realizando um sonho completamente surreal para uma menina do Mato Grosso, que nunca imaginaria a vida que estava vivendo, era como uma sensação de estar no céu.

- Why are you smiling at nothing? (Por que você está sorrindo para o nada?) - Carla ouviu uma voz familiar perguntar para em seguida sentir sua mão ser puxada, afastando-a do mar de pessoas que passavam pelo corredor.

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