32 - No time.

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Estou com sono. Minha cabeça insiste em cair para o lado, mesmo que ela esteja apoiada sobre o a minha mão. Estou sentada em frente a escrivaninha, estudando, coisa que era raro de acontecer.

Hoje é domingo. Mesmo que parasse de insistir, minha mente vagava pelas ruas de Nova York, vagava nas mãos de Noah em minha cintura ontem a noite.

Mas até agora, eu sequer havia recebido uma mensagem dele. Nenhum "oi" para deixar claro que ele queria conversar comigo. Nenhuma mensagem perguntando se eu estava bem, e era por isso que minha insegurança batia.

E se Noah tivesse feito que nem aqueles outros garotos? Se ele só quisesse ficar comigo e nada mais? Que ele não queria nada mais, além de ter me roubado uns beijos no escuro... e quanto mais eu pensava nisso, mais temerosa eu ficava. Estava com medo, porque eu gostava dele, e tinha medo.

Me apeguei a algumas coisas úteis que poderia fazer no dia. Pelo menos estudar, já que algumas avaliações iriam cair no meio da semana. Mas de repente, lembrei que em uma semana seria o meu aniversário. Já estava tão perto, e eu sequer lembrei disso. Eu faria vinte esse ano.

Vinte anos e ainda moro com meus "pais", sou completamente desastrada, nunca arrumei um namorado e nunca terminei a faculdade. Mas venho pensando em alugar um lugarzinho para mim, quando meu dinheiro não estiver tão apertado e eu sentir que realmente chegou a hora de sair de baixo das asas do meu pai.

Pelo menos eu estava cursando o que sempre quis, me sinto bem com meu pai, a Mary, e estou seguindo os passos rumo á um futuro digno de cada coisa que já passei. Isso é o que mais anseio.

Eu não estava assim tão ansiosa para meu aniversário nem nada do tipo. Já era outubro, e eu não estava nem aí. Não havia como correr, já que os dias sempre iam para frente e nunca para trás. Meus aniversários passados sempre foram bons, devo admitir, mas nada muito esplendoroso. Quem sabe esse ano seja diferente. Eu torço.

[...]

— Lady bug é mil vezes melhor, Mary! — Exclamei e ela negou diversas vezes com a cabeça. Estávamos discutindo sobre qual era o melhor desenho.

Mary dizia que era Show da Luna, eu insistia em dizer que era Lady Bug. Desde pequena, sempre assistia a esse desenho, sabia de cor a música e as falas da Marinette. Confesso que demorava a assistir, agora que tenho outras coisas para me preocupar, mas sempre recorria a esse TV.

E outra que se passava em Paris, França. A cidade do amor. Se um dia eu tivesse a chance de viajar para algum lugar, seria para Paris. Quem sabe viver um belo romance e assistir ao pôr-do-sol em frente a Torre Eifell com um garoto especial.

De preferência, Noah Howard.

Minha mente declarou e eu quis rir. Era meio mórbido, já que depois daquele beijo, nem ao menos conversamos mais. Ele deve ter me esquecido, se é que lembrava de mim.

Penso que talvez ele só queria ficar comigo e colocar meu nome na lista de garotos que ele tinha ficado. Será?

— Já disse, Bru! Nada que você falar, vai mudar minha opinião, completamente formada. — Dei de ombros e dei a língua para ela.

Estava passando os dois desenhos ao mesmo tempo, mas como so tinha uma TV, ficava difícil assistir. Eu insistia que deveríamos assistir Lady Bug, mas ela queixava que deveríamos assistir Show da Luna.

— Já chega. — Me levanto do sofá fazendo uma careta de empurrada. — Vou assistir pelo meu celular. Cansei de você.

Subi as escadas, mas ainda escutei ela dizendo:

— EU SEI QUE VOCÊ ME AMA, FILHA! — Parei rapidamente de onde eu estava e olhei pra ela. Meu coração prestes a sair pela boca.

Ela tinha me chamado de filha? FILHA? Mary nunca tinha me chamado de filha, nem sequer já havia pronunciado isso, e de repente, fiquei paralisada no lugar. Me veio fleches de quando eu era criança e do quanto desejei escutar aquilo de minha mãe, mas era meio que impossível.

Não sabia o que dizer, então voltei a vida e saí correndo para o meu quarto. Fiquei com aquilo na cabeça até uns minutos, enquanto andava de um lado para o outro. Não conseguia parar de pensar que ela havia me chamado de filha. Me senti especial, senti um carinho, senti vontade de chorar, mas não o fiz.

Então, puxei uma caixa de de baixo da minha cama e coloquei em cima da mesma. Tirei uma tela branquinha e antiga que eu ainda nem havia usado. Tirei uns pincéis e umas tintas também, tirando de cima da cama e colocando no para-peito da janela. Organizei um cavalete e coloquei a tela, mas antes tirei o plástico da mesma.

Depois de meses, eu iria pintar um quadro de verdade. Era meio que reconfortante. Despejei um pouco de água numa vasilha que havia em meu quarto. Então coloquei uma música para tocar no meu celular, na playlist que me dava inspiração para pintar, sempre que podia.

Deixei o celular ali tocando. Vesti minha jaqueta velha e gasta do guarda-roupa, vesti a mesma e fiquei pronta para pintar. A música No Time tocava, e eu senti uma coisa esquisita em meu peito.

Fiz o rascunho, bem demorado, com um lápis e depois fui pintando toda a tela de um preto escuro. Usei diversas cores e tive que misturar algumas para dar a cor que eu queria. Os traços do pincel já não era estranho para mim, era reconfortante. E mesmo que eu estivesse sobrecarrega, na minha área sentimental, eu tinha tempo para pintar. Lá estava eu tomando um pouco do meu tempo para pintar.

Pensei em Noah Howard, o porquê de ele não mandar mais mensagem para mim; pensei em minha mãe, por que ela não ligava pra mim? Por que eu não queria mais que a minha vida acabasse? Realmente, eu tinha criado para mim que iria terminar a vida, talvez de uma forma diferente, mas ainda sim, eu ia.

Talvez alguns chorassem, outros não. Isso para mim não importava mais. A vida estava sendo até boa comigo, mas não era o que eu queria.

Eu estava chorando, porque meu coração estava partido. Uma angústia tomava conta de mim, do meu peito. Uma dor sufocante. Gostar de alguém pode ser tão doloroso assim? Chorei porque não compreendia porque as coisas só aconteciam comigo.

De repente eu tinha mudado de expectativa de vida. Não amava a vida, não me amava. Eu não era de boa comigo mesma, não me sentia amada e não conseguia me amar. Se ao menos eu me amasse, talvez levaria a vida em frente.

Mas o mundo tende a ser decepcionante. Eu tinha traumas porque o mundo, as pessoas são assim. Machucam para não serem machucadas. Se eu fosse mais fria, não conseguiria sentir dor.

Eu não me amava. Tudo me abalava. Vivia perdida em coisas estranhas, com a cabeça na luz e fingia ser alguém que eu não sou! Eu estava ficando sem tempo, sem tempo para mim, sem tempo para cuidar de mim e sem tempo para me amar.

Ao invés de terminar de pintar o quadro, desabei em minha cama, enquanto os toques da música só aumentava e eu escutava gritos. As lágrimas desciam, um desejo de não estar mais aqui. Uma dor em meu peito, uma mágoa, um sentimento de estar com o coração partido.

Chorei como uma criança. Prometi para mim mesma que tudo aquilo não iria durar muito. Não iria ser agora que tudo aquilo iria acabar. Eu ia esperar até os meus vinte, e aí sim, daria fim a minha vida.

•••
Seguinte...

"Sem tempo"

Eu sei que o capítulo está bem depressivo, mas enfim. Ah, agora que as coisas vão começar acontecer. Prepaparem-se.

O Garoto Do Ônibus || Concluído ✔️ Onde histórias criam vida. Descubra agora