A Verdade Escapa por Todos os Lados

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Olho para o relógio no pulso, cabisbaixa, as horas parecem não passar, era para estarmos lá fora, ensaiando para o próximo jogo de futebol americano, porém a nevasca inesperada estragou tudo, por mais que eu goste dela, então, estamos treinando dentro da quadra de basquete, mesmo que usando casacos pesados. Já ensinei tantas vezes a mesma coreografia, e mesmo assim algumas estão tendo muitas dificuldades, e isso é um problema.

Helena é quem mais se beneficia com a situação, já fui obrigada a facilitar os passos duas vezes, além do fato dela ter investido firme em uma narrativa ensaiada que fez parecer que a culpa é minha, quando a maioria das meninas que não tiveram êxito claramente não treinaram o suficiente, elas são desleixadas, mas o "grande infortúnio" são meus métodos, então agora estou aqui sentada, observando as garotas me verem como uma vilã, e a minha inimiga como uma espécie de libertadora. Elas me encaram de vez em quando com certa desdém, menos Sarah, que além de ser minha amiga, não é burra para cair numa manipulação assim.

Para piorar, estou preocupada com Tara, o seu pai sofreu um infarto, nós bem que tentamos os acompanhar para o hospital, mas fomos impedidas pelos enfermeiros da ambulância. Mesmo assim, visitamos o homem mais tarde e descobrimos que ele já havia falecido. Laura e eu prestamos nossas condolências, mas ela estava visivelmente fora de si, seus olhos voltaram a ficar vazios, exatamente como na primeira vez que a vi depois da festa. Ainda me lembro de ter me aproximado de uma das cadeiras onde estava sentada e dado um abraço nela e dizer:

– Eu... Lamento muito.

Não houve nenhuma manifestação de sua parte, a garota apenas continuou encarando o nada com lágrimas nos olhos, isso depois de ter parado o hospital inteiro com seus berros. Por fim, segurei a sua mão, acariciando as costas dela com o dedão. Laura então apareceu no corredor com café bem quente para a morena, e ofereceu, mas nada. O silêncio rapidamente chegou num ponto em que se tornou desconfortável, mas nós não tivemos coragem de rompê-lo novamente, até que Tara o fez.

– Por que tudo de ruim acontece na minha vida? – Indagou, alternando o olhar entre nós duas.

– Tara, não...

– Acabou, gente – sibilou, interrompendo, a voz estava tão fraca, tão rouca, que dava a impressão de que ela sumiria a qualquer momento. – Toda a esperança que eu tinha morre aqui, junto com meu pai.

– Não diga isso, você ainda tem sua mãe, seu irmão... E nós.

– Não importa mais.

Laura e eu nos entreolhamos, não sabíamos o que dizer, ela tinha o direito de viver o luto, o que poderia significar muitos pensamentos desse tipo.

Tudo estava melhorando aos poucos, mas agora parece que voltamos à estaca zero.

O som das palmas das meninas me desperta de minhas lembranças, Helena agradece a maioria delas com o máximo de sua falsa gentileza que consegue esboçar, com a Tara fora do caminho, quase todas a adoram. Antes de ir embora, ela faz questão de levantar os olhos para a arquibancada e dar uma boa olhada em mim com aquele mesmo sorriso maléfico como de costume, os olhos com um brilho tão intenso que acredito que poderia me matar com eles se tivesse algum poder mental. Penso em desviar o olhar, mas não quero fraquejar, então permaneço.

– Até mais tarde, Bethzinha – diz, fazendo o de sempre em seguida: joga seus belos fios negros perfeitos para o alto com uma mão e vira as costas para finalmente sair.

Fico extremamente aborrecida, porém sei que não há nada que eu possa fazer.

Em questão de minutos, a quadra já está liberada. Caminho lentamente até a saída, completamente chateada com a escola, com as garotas, com as situações ruins que vem acontecendo com Tara, com a droga do trabalho de química, tudo!

Meu Amor Adolescente [Completa]Onde histórias criam vida. Descubra agora