55. Seguir em frente.

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Senti uns braços rodeando o meu pescoço assim que me sentei na grama envolta do hospital.

— Por quê? — Perguntei a garota que eu tinha certeza que me abraçava.

— Não importa o quanto uma pessoa que você ama te machuque. Você não deixa de amá-la do dia para a noite. — A voz suave da menina veio até os meus ouvidos como um refrigério para minha alma.

— Eu já ouvi isso antes. — Engoli a seco. — Mas já se passaram anos.

— As vezes leva muito tempo para esquecer alguém Luke. Sua mãe viveu a maior parte da vida dela ao lado desse homem. Viveu momento incríveis que na cabeça dela, infelizmente superam os momentos terríveis. — A menina se sentou ao meu lado, encarando meu rosto. — Talvez ela nem o ame mais, sabia? — A encarei, vendo um pequeno sorriso nos seus lábios. — Talvez só esteja apegada as memórias antigas de quem ele costumava ser antes de se tornar... um ser humano ruim.

Eu não falei nada. Apenas refletia sobre aquilo.

Amar podia ser a cura, mas também a ruína da nossa existência. Podia ser o melhor, e de repete se tornar o pior. Podia ser o céu, e virar o inferno em questão de segundos.

— Será que minha mãe um dia será capaz de seguir em frente? — Perguntei, encostando minha cabeça em seu ombro.

— Será que um dia você será capaz de seguir em frente? — Ela rebateu minha pergunta, me deixando ainda mais pensativo.

Será que sou capaz de seguir em frente?

(...)

Seguir em frente para mim seria enfrentar essa angústia que me aflige toda vez que me lembro dele. Seria enfrentar a mágoa dentro de mim que muita das vezes me abala. Seguir em frente, era mostrar que aquilo não foi suficiente para me abater.

Eu quero seguir em frente.

Não quero mais que alguém tão insignificante tome minha mente e meu coração. Isso só prejudicava a mim mesmo enquanto ele ainda segue por aí vivendo sua vida.

Assim que minha mãe e Jack saíram do quarto de hospital onde ele se encontrava, respirei fundo pensando em tudo que aconteceria a partir do momento que eu cruzasse aquela porta.

Aquele homem nunca se importou comigo e nunca foi capaz de me aceitar como filho. Por que agora, aceitaria me ver?

Dizem que quando estamos em um momento de dor e fragilidade, não gostamos de ser visto nem por quem amamos, imagina quem odiamos.

Hannah pegou uma das minhas mãos na tentativa de me incentivar assim que eu congelei em frente a porta.

Seja lá o que esse homem queria comigo, eu precisava acabar com isso logo.

Se fosse para me humilhar, eu já estava acostumado. Se for para zombar de mim como sempre, eu não me importo mais. Se for para dizer novamente o quanto sou insignificante para ele, eu já sabia.

Tudo que ele tentasse fazer para me abater, jamais deixaria me atingir de novo.

Não seria mais aquela criança ingênua que chorava enquanto seu pai dizia que ela era um erro. Eu seria aquele que superou e foi mais forte que o desprezo dele.

— Eu vou ficar aqui te esperando. — Ela soltou a minha mão e beijou o meu rosto, abrindo um sorriso logo depois.

O mesmo sorriso que era capaz de me fazer sentir coisas surreais. O sorriso que tinha o poder de afastar as coisas ruins de mim. O sorriso que tinha um efeito tão poderoso sobre o meu corpo, que eu sentia vontade de a beijar a cada segundo que ela sorria. O sorriso que abalava um pouco o meu mundo.

Eu era apaixonado por esse sorriso.

Amava vê-la sorrir pois sei que a maior parte da vida dela, o sorriso foi difícil de aparecer em seu rosto. É bom ver que ela recuperou esse brilho.

Abri a porta do quarto e peguei em sua mão, a deixando confusa. Conduzi ela para dentro e fechei a porta, suspirando fundo.

Demorei uns segundo para me virar para a cama e ver o homem deitado. Eu ainda tinha muito rancor. Eu precisa me libertar do que me causava tamanha dor.

— Você veio... — O homem começou a dizer de maneira calma e serena. Dei um passo para trás, desconfiado. — E trouxe uma moça! — Sorriu para Hannah. Provavelmente não se lembra que ela estava no dia em que ele resolver aparecer extremamente alcoolizado.

— Tudo bem? Como o senhor estar? — Hannah tentou se aproximar dele, mas a segurei para que não se achegasse.

— Não muito bem. Muitas coisas me afligem além dessa dor física. — Ele levantou um pouco a cabeça fazendo umas caretas. — Como por exemplo, o fato de eu ser horrível. Tão horrível que não mereça nem viver.

Hannah encarou os meus olhos, esperando alguma reação da minha parte.

Quantas vezes já ouvi ele dizer isso para a minha mãe. Dizer que era horrível e que queria mudar, mas ela precisava dar mais uma chance a ele. Quantas vezes ouvi ele dizer que a amava e pararia com tudo aquilo. E quantas vezes vi minha mãe cair nas mesmas mentiras.

Mas admitir para mim? Admitir para alguém que ele não ama?

— Sabe senhor James. — Hannah se aproximou dele mais uma vez. Mas dessa vez, não a impedi. — Eu acho que quando nos arrependemos de coração, quando não usamos desculpas vazias... — Ela me encarou, lembrando do dia em que nos encontramos pela primeira vez na universidade. — Eu acho que somos merecedores de uma segunda chance. — Ela voltou a encarar o homem. — Mas não podemos obrigar alguém a nos perdoar. Precisamos demonstrar que merecemos o perdão. O senhor tem demonstrado que merece o perdão?

O homem apenas abaixou a cabeça e parecia comovido com as palavras da menina.

— Depois que eu sair daqui, vou realizar um tratamento de abstinência alcoólica. — Declarou, me deixando surpreso.

— Você vai o quê? — O encarei, vendo ele sorrir sem mostrar os dentes ao perceber que finalmente resolvi falar.

— Eu realmente estou disposto a mudar Luke. Quero fazer diferente dessa vez. Eu sei que errei muito principalmente com você... mas, e se você decidir que quer me dar essa chance? Quero mostrar para você que posso ser o pai que não fui quando você era mais novo.

— Eu não acredito no que estou ouvindo. — O olhei incrédulo. — Eu não preciso de um pai! Ainda mais quando esse pai for você!

Caminhei em direção a porta e saí por elas sentindo o ódio se apossar de mim.

Pai? Ele acredita mesmo que quero alguém como ele sendo meu pai?! Ele está se esquecendo que cresci e ter ou não ter, já não faz mais diferença.

Não quero mais me libertar desse sentimento. Afinal, era melhor do que perdoá-lo.

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