Encontro com o passado - MADELL

Certo pelo duvidoso

- Ele entregou isso para você? Com esse recado escrito? É a letra dele? - perguntei, pela milésima vez.

Maraisa estava visivelmente cansada, depois de eu ter feito ela repetir a história do que acontecera na casa do Wendell mais cedo, mas concordou com a cabeça antes de responder:

- É a letra dele. Eu conheço bem. A gente costumava a trocar bilhetes curtos quando nos encontrávamos... - percebi que ela deu um sorriso fraco, como se tivesse se perdido em alguma lembrança boa e nostálgica.

Mordi o lábio, também sorrindo. Eu estava visivelmente empolgada, mas não queria criar expectativas na minha irmã sem ter a certeza de que tinha sido o Wendell que escrevera aquilo. Afinal, a tal da Luísa já tinha mostrado que era capaz de tudo, até de simular um recado dele para a Maraisa.

E eu era obrigada a admitir que simpatizava muito com o Wendell. De todos os ex namorados da Maraisa, ele era, de longe, o que mais combinava com ela. Não que a concorrência fosse muito pesada. Depois de ter aturado o Fabrício por quase dois anos, qualquer coisa que viesse era lucro.

- Ele ficou feliz com a notícia? - perguntei, tentando, ao máximo, fingir desinteresse. Eu conhecia minha irmã bem o suficiente para saber que, caso ela se sentisse pressionada ou desconfortável, iria se fechar e eu não conseguiria tirar nem mais um "ai" da boca dela.

Maraisa deu de ombros, os olhos ainda marejados do tanto que ela chorara desde a hora que havia chego em casa. Me doía de formas inimagináveis ver ela assim, mas eu sabia que, se me intrometesse muito e ela ficasse sabendo, eu teria um problema sério.

- Acho que sim - ela disse, a voz um pouco trêmula - quer dizer, ficou... Ele tava todo bobo, sabe? Mas não adiantou muito, pelo visto. Ele ainda vai casar com a... - Maraisa travou, como se tivesse dificuldade para falar o nome da noiva do Wendell - Luísa. Prefere ser pai do filho dela...

Torci o nariz, bebericando meu suco e desviando o olhar, encarando as árvores balançando com o vento fraco daquela tarde quente de Goiânia. Já fazia tempo que eu tinha quase certeza que algo estava errado naquela história toda.

- Maraisa... - comecei, encarando ela, medindo as palavras seguintes - você realmente não acha que tem algo muito errado? - percebi que a expressão tristonha dela endureceu, como se já soubesse onde eu chegaria com aquilo. Mas não me intimidei, continuando a falar, sem dar tempo dela me interromper - se ele realmente tá casando com a Luísa pela tal gravidez e sabe agora que você também espera um filho dele, sabe que a Luísa apagou as mensagens, vazou sua gravidez pro Léo Dias... Se ele realmente te ama, como ele disse no convite... O que impede ele de largar tudo e ficar com você?

Maraisa se remexeu no sofá, claramente incomodada, algumas lágrimas discretas voltando a rolar pelos seus olhos.

- Talvez ele seja um baita manipulador também. Não quer que eu siga em frente, mas também não quer trocar a família perfeita dele pela gravidez indesejada da amante. Não quer trocar o certo pelo duvidoso. A Luísa é o certo, o close perfeito, a mulher troféu... Eu sou...

- Maraisa - interrompi, rolando os olhos - você conhece o Wendell há anos. Sabe muito mais do que eu que esse é exatamente o perfil de mulher que ele odeia. Você sabe que tem algo muito errado aí, só tem medo de admitir. Você simplesmente aceitou a derrota para a Luísa. Sério que vai deixar essa piranha mentirosa levar o homem da sua vida embora assim fácil? Logo você?

- Ele quer que seja assim - Maraisa retrucou - ele escolheu. E é isso. Vou criar meu filho sozinha - notei que ela levou a mão até o ventre, mesmo que, a olho nu, não houvesse qualquer sinal de gravidez ali.