Prólogo.

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A maioria das decisões que tomei na vida antes de completar meus 16 anos foram baseadas em chamar a atenção da minha mãe. A gente nunca foi muito próximas uma da outra — tipo nada, nada mesmo — e talvez por isso eu busquei a sua aprovação e o seu amor incansavelmente por tantos anos. A coisa mudou de figura com a discussão que tivemos agora a pouco depois dela ter visto Apolo pulando a janela do meu quarto. A gente nem tinha transado e minha mãe começou a falar que eu deveria me dar ao respeito, ela falou como se eu fosse uma qualquer, como se eu tivesse transado com Apolo sendo que ele só veio me ver porque a mãe dele o tinha deixado de castigo a semana inteira. Minha mãe e eu brigamos o tempo todo porque nada do faço para ela está bom o suficiente e nada do que ela faz por mim é o bastante.

Ela saiu de casa batendo a porta, é o que sempre faz quando discutimos uma com o outra. Às vezes essa atitude dói, mas às vezes consigo entender o esforço que ela faz para não perder a cabeça comigo quando discutimos. Toda vez que começo a chorar ela sai de casa para esfriar a cabeça, quando volta e ainda estou acordada, ela vai até o meu quarto e diz que vai ligar para mamãe para resolvermos isso.

Essa noite ela não voltou ainda e eu não quero esperar.

Vou ao banheiro do quarto das minhas mães e procuro nas gavetas algum remédio para dormir. Não preciso deles, poderia dormir de exaustação pelo cansaço e tristeza depois de tanto chorar, eu também não costumo invadir o quarto delas, exceto quando minha mãe viaja à trabalho e mamãe me chama para dormir com ela, caso contrário, eu nunca entro. Também nunca tomo remédios sem estar doente, mas tomo alguns comprimidos com um copo de água, tomo pela dor da minha mãe pensar o pior de mim sem me dar a oportunidade de me explicar, pela raiva de ser tão sensível em relação a tudo que a envolva, e por, principalmente, achar que não faz mais sentido viver se a minha mãe não é capaz de me amar. Anos atrás eu ouvi ela dizer a papai que não queria ser mãe, que ele a obrigou a isso. Minha mãe quis me abortar, então por que não dou um fim em todo o seu sofrimento de uma vez por todas?

Vou para o meu quarto e espero o remédio fazer efeito.

Meia hora depois sinto náuseas e tontura, sinto também um aperto no peito, um incomodo que me apavora. Eu não quero morrer. Estendo o braço até a mesa de cabeceira para pegar o meu celular e discar o número da minha mãe, meus dedos estão tremendo, erros as letras no touch porque quando acho que estou indo em uma, estou tocando em outra, e lágrimas caem na tela do aparelho.

Disco o número da minha mãe, coloco no viva-voz porque não acho que consigo segurar o aparelho sem derrubá-lo na cama. A porta do meu quarto se abre e minha mãe entra, ouço a sua voz chamar o meu nome desesperadamente, sorrio em meio a dor que sinto e aos soluços que escapam da minha garganta porque quem a visse logo pensaria que ela se importa comigo ou que me ama. Fecho os olhos, não consigo mais mantê-los abertos quando minha mãe segura o meu rosto para me obrigar a olhar para ela. Não é birra minha, não é uma tentava de irritá-la ou de chamar a sua atenção, eu só não consigo mais ficar de olhos abertos.

"Abra a boca", pediu, forçando a entrada dos seus dedos entre meus lábios. "Kenna, o que você fez?"

Sinto gotas caírem em minha pele. Ela está chorando?

"Bessie", é a voz do meu pai. Esforço-me para abrir os olhos e encará-lo, ele avança em minha direção, apavorado, desfazendo o nó da gravata. "O que aconteceu?"

Minha mãe enfia os dedos em minha boca, eles encostam no fundo da minha garganta, incentivando a ânsia. O meu estômago se contrai e rolo para o lado para vomitar no chão do quarto e não em cima dos lençóis limpos e recém-lavados. Meu pai levanta da cama e pega o telefone, mas minha mãe está contando cada comprimido que vê no chão, concentrada nos números, sussurrando cada um deles para si mesma.

"Três, quatro, cinco...", ela volta a enfiar os dedos em minha boca, pressiona-os no fundo da minha garganta e volto a vomitar de novo. "Se você morrer, eu morro, está ouvindo? Abre os olhos, Kenna, por favor. Abre os olhos, olha para mim."

"Kenna!", mamãe entra no quarto e sobe na cama. Automaticamente começo a chorar ainda mais enquanto me esforço para abrir os olhos, sinto seus braços me envolverem com força. Eu não consigo corresponder ao seu abraço. O meu choro, a minha falta de responsabilidade em ter pensado em engolir tantos remédios não me fizeram pensar em mamãe, em toda a dor que eu te causaria se morresse. "Está tudo bem, meu amor. Está tudo bem.

"Me desculpa, mamãe", pedi em meio a soluços. "Eu não queria estragar nada."

"A mamãe vai te levar para o hospital, está bem?"

"Você vai parar de me amar igual a minha mãe. Eu não deveria ter nascido... não era para eu ter nascido." 

Internato Lewis (Spin-off de L.A)Onde histórias criam vida. Descubra agora