Como é que larga desse trem?

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Abri os olhos e percebi que o sol já estava alto lá fora. Eu sequer havia lembrado de fechar a cortina do quarto na noite anterior.

Dei uma leve espreguiçada, sorrindo ao lembrar do porquê eu esquecera de fechar a cortina. Virei para o lado e vi que estava na cama sozinha. Fui obrigada a rir. Era óbvio que ele não estaria mais ali.

Wendell era orgulhoso. Eu tinha certeza que ele iria me dar o troco por ter ido embora antes dele acordar naquela primeira noite no Rosewood.

Virei novamente para o outro lado, me enrolando ainda mais nas cobertas, lembrando de tudo que fizemos na noite anterior. Pelas minhas contas, havíamos jantado só perto das duas da manhã, depois de transar umas cinco vezes na cozinha e na sala.

Lembrei, de repente, da jogada ousada que eu havia feito: convidar Wendell para ir no show meu e da Maiara em São Paulo, no dia seguinte.

Meu objetivo era óbvio e eu sabia que ele tinha reparado: introduzir para minha irmã e nossa equipe uma possível volta entre eu e ele. E, apesar de, normalmente, eu não gostar de ter minha vida pessoal vazada, confesso que não me importaria em causar um pequeno rebuliço caso alguma foto nossa juntos rodasse por aí.

Suspirei, preocupada. Era fato que Wendell despertava em mim um lado aventureiro e um tanto sem noção.

Mas eu também havia notado que ele tinha hesitado em aceitar o convite, como se algo o incomodasse. Eu tentara, de todas as formas, identificar o motivo daquela hesitação, sem sucesso.

"Esquece, Maraisa. Para de colocar problema onde não tem. Só curte o momento e deixa acontecer. Não tem nada de errado, vocês são dois adultos desimpedidos" - pensei, sacudindo a cabeça, enquanto levantava da cama.

Vesti o primeiro conjunto de moletom que achei no closet, descendo as escadas, descalça, quase saltitando. Quando cheguei perto da entrada da cozinha, senti o cheiro forte de café passado.

Entrei no aposento e vi uma mesa de café da manhã montada. A garrafa térmica cheia de café preto, uma cesta de frutas, biscoitos, pães e patês. Senti meu rosto corar quando reparei que uma pequena rosa vermelha pousava no centro da mesa.

Não consegui conter o sorriso. Peguei a flor e fechei os olhos, cheirando-a. Tinha o cheiro dele.

Abri os olhos novamente e só então reparei que uma pequena folha de papel estava colada na porta geladeira, com um recado curto, escrito com uma letra que eu conhecia bem.

"Te vejo amanhã em São Paulo. Dessa vez eu pago o vinho. Ah... De nada pelo café".

Revirei os olhos, rindo, enquanto encarava a mesa posta, segurando a flor e o bilhete.

Era óbvio que eu estava fodida. O que havia começado como um mero e inofensivo remember tinha trazido à tona um mar de sentimentos antigos que, no final das contas, nunca havia morrido. Só estavam guardados, sendo ignorados por mim nos últimos três anos.

Meu coração, no final das contas, nunca tinha largado dele.

Sentei na mesa, me servindo de uma xícara de café, lembrando de como eu havia me entregue ontem. Ao contrário da noite no Rosewood, onde eu tinha me esforçado para controlar toda a situação, na noite de ontem eu tinha deixado Wendell me dominar por inteira. E não estava nem um pouco arrependida. Muito pelo contrário.

Apesar do sorriso no rosto, enquanto lembrava de tudo que havíamos feito e conversado, aquilo me assustava. E muito. Eu já havia assistido esse filme. E ele não tinha terminado muito bem.

Suspirei, bebendo mais um gole de café.

"Eram outros tempos, não? Éramos mais imaturos, quem sabe..."

Encontro com o passado - MADELLOnde histórias criam vida. Descubra agora