3 - Doutor Gustavo. 🏇

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Seguimos para fora do hospital e logo percebi que o dia estava diferente. A tempestade já havia passado e o sol brilhava com muita força. Percebi que os céus queriam me dar um sinal. Que de uma forma inexplicável tudo ficaria bem.

- Venha, vamos comer algo! - Gustavo disse se referindo a uma lanchonete que ficava do outro lado da rua.

Seguimos até lá e nos sentamos numa mesa que ficava no lado de fora da lanchonete. Fizemos nossos pedidos e enquanto aguardavamos, observei o mundo a minha volta. Em frente ao hospital mais ao lado da lanchonete, havia uma pracinha, típica de cidade do interior. Lá, vi alguns idosos fazendo caminhada, crianças brincado e correndo, pais felizes conversando enquanto observavam seus filhos, a vida ali seguia seu curso, seu rumo. E naquele momento percebi que a vida precisava ser vivida.

- Obrigada Gustavo, por não ter deixado eu fazer aquilo! - digo olhando em seus olhos.

Sob a claridade do sol, os olhos de Gustavo brilhavam ainda mais.

- Por quê? - sua pergunta é direta.
- Por que você ia fazer aquilo? - vejo dor em seus olhos.

Meus olhos se enchem de lágrimas e logo elas caem. Sinto um aperto no peito ao pensar no que eu iria fazer. A sensação era agonizante. Apenas faço que não com a cabeça em meio as lágrimas, e então nossos pedidos chegam.

Após comermos em total silêncio, Gustavo me leva até o carro dele que havia ficado no estacionamento do hospital. Seu carro era um desses carros altos e potentes que víamos muito em fazendas e cidades do interior.

- Para onde você estava indo? - ele pergunta ao ligar o carro.

- Santa Dolores! Fazenda Boa Esperança. - digo.

Ele me olhou atentamente.

- Se não for para lá que esteja indo, posso esperar o próximo ônibus! - falei.

- Não, é para lá mesmo que vou!

- Você pode me deixar na cidade, lá pego um carro que me leve para a fazenda, é onde minha mãe trabalha. Estou voltando para casa! - tento explicar.

- Não se preocupe, a levo até sua mãe! - e ao dizer isso ele dá partida e seguimos viagem.

Não estávamos tão distantes assim de minha cidade natal. Alguns poucos quilômetros depois já pude ver o pequeno letreiro que dizia:" Bem-vindos de volta a Santa Dolores". Lembro-me do dia que o prefeito inaugurou aquela placa, ele dizia que o bem-vindos de volta era porque qualquer um que estivesse entrando ali não estava indo pela a primeira vez, Santa Dolores tinha disso, era uma pequena cidade encantadora que quem a visitava pela a primeira vez sempre voltava. Ninguém conseguia ficar sem pisar os pés ali novamente.

Seguimos pelos os arredores da cidade indo em direção a parte rural.

Algumas coisas haviam mudado ali desde a última vez que estive por lá. Em uma de suas ligações, minha mãe disse que um homem muito rico havia chegado na cidade. Ele havia comprado a fazenda em que ela já trabalhava e havia aumentado a produção do lugar gerando assim mais empregos para as pessoas da região. A fazenda havia crescido e se expandido e era a principal fonte de recursos para a cidade com a criação de cavalos.

Logo vi que a fazenda também havia passado por pequenas mudanças, o letreiro havia mudado, estava mais chamativo, e logo vi numa parte mais afastada um grande número de cavalos percorrendo o lugar. Seguimos pelo o antigo e mudado caminho de terra com grandes palmeiras plantados lhes dando sombra até a casa grande. O carro parou bem em frente a casa e logo vi um funcionário que eu não conhecia chegando.

- Obrigada por tudo Gustavo! - digo o agradecendo. Ele apenas faz que sim.

Desço do carro e Gustavo faz o mesmo, certamente ele irá pegar minha mala. O funcionário se aproxima e logo me apresento.

- Sou Amora, filha da dona Francisca. Pode avisar a ela que estou aqui? - pergunto gentilmente.

O homem que parecia ser um pouco mais velho que eu me olha e olha para atrás de mim, certamente para Gustavo e após breves instantes ele faz que sim e segue para a dentro da casa.

Observo tudo a minha volta, a movimentação da fazenda, alguns funcionários que trabalhavam ali, o ar fresco e limpo, a sensação de estar em casa novamente... Até que meus olhos param ao encontrarem dos de Gustavo. Ele parecia sereno, terno, como se conseguisse mais numa vez entender o que eu estava sentindo. Era incrível como nossos olhares se entendiam, como que palavras nenhuma pudesse sere ditas mas mesmo assim conseguíamos nos entender através do olhar. Desde a primeira vez que o vi foi assim.

E então uma voz conhecida se fez ouvir.

- Amora! - ouço minha mãe me chamar.

Me viro e lá está ela, descendo os degraus da casa com seu avental preso a sua cintura e seus olhos brilhando ao me verem. Minha mãe corre ao meu encontro e me abraça com força. Um abraço apertado e cheio de saudades.

- Minha filha, por que não me disse que estava vindo? - ela pergunta enquanto ainda me abraça.

- Quis fazer surpresa! - digo timidamente.

Nos saímos de nosso abraço.

Pegando em minhas duas mãos minha mãe me olha dos pés a cabeça.

- Você está diferente! - ela diz de forma terna.

Sinto minhas bochechas corarem. Minha mãe havia desconfiado de algo. Mas antes que algo a mais seja dito, ela enxerga por trás de mim, como se finalmente visse que eu não estava só.

- Doutor Gustavo, já conheceu minha menina?! - ela diz para ele.

Olho imediatamente para Gustavo que mantém um ar sereno no olhar.

- Sim Xica! Eu e sua filha já nos conhecemos. - ele diz com um leve sorriso.

Doutor Gustavo! Doutor Gustavo. Sim, era ele! Como não percebi isso antes?! Gustavo era o tal doutor Gustavo de quem tanto minha mãe falava. O tal homem que chegou da capital e que comprou aquele lugar, e que também expandiu aquelas terras. Era ele!

- Jorge, por favor leve a mala da filha da dona Xica para dentro! - ele diz ao homem que foi chamar minha mãe.

Rapidamente o homem a pega e se vai.

- Amora, dona Xica! Vou deixar as duas matarem a saudade. Espero vê-la no almoço Amora! - e com isso ele se vai, indo para dentro da casa.

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