4 - A verdade 👣

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Por dentro, a casa grande parecia a mesma de antes de minha partida. Os móveis eram os mesmos rústicos de antes, tudo no mesmo lugar, do mesmo jeito.

- Minha filha, estou tão feliz em lhe ver novamente! Você não sabe a alegria que senti em lhe ver. Mas, não sabia que já tinha pegado férias do serviço! - minha mãe me olha atentamente.

Ela sabia que tinha algo no ar.

- É porque, não saí de férias, mãe! Saí de vez. Pedi demissão do serviço e resolvi voltar para casa. - digo tentando disfarçar a dor.

- Mas, o que aconteceu? - ela pergunta ao pararmos ainda no corredor que dava acesso a cozinha.

- Nada demais mãe! Só que, bateu saudade de casa. - tento disfarçar. Era quase impossível.

- Sei que o mundo lá fora não igual nossa casa, as vezes, a solidão aperta o coração, a saudade fala mais alto. Mas, e o seu sonho de estudar, se formar, trabalhar como advogada? Desistiu disso também? - ela insiste.

- Não, mãe! Claro que não! - digo convicta.
- Só que, adiei um pouco... Não é por muito tempo, logo começarei novamente! - não por muito tempo, uns nove meses e mais o tempo do resguardo, penso.
- Quem sabe, eu não consigo realizar todos os meus sonhos aqui mesmo, na faculdade da cidade vizinha?!

- Eu sempre disse isso a você, mas filho nunca escuta mãe! Sempre falei, estuda aqui mesmo. Trabalha aqui na cidade e estuda aqui como todo mundo faz. Mas você sempre foi igual seu pai, que Deus o tenha! - ela olha para o teto da casa.
- Você, minha filha, sempre fui passarinho que nunca aceitou viver apenas no ninho, sempre quis voar! - ela me olha com ternura.
- Mas fico satisfeita com sua decisão. Você saiu, viu que o mundo lá fora não é fácil, e está aqui de volta. E o que importa é isso, que você voltou! Vamos continuar de onde paramos. - faço que sim.

- Estou feliz por estar de volta! - digo com um leve sorriso.

Minha mãe sorri.

- Só tem um pequeno detalhe! - a olho atentamente.
- O doutor Gustavo contratou mais mulheres para me ajudar na casa, e, nossa casinha dos empregados agora está lotada, mas vamos dar um jeito. Aqui sempre foi como coração de mãe, sempre cabe mais um! O importante é que ninguém dorme fora de casa. - ela garante.

A beijo na testa.

- Eu sei disso dona Xica! Seu coração é maior que essa fazenda toda. - digo lhe dando vários beijos pelo o rosto.

Minha mãe sorri ainda mais.

Como era bom estar de volta a minhas raízes. Era uma sensação maravilhosa de paz e aconchego que só lá tinha. Definitivamente não havia lugar melhor no mundo que nossa casa.

👣


O almoço já havia sido terminado. Na cozinha, eu ajudava as outras mulheres que ali trabalhavam.

- Nossa, parece que uma multidão vai comer aqui hoje! - digo ao colocar o arroz numa travessa enorme de vidro.

Minha mãe sorri.

- Aqui todos os funcionários da casa almoçam junto com o patrão! - ela diz.

A olho surpresa.

- Mas por quê? - a pergunta é inevitável.

- Doutor Gustavo não gosta de fazer as refeições sozinho. Todos os dias, em todas as refeições é assim! - ela explica.

Aí eu me lembrei. " Espero vê-la no almoço Amora". Era por isso que ele havia dito aquilo, porque certamente nos veríamos no almoço. Continuo a colocar todo o arroz na travessa enquanto as outras mulheres organizam tudo para colocar á mesa.

Eu precisava conversar com Gustavo.

Desde quando decidi voltar para casa nunca fiz planos de como contaria tudo a minha mãe, nem sabia ao certo como ela iria reagir a situação. Mas não estava nos meus planos que o seu patrão desse com a língua nos dentes. Eu precisava de tempo, de preparação. Isso não era uma coisa fácil de se dizer. Principalmente quando sua mãe aposta todas as fichas em você, principalmente quando você é a única esperança de um futuro melhor. Eu havia me tornado a decepção de minha mãe, e nunca me perdoaria por isso.

- Vamos Amora! Está tudo pronto. - minha mãe diz.

Olho em volta da cozinha e percebo que todos já se foram. Eu havia me perdido em meus pensamentos. Fazendo que sim, sigo com minha mãe e a travessa de arroz em mãos.

Ao chegar na sala de jantar, vejo todos a mesa.

Gustavo estava sentado á cabeceira da mesa, Jorge, o capataz ao seu lado direito, e as três mulheres da cozinha, Mara, Ana e Branca ao seu lado esquerdo.

- Fico feliz que tenha vindo Amora, sinta-se a vontade! - Gustavo diz ao apontar para a cadeira vazia ao lado de Jorge.

- Obrigada! - digo.

Sigo com minha mãe até os lugares vazios e nos sentamos. Logo a refeição é servida por nós mesmos em nossos pratos.

A refeição segue normalmente. Gustavo sempre de bom humor conversava de igual pra igual com seus funcionários que ali, mais pareciam seus amigos de longa data. Todos riam e comiam como se estivessem sim, a vontade. Até que, em um certo momento enquanto todos comiam e conversavam sobre algo relacionado a uma cantoria a noite, Gustavo me olha por alguns instantes, todos estavam distraídos e então deixo meus lábios balbuciar.

- Preciso falar com você! - digo sem emitir som.

Ele faz que sim com a cabeça.

- Dona Xica! - ele diz a minha mãe. Ela o olha com um leve sorriso.
- Estava tudo maravilhoso, como sempre! - ele a elogia pela a refeição.

Ela balança a cabeça em sinal de positivo.

- Gostaria de conversar com sua filha, se importa? - ele pergunta.

- Não! Claro que não. - minha mãe diz prontamente.

- Amora, poderia me acompanhar até meu escritório? - ele pergunta. Faço que sim.

Gustavo se levanta e eu também, e assim seguimos até seu escritório.

Ao chegarmos, fecho a porta e me viro. Gustavo se sentou em sua mesa de couro preto e seguida ele estende a mão para que eu me sente a sua frente. Me sento e ele me olha atentamente, esperando que eu comece a falar.

- Antes de tudo quero agradecer mais uma vez por tudo o que fez por mim! - digo. Ele faz que sim.
- E, acho que já tenha percebido que eu voltei para ficar com minha mãe. Quero saber se, isso é um problema par você!

Ele me olha de forma séria.

- Sua mãe sempre deixou claro que a qualquer momento a filha dela voltaria a viver aqui, e eu nunca recusei sua volta. Eu só não esperava que a mulher a quem ajudei na estrada fosse a filha de dona Xica! - ele parece surpreso e confuso.
- Certamente sua mãe não sabe sobre a gravidez!

- Não, ela não sabe! - digo.

Ele se inclina para a frente, apoiando os braços sob a mesa.

- Por que Amora? Por que você ia fazer aquilo? - sua pergunta é direta, e Gustavo a faz me olhando atentamente.

- Eu....- sinto as lágrimas brotarem em meus olhos.
- Eu... Fui estuprada!




Nota da autora: Alguém esperava por isso? 🥺

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