• Capítulo 23 •

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    Maraisa olhou em volta no quarto de roupas – porque pelo tamanho aquilo dificilmente seria chamado de closet. Quarto era o que encaixaria melhor –, decidindo o que vestir. Era por volta de dez horas de quarta-feira e ela não estava em um mood de fazer absolutamente nada.

    Maraisa estava cansada. Maiara, Marilia e ela foram ensaiar pela tarde e passaram horas a fio repassando o repertório. Conseguiu se virar bem mais ou menos lá na hora, na verdade. Em músicas que fazia primeira voz, por exemplo, foram mais difíceis no começo. Sua voz parecia mais presa em função da tensão, mas em uma repetição já soava perfeito, exatamente do jeito que precisava.

    Além de que, por muitas vezes, coisas que Maraisa precisaria falar durante as músicas, ou para puxar algumas delas, ela simplesmente não lembrou e deixou passar em branco. Recebeu alguns olhares tanto de Marilia quanto de Maiara, que deram uma mãozinha e falaram por cima quando Maraisa não falou. Não comentaram nada depois (ainda), mas Maraisa ficou meio aflita por ter sido perceptível a falta dela com o roteiro a menos de uma semana de tudo. No fim de tudo ela pegou o planejamento e deu uma estudada pra não repetir o erro.

    Maraisa torceu para que tivesse dado certo e não tivesse estragado muita coisa. Mas, independente de qualquer coisa, ela tinha gostado do ensaio. Gostado não, amado. Foi extremamente mágico reviver o canto com a irmã, tanto quanto ouvir a potência da Marilia que, querendo admitir ou não, era um som revigorante para Maraisa. Cantar parecia um lugar de paz não só pra uma, como pra todas, e naquele momento que estava imersa Maraisa se sentiu quase em casa.

    Maraisa decidiu colocar uma calça moletom e uma blusa branca com uma estampa de alguma animação que não deu atenção. O dia tinha amanhecido rápido e ela havia acordado porque na noite anterior foi a última a deitar e esqueceu os blackouts abertos. Sendo assim, ela não conseguiu ignorar a claridade por muito tempo e pelas nove estava de pé. Segunda manhã seguida que acordava sem Marilia do lado e Maraisa nem sequer procurou saber onde ela estava ou se estava em casa.

    Maraisa não sabia se evitar era a palavra certa para o que estava tentando fazer com Marilia. Durante o ensaio, raramente olhava em seus olhos, apenas se fosse por descuido, e mantinha-se afastada o máximo que dava sem parecer estranho. Qualquer mínima aproximação da mulher relembrava Maraisa do beijo e fazia seu coração acelerar e ela se sentir... não soube se estranha era a palavra certa. Ela ainda não sabia direito como processar aquilo.

    O que mais surpreendeu Maraisa foi que ela quem quis beijar Marilia, ela quem deu a iniciativa, ela quem quis provar. Não entendia o que aconteceu com ela, só sentiu... uma vontade absurda que não soube de onde tinha vindo, e, sinceramente, nem tinha certeza que tinha ido embora. A sensação que Maraisa tivera foi que quanto mais sentia o gosto da Marilia, mais queria provar. Nunca imaginara qualquer tipo de contato com ela por anos, nem em sonho, mas simplesmente aconteceu. Não sabia como processar.

    Besteira. Não tinha sido nada demais. O momento apenas a deixara acalorada, com o raciocínio nublado. Certo?

    Mas Maraisa ainda não sabia lidar com isso e não conseguia parar de pensar! O tsunami de sensações diferentes e novas que sentiu ainda estava alojado em sua cabeça. Não lembrava de ter sentido algo parecido com mais ninguém. Pareceu algo totalmente novo para Maraisa, como se nunca tivesse beijado outra pessoa na vida.  Um choque diferente.

    Ainda assim, lá estava ela fingindo que nada aconteceu, tentando afastar da cabeça qualquer lembrança do ocorrido, do gosto completamente viciante de Marilia que ainda teimava em assolar sua boca, da sensação de sentir ela explorando seu corpo ou de explorar o corpo dela, de como parecia que tudo ao redor pareceu simplesmente deixar de existir e apenas elas se faziam presentes.

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