capítulo 1.

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Por que a vida nos filmes era sempre mais interessante? Como era possível que Hollywood conseguisse deixar um atraso matinal, má alimentação e correria tão glamurosos? Assim, cá entre nós, acordar as sete da manhã em desespero porque perdeu o horário para o primeiro dia de trabalho só parecia legal nas telas. Na vida real, a sua geladeira está vazia porque você não fez as compras da semana, e suas opções são meia garrafa de vinho e uma banana velha, nada de um cappuccino expresso. Na vida real, você não tem tempo para escolher a roupa do dia e sair pelas ruas desfilando, você usa o mesmo tênis de sempre, com a mesma calça jeans de sempre, e o moletom mais confortável possível, porque imagina que loucura sair correndo para o ponto de ônibus de salto alto... Cara, o que eu daria para viver em filmes!

Andar de ônibus era sempre uma experiência. Mochila enroscada na catraca, troco caindo no chão, motorista dando partida antes de você achar um lugar. Tudo junto, formando o combo perfeito de uma manhã promissora...

Não quero parecer ingrata, estou passando perrengue, mas pelo menos é na Europa. Encosto a cabeça na janela do ônibus e me dou conta de que é a primeira vez na manhã que posso respirar com calma. Tiro 10 segundos para minha alma voltar ao corpo, e mentalizo tudo que devo fazer no dia: primeiro, o trabalho novo, que a semanas vinha tirando o meu sono. Não me leve a mal, era ótimo finalmente ter um emprego na minha área, ia turbinar meu currículo além de me trazer experiência, a questão era que, trabalhar em uma revista de fofoca não era bem o meu maior sonho quando me mudei para a Espanha. (In)felizmente, os espanhois tinham uma certa tara por fofocas, e mesmo na era do twitter , as revistas ainda vendiam a todo vapor.

Em 40 minutos chego ao me destino, 5 minutos adiantada, o que pra mim, era um milagre. A El Jueves ( a maior revista de fofocas da Espanha, como eles mesmos gostavam de se intitular) ficava em um edifício comercial com mais de 50 andares. Nem percebi que estava segurando a respiração quando entrei no elevador, com a minha credencial já em mãos. Meu nome, minha foto 3x4 horrível e o nome da revista. Então era isso, estava acontecendo.

(...)

- Seguinte, Carolina. - Carmen, a editora chefe da revista me acompanhava em tour. Não tinha muito o que ver, na verdade, eram um amontoado de mesas com divisórias, a ala da cafeteria e as salas de reunião. - Posso de chamar só de Lina?

- Claro. - Um ano de Espanha, e o modo como eles pronunciavam meu nome nunca deixava de ser divertida. Karolína.

- Ótimo, Lina, você vai ficar na área de esportes. Seu currículo dizia que você tinha experiência, e a carta de recomendação de um de seus professores também foi ótima. - Se por experiência ela queria dizer narrar os jogos do interclasse da minha antiga escola, então sim, eu tinha muita experiência em jornalismo esportivo. Quer dizer, fofoca esportiva.

- Ah claro, muita experiência! - Falo sorrindo e Carmen sorri simpática.

- Que bom! Como você já deve saber, a nossa maior fonte rentável é a revista virtual, o site da El Jueves é atualizado toda segunda, e na terceira quinta feira do mês a revista física vai para as bancas. O sonho de qualquer um aqui dentro é ter uma matéria na nossa edição mensal!

- Posso imaginar...

Carmen me guia por aquela enorme sala, parando em frente a um dos gabinetes minúsculos. Todos eles eram iguais, uma mesa com gavetas e um notebook com o logo da empresa.

- Essa vai ser sua mesa de trabalho. Tem tudo o que você precisa. Sua carga horária é de meio período, conseguiu mudar sua grade na faculdade? Se esse estágio por um acaso atrapalhar seu rendimento acadêmico, somos obrigados a te dispensar... - Carmen fala um pesar na voz, e algo me diz que ela não estava realmente tão triste assim, parecia que ela já havia usado esse discurso milhões de vezes antes de mim.

ANTI - HERO  || Pablo GaviOnde histórias criam vida. Descubra agora