38. Um porto seguro também precisa de um.

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Narrado por Luke

Sabe aqueles dias que são tão pesados e angustiantes que você fica se perguntando o porquê levantou? Esse com certeza era um deles.

Depois do ocorrido de mais cedo, desmarquei todas as sessões de fotos que eu tinha naquela tarde. Não tinha disposição nenhuma para tirar fotos e captar momentos felizes, quando eu não estava feliz.

Eu costumava dizer que meus sentimentos afetavam bastante o meu trabalho. Porque quando eu estava radiante, as fotos saíam com mais brilho e beleza. Porém quando eu não estava, as fotos ficavam mais tristes e cinzas.

Sei que meus sentimentos não deveriam intervir no meu trabalho, mas era inevitável.

Depois que Hannah saiu para seu trabalho, eu pude notar a preocupação e tristeza em seu olhar assim que ela passou pelas portas.

Sei que a maior parte da tristeza é por minha culpa. O fato de eu não me abrir e expressar o que eu sentia, claramente a magoava.

Mas isso não impediu dela me abraçar e ficar a cada minuto ao meu lado.

Hannah com certeza era especial para mim.

Enquanto eu me sentava na janela de meu quarto, algumas memórias surgiam em minha cabeça como um facada no peito.

...

— POR QUE VOCÊ É ASSIM HEIN? — Minha mãe gritava na cozinha com o meu pai enquanto eu lutava para não ouvir a gritaria.

Meus olhos estavam repletos de lágrimas e um fone no ouvido, me impedia um pouco de ouvir aquilo tudo.

Todas as noites que meu pai chegava bêbado de pequenas festas que faziam em seu trabalho, a gritaria era certa.

Eu estava cansado de meu pai. Cansado da sua falta de responsabilidade, estava cansado da falta de empatia com a sua família.

Ao invés de ser um pai que realmente cuidava de mim, ele era aquele que me causava mais dor. Ao invés de ser o marido que minha mãe precisava, ele era o inimigo que ela menos precisava.

Por mais que meu pai fosse assim, eu não conseguia deixar de ama-lo.

Eu realmente acreditava que ele poderia mudar e se tornar o pai que eu tanto desejava. Eu queria muito isso.

— VOCÊ ESTÁ MALUCA? POR QUE ESTÁ GRITANDO COMIGO? — Ele berrava deixando claro que não estava sóbrio.

— Você é um incompetente! Eu não aguento mais você! Não aguento mais como você trata a sua família! Como você trata o seu filho como se não fosse nada! — A voz da minha mãe era de assustada e desesperada.

— Eu não tenho filhos. Aquele menino que está no quarto é fruto de uma traição sua.

— Você está maluco?!? EU TE AMAVA! Eu jamais seria capaz de trair você. — Ela chorava descontroladamente.

Eu não aguentava mais aquilo. Não aguentava mais ver minha mãe sofrer e não poder fazer nada para ajudá-la. Eu não aguentava mais chorar pelo fato de meu pai não ser igual ao das outras crianças.

Não aguentava mais o vazio que eu sentia dentro do meu coração.

...

Aquelas memória era difíceis de serem lembradas, pois quanto mais eram remoídas, mais causavam feridas.

E eu já tinha muitas.

Toda vez que eu encarava aqueles olhos vazios e sem cor, me lembrava das noites em que eu passava sozinho chorando em meu quarto frio. Me lembrava da minha mãe chorando no sofá da sala e implorando a Deus para que meu pai mudasse. Lembrava do dia dos pais, no colégio... em que minha mãe fazia de tudo para eu não chorar.

Talvez nem tudo dependa só de Deus. As vezes os seres humanos precisam estar dispostos a mudar.

Eu respirei fundo sentindo o ar entrando pelos meus pulmões, até que as memórias foram desaparecem aos poucos quando meus olhos focaram na menina que estacionou o carro em frente ao meu quintal.

Ela entrou pelos portões com Luna e Henry logo atrás. Luna parecia chateada e sorria pouco enquanto Henry tentava de todo jeito fazer a menina sorrir.

Hannah estava cabisbaixa e digitava algumas coisas em seu telefone, mantendo sua atenção longe da janela aonde eu estava sentado.

Aquele dia não parecia mais tão colorido. Mas por algum motivo, Hannah conseguia dar um brilho no meio daquela escuridão que insistia em me dominar.

Assim que ouvi umas batidas em minha porta, me virei ficando de costas pra janela.

Ali pude notar uma Hannah com os olhos vermelhos e inchados.

— Oi Luke... É... Eu trouxe roupas para dormir aqui. — Ela encarava o meu corpo em cima da janela parecendo assustada com a situação. — Olha, eu não sei se você me quer nesse momento conturbado da sua vida, e eu entendo se não quiser, mas eu quero estar do seu lado. Assim como você esteve do meu. — Ela se aproximava de mim com os olhos fixados nos meus.

Ela era tão bonita.

Estava tão arrumada e eu nem tive a chance de dizer o quanto ela estava linda. A saia que usava, deixava marcado o seu quadril e suas coxas formosas. O moletom me impedia de ver a sua barriguinha que ela tanto tinha insegurança, mas que eu amava. Era uma roupa simples, mas que facilmente era capaz de me conquistar.

Pois eu amava tudo nela.

Seus cabelos eram enormes com pequenas grandes ondas nas pontas. Seus olhos num tom de castanho tão profundo, que eu sentia vontade de mergulhar naquele imensa profundidade. Sua pele era branca e seus lábios avermelhados.

Aqueles mesmos lábios que me faziam enlouquecer toda vez que eu o tocava. Aqueles lábios que tinham um sabor único que eu não encontraria em mais ninguém além dela.

Eu não sei como ela era capaz de pensar que eu não a queria perto de mim, pelo contrário, o que eu mais queria naquele momento era envolve-la em meus braços e dizer para jamais ir embora.

Eu queria que ela entendesse que a única coisa naquele mundo que ainda me fazia suspirar de amores, era ela.

Que ela era a razão e o motivo de tudo.

Queria fazê-la entender que eu escalaria montanhas por ela, que nadaria oceanos para estar junto a ela, que faria de tudo pela sua felicidade.

O motivo de tudo era ela.

— Eu reconheço que o momento mais difícil da minha vida foi o momento em que tudo veio a tona e eu percebi que não havia superado, apenas fingia que as coisas ao meu redor não me afetavam. — Ela começou a dizer em meio ao silêncio enquanto eu apenas a encarava — Tudo se enrolou tanto como uma bola de neve... — Suspirou. — Então retiro o que eu disse lá na infância sobre voce não estar comigo no momento mais difícil da minha vida. Porque você esteve. E agora se você me permitir, quero retribuir o favor que fez por mim. Porque afinal, um porto seguro também precisa de um. Vamos ser o porto seguro um do outro.

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