Capítulo 4

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Vance - 1977


Pedi dinheiro a Nicholas e comprei uma edição de Carmilla que eu achei no sebo que tinha aqui na cidade, não havia realmente uma livraria enorme e acho que isso fazia com que Carmilla quase tivesse infartos espontâneos, desde criancinha ela gostava de livros, me lembro de que ela adorava histórias em quadrinhos, eu também, então quando nos víamos no parquinho, falávamos de algumas.

A sua favorita era do Batman, mas ela amava quando aparecia as personagens femininas, já eu gostava mais do Homem aranha, porém sempre trocávamos a revistinha e quando chegava na outra semana, conversávamos sobre o que lemos. 

Aquilo parou quando fiz 12 anos e ela tinha 11. 

─Você vai ler?─ Nicholas perguntou quando mostrei o livro, revirei os olhos e neguei um pouco.

─Não, eu vou escrever bilhetes a Carmilla, para ela me perdoar... Eu não queria ter dito aquilo, de verdade─ Falo sentando na cadeira que havia no quarto do meu irmão, ele assente aos poucos e cruza as pernas me observando.

─Eu sei que é ruim a pessoa que você gosta ver você apanhar ou receber bronca─ Nicholas fala passando a mão na sobrancelha. ─Mas ela é sim a sua amiga─

─Sei─ Digo olhando a capa do livro, era do mesmo filme que eu peguei na locadora, voltei a olhar Nicholas. ─Mas... Porra! Eu não sei como reagir quando ela fala daquele jeito, eu sou só o amigo? Isso é frustrante para caralho─

O mais velho franze o nariz ignorando os palavrões.

─Você nunca ao menos disse que gostava dela Vance, como vai saber? Você gosta dela desde que tinham o que? 10 anos?─ Meu irmão pergunta se levantando e andando ao meu redor, ele abaixou perto de uma das cômodas que tinha no seu quarto e tirou uma quantidade razoável de dinheiro, pisquei algumas vezes. ─Eu estou juntando um pouco para nos mudarmos─

─Morar só eu e você?─

─É, tipo isso─ Ele diz rindo e se ajoelhando ao meu lado. ─Tenho uns amigos que querem montar uma banda, parece que vai funcionar... E você pega essa quantidade e gasta em fichas naquele jogo lá─

─Você odeia quando eu jogo muito─

─Precisa de um tempinho pensando.─


-X-


Escrevi vários bilhetes, eu era horrível nisso, não sabia o que fazer ou escrever, mas tentei o meu melhor, lá na escola eu era conhecido como um dos valentões e provavelmente quando eu me formasse alguém ainda ia cumprir esse papel por mim, eu repeti uma vez e deveria estar em uma turma, porém estava na de Carmilla.

Me meti em uma briga antes da aula começar, alguns garotos estavam discutindo sobre as meninas da sala, aquilo normalmente já me deixava irritado, mas quando ouvi o nome de Carmilla e um deles dizendo que ela era estranha... Senti o meu sangue fervendo, era como se a visse chorando de novo pela boneca. 

Não demorei para partir pra cima deles. E eu ganhei.

A diretora quase me deu uma suspensão, mas isso não aconteceu, quando sai da sala dela, fui até o armário de Carmilla e coloquei um dos bilhetes, ele dizia que ela era sim a minha amiga, entrei na sala e me sentei no fundo.

Eu era péssimo analisando o que as outras pessoas estavam vestindo, mas havia sempre algo que me deixava notar a dela, ela estava usando uma das suas tiaras, uma blusa branca e suéter, com uma saia, provavelmente uma das saias rosa clara que ela amava, cruzei os braços e apoiei o meu rosto nele.

Na hora do recreio eu estava sentado na arquibancada olhando ao redor, quem sabe ela fosse falar comigo, Carmilla sempre comia lá, mas ela não apareceu, ao invés disso ela estava conversando com um menino da turma. Não estava sentindo ciúmes, aquilo era uma coisa que eu não sentia.

Bom, talvez uma vez quando Carmilla estava conversando com Robin, eles faziam parte de alguma coisa que envolvia a América latina, porém ao ver os dois conversando juntos... Algo ficava fazendo meu sangue ferver. Eu não conseguia prestar muita atenção quando ela falava sobre o esse comitê, mas teve uma vez que fui na sua casa com Nicholas e elas estavam fazendo algo para uma das reuniões.

A sra. Catrina era muito boa criando doces ou apenas os fazendo, quando cheguei lá, Carmilla estava com um avental rosa, tinha farinha no cabelo dela e no seu rosto, ela ficava adorável cozinhando.

Eu tinha pensado mesmo naquilo?.

Carmilla fingia que não gostava de cozinhar, mas quando estava naquele lugar, criando junto com a sua mãe, ela parecia esquecer do mundo e focar ali, apenas ali, eu sentia vergonha de saber que reparei demais nela enquanto ela batia chantilly ou colocava as gotas de chocolate no cookie, além disso sempre ficava muito bom.

Ela cozinhava desde pequena, ou pelo menos ajudava sua mãe desde que eu me lembro, um dia Nicholas ficou preso no trabalho e era meu aniversário, meus pais haviam esquecido, como sempre e então Carmilla apareceu com um bolo pequeno.

Acho que foi naquele dia que eu me apaixonei por ela.

Mas sempre falam que amor de criança passa rápido, só que o meu não passou e eu odeio isso, saber que ela tem pelo menos um pouquinho dele. 

Má reputação - Vance HopperOnde histórias criam vida. Descubra agora