Capítulo 12

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Vance - Abril de 1977


Toda vez que eu estava perto de Carmilla o anel ficava azul claro, ele significava "apaixonado" e me deixava irritado, não gostava da sensação de outras pessoas sabendo de quem eu gostava, era como se agora soubessem que eu tinha um ponto fraco, na verdade ela sempre fora.

Tinha começado a primavera e eu achei que seria uma boa ideia irmos visitar o Red Rocks Park, que era um parque com anfiteatro e em meio as rochas e até cânions, Denver ainda era pequena, não sei se algum dia alguém vai querer ficar mais tempo aqui, me sentei ao lado dela na arquibancada, hoje ela vestia um macacão jeans e os cabelos estavam amarrados em um coque, com duas mechinhas de cabelo soltas.

─Quer ir comigo ao Red Rocks Park?─ Pergunto a olhando, Carmilla desvia os olhos do jogo e assente sorrindo, eu adorava o sorriso dela.

Se me perguntassem o que eu mais gostava nela, diria isso e com certeza os seus olhos, mas se fosse na personalidade, acho que diria a forma carinhosa que ela trata as outras pessoas, quando éramos mais novos, eu conseguia a tratar bem pior, mas ela nunca desistiu de ficar ao meu lado.

─Tipo um piquenique?─ Ela pergunta comendo um pedaço do hambúrguer, faço um sim com a cabeça, não tinha pensado realmente em um piquenique, mas provavelmente as meninas gostavam desse tipo de encontro, Carmilla bateu as mãos como se lembrasse de algo e se virou totalmente para mim.

─Posso usar a câmera da Lenore o que acha?─

─Por que iríamos usar a câmera da sua irmã? Que diga de passagem, é super apegada a essas coisas, ela não nasceu para o movimento hippie─ Digo rindo baixo, Carmilla inclina a cabeça para o lado e abre um sorrisinho.

─Primeiro, o movimento hippie roubou muita coisa da cultura cigana e de culturas de povos indígenas, acho que meu bisavô morreria de novo se visse os hippies─ Ela comenta balançando o indicador e contando os itens. ─Além disso, eu posso ser educada e pedir para ela me emprestar─

─Mas porque você quer a câmera vampirinha?─

─Para termos fotos juntos! Você é bem lerdo─ Carmilla fala voltando a comer, abro um sorriso e continuo a observando comer.

Eu só me sentia bem assim perto de Nicholas e dela, mas também me sentia bem com o jogo de pinball, cada um tinha o seu vício ou a forma de lidar com algo, comecei a jogar no Grangbo graças aos meus pais, pelo menos em algo eles poderiam ter acertado mesmo não sabendo.

Deveria ter uns 12 anos quando meu pai chegou bêbado em casa, minha mãe estava assistindo alguma coisa na televisão e eles começaram a discutir, Nicholas não tinha chegado ainda, então sai pela janela do meu quarto e desci a árvore, Carmilla não percebeu porque não estava em seu quarto.

Fui para o Grangbo e ganhei algumas fichas de um menino que não estava conseguindo jogar, então eu ganhei. Era a minha forma de extravasar e quando alguém fudia o meu jogo, eu partia para cima.

Foi nesse tempo que parei de ir ao parque conversar com ela sobre as histórias em quadrinhos.


-X-


Nicholas me ligou do trabalho e disse que iria demorar mais para chegar em casa, respirei fundo, iria ter de aturar o meu pai a tarde inteira e não sei se isso era algo que eu estava apto a fazer, poderia ligar a Carmilla e ficar lá com ela, ou poderia ir jogar, comecei a andar para o meu quarto e ir buscar as fichas que eu sempre guardava.

Quando estava saindo, senti o braço do meu pai, virei o rosto e tentei me soltar, mas ele começou a apertar com força.

─Vai sair de novo com aquela latina?─ Ele pergunta com uma feição de nojo, reviro os olhos e quando me inclino para trás consigo soltar o meu braço.

─E se eu for sair? Tem algum problema porra?─ Pergunto começando a ficar irritado, meu pai começa a se aproximar mais, foi então que o notei segurando uma das suas garrafas de cerveja.

Mas dessa vez eu não iria apanhar.

Quando ele bateu no móvel da TV para se aproximar com a garrafa quebrada, eu peguei e o empurrei, então ele se levantou de novo e tentou me acertar com o objeto, mas eu me abaixei e a tomei de sua mão, meu pai já estava bêbado demais.

─Se falar da Carmilla assim de novo, eu vou te arrebentar─ Digo ameaçando ele com a garrafa, meu pai desvia o olhar entre mim e o objeto, mas abre um sorriso e começa a rir de forma engasgada. ─O que tem de engraçado porra?─

─Tão apaixonado, vamos ver até quando ela vai aguentar você... Todo problemático, agressivo, imagina se você a machuca? Ah, isso sim ia ser engraçado─ Ele diz ainda rindo.

Aquilo sim me deixou irritado, então me aproximo depois de ter jogado aquela merda de garrafa no chão, o segurando pelo colarinho e socando uma, não duas, mas muito mais vezes do que eu já deveria ter me permitido, só que ele continua rindo e quando eu me afasto, meu pai estava com o sangue saindo de sua boca e os olhos começando a tomar a coloração arroxeada.

─Eu te disse não disse? Acha mesmo que aquela Hidalgo, toda certinha...─ Ele fez uma pausa para tossir, então se ajeitou no chão e colocou a mão na boca vendo o líquido vermelho. ─Vai continuar com você quando crescerem? Ela Vance, ela tem futuro, você? Você é só um garotinho de má reputação que acha que é bad boy─

Respirei fundo olhando meu pai.

Ele não estava certo, ou estava?

Carmilla sempre gostou de mim, desde que éramos crianças, aquilo realmente mudaria quando eu crescesse? Mas eu sabia que no fundo ele estava certo, ela tinha um futuro brilhante.

E eu queria estar nele. 

Má reputação - Vance HopperOnde histórias criam vida. Descubra agora