16. A existência de sentimentos.

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Foi um dia muito longo, mas sabe aqueles dias longos que você nem percebe a hora passando de tanta coisa produtiva que fez? Então, isso descreve perfeitamente hoje.

— Já está indo embora? — Jennie perguntou com o seu mesmo sorriso gentil de sempre. — Você se importaria de me ajudar rapidinho em uma coisa? — Ela parecia um pouco apreensiva.

Bom, eu entendia o porquê daquilo. Segundo algumas pessoas, eu era muito "grossa" e todo mundo tinha medo de falar ou até mesmo respirar o mesmo ar que eu.

Porém eu discordo. Não acho que sou uma pessoa grossa. Sou apenas uma pessoa reservada e que não gosta de bater papo em serviço.

— É sobre o desfile?

— Sim. — Ela virou a tela do computador para que eu pudesse olhar. — A senhorita me pediu para encomendar peonias azuis para a decoração, mas o que você acha de hortênsias azuis? — Mostrou um esboço do salão com as flores que ela desejava. — São simples mas adoráveis ao mesmo tempo, e fora isso, são mais baratas que as peonias.

Não era uma má ideia. As peonias eram brutas e não combinariam tanto com o tema de cores do desfile. Talvez algo simples, fino e delicado fosse melhor.

— Aprovada a sua ideia. — Sorri de maneira gentil vendo o quanto a menina ficou animada. — Gosto de hortênsias.

— Ah! Que bom que gostou senhorita.

— Posso te pedir um favor Jennie? — Ajeitei minha bolsa no ombro.

— Claro que sim.

— Não precisa me chamar de senhorita. Me chama apenas de Hannah. Temos a mesma idade, isso fica estranho. — Ao dizer isso, percebi o brilho no olhar da garota. Era como se ela me visse pela primeira vez como alguém legal.

— Ah sim! Claro senh.. quer dizer, Hannah! — Sorriu fazendo uma reverência.

— Bom, você quer uma carona ou vai ficar mais tempo aqui? — Perguntei tentando ser gentil.

Tá legal, eu não sou de dar carona para funcionários, mas custava? Estava literalmente caindo o céu do lado de fora, a menina estava até agora tendo um dia cheio no trabalho, fora que estava muito tarde e era perigoso.

— Quer me dar uma carona? — Ela ergueu uma das sobrancelhas. — Me desculpa senhorita Hannah, mas tá tudo bem com você?

— Primeiro, já disse para não me chamar de senhorita e segundo, por que eu estaria mal?

— Você tinha boca e não falava. — Por um momento a encarei vendo o olhar de arrependimento dela.

Era incrível o medo que eles sentiam de mim. Era como se eu fosse uma bomba prestes a explodir. Esse sentimento não era ruim se pensar por esse lado.

— Desculpa, não foi intenção minha ofender. — Ela abaixou a cabeça apreensiva.

— Não tem problema. Eu te entendo. As pessoas costumam me falar que eu sou um pouco seca. Então quando eu demonstro qualquer sentimento, eles ficam surpresos.

— Sim... — Sorriu aliviada. — Sabe, você parece uma pessoa muito fácil de conversar.

— Isso é bom?

— Sim! Uma pessoa fácil de conversar é alguém que normalmente tem assuntos bons, lições de vida e ótimos conselhos.

— Eu pareço dar ótimos conselhos? — Comecei a rir enquanto ela recolhia suas coisas.

— Sim! Estou a um tempão tentando pelo menos ter uma conversa com você. Nem acredito que isso aconteceu no dia mais improvável.

— Eu tenho tentado ser um pouco mais sociável. — Disquei o número do Luke na tela para que ele viesse me buscar, mas no primeiro toque, me lembrei que pedi para que ele não viesse. — Poxa como eu sou burra. — Falei desligando o celular.

— O que houve? — Falou colocando a bolsa no ombro.

— Meu carro está com um amigo.

— Por que você não pede para ele te buscar então? — Ela perguntou cutucando as pontas do cabelo.

— Eu meio que pedi para ele não vim me buscar de tarde. — Coçei a cabeça pensando em pedir um uber.

— Por que pediu isso? — Ergueu uma sobrancelha tentando entender o contexto.

— Isso já é um pouco confidencial.

— Ah entendo...

Um silêncio pairou no local. Ela queria perguntar, estava nítido em seu rosto. Mas eu com certeza não contaria nada daquilo. Meu celular começou a vibrar quebrando totalmente o silêncio entre nós.

Era Luke, ele provavelmente viu a minha ligação e retornou com medo de ser algo sério.

Eu não sei se estava preparada para falar com ele de novo. Aquilo tudo era vergonhoso demais para mim.

— Não vai atender o celular? — A menina recolheu os seus livros de cima da mesa e se virou para mim. — Atende aí que eu vou pedir um uber para nós duas. — Se retirou da recepção indo em direção a um banquinho do lado de fora.

Respirei fundo olhando para o visor do celular novamente. A ligação havia se encerrado mas uma mensagem dele apareceu na tela.

Está tudo bem? Por que me ligou?

O que eu responderia? Para ele esquecer o que eu disse de tarde e vim me buscar porque eu odiava chuva? Para ele terminar de fazer o que estava fazendo comigo no carro?

Meu Deus eu estava enlouquecendo! Toda vez que Luke surgia em minha cabeça, desencadiava milhões de sentimentos que eu nem sabia da existência. Ele fazia eu sentir uma adrenalina muito grande, mas não era adrenalina de perigo. Era uma adrenalina de aventura, de não saber o que vem pela frente mas ter a certeza de que no final irei achar o tesouro no qual o mapa me guiou para encontrar.

Era um sentimento bom que me deixava nervosa e ao mesmo tempo relaxada.

Eu amava aquela sensação. Ela me fazia esquecer de todos os problemas.

Pela primeira vez em toda a minha vida, eu acreditava fielmente que podia vencer todos os meus demônios tendo Luke ao meu lado. Porque ele me fazia bem.

— O que eu estou pensando? Ele jamais iria querer alguém tão complicada como eu... Tenho a certeza de que já deve ser um grande desafio me ter como amiga. — Um sorriso fraco surgiu no canto de meus lábios.

Peguei meu celular e digitei uma mensagem rápido.

Vem me buscar, por favor.

Assim que eu enviei, ele visualizou como se estivesse esperando.

— Eu só estava esperando você pedir.

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