Além da Coroa e do Nevoeiro [CONCLUÍDA]

Capítulo 8: A rosa dos ventos

O que os olhos muito ansioso poderão não enxergar numa simples história é o seu ponto mais crítico, o seu ápice, o seu momento de reflexão, de dúvida e de medo. O ser que está acostumado a viver uma vida intensamente agitada talvez nunca consiga compreender o momento mais soturno de uma alma que reflete.

Os altos e baixos de uma vida corrida nunca serão verdadeiramente significativos, pois o indivíduo não lhes dá a devida atenção. O mau e o bem correm como o vento, uma hora estão ali, e na outra hora, apenas o deserto ficou.

Um velho homem da ilha do nevoeiro, com marcas ao redor dos olhos que falam por si sua idade, um dia disse:

— Vivi muito, e por muito tempo, mas não lembro-me de um terço.

Este é um dos grandes atributos da velhice, o esquecimento. A mente por natureza se envolve numa bruma densa e escura, como um nevoeiro, e distorce a luz como a água. Uma lembrança triste torna-se feliz, e uma feliz, talvez em triste. Acontece que o jovem que não se presta a entender o que vive no presente, intensifica o futuro nevoeiro que em breve rodeará sua mente. Já não será apenas uma cortina de fumaça, será uma tempestade.

Acontece que o que falo neste momento não é um conhecimento privado, muito menos complexo. É simples e transparente, como a água. Posso assumir todos os tipos de abordagens, me distanciando e me aproximando da narrativa, do personagem grande ao pequeno, do mais moço ao mais antigo. Não é porque uma história é contada por olhos pequenos, avançados, não confiáveis ou animais, que não é uma história, ou que não carrega em seu âmago um peso maior que o do mundo.

Sumarizando o que viria a acontecer, Olip acordou no dia seguinte disposto a se encontrar com os novos amigos que havia feito. Stuart e seu companheiro continuavam a avançar mata à dentro. O pássaro, o ser mais inusitado, permanecia a voar para o Norte, não querendo se esquecer.

Sobrevoou uma cidade destruída, numa paisagem lamacenta que marcava no chão uma poça escura e densa. Logo percebeu que deveria ter sido um pântano.

As casas eram sustentadas sobre estacas e vigas, a alguns metros do chão, provavelmente para escapar da água que deveria invadir em certas estações. Também tinham muitas pontes que ligavam as casas ao centro da vila.

Era tudo muito feio e muito bagunçado.

Na mente dele, um diálogo muito agressivo se formava, iniciando-se por um "O que fiz?" e esmorecendo num "Não posso me esquecer."

O pássaro sobrevoava uma planície muito lisa, que se estendia como uma folha de ouro. Seriam girassóis? Ótimo. O diálogo lembrou-se de uma moça, que segurava um girassol entre os dedos.

O terreno prosseguia dourado e vívido até uma pequena encosta, pontilhada com um conjunto de buracos e falhas nas rochas. A encosta tornava-se mais íngreme até transformar-se num monte de tamanho mediano, e do outro lado, um grande campo de mato verde e saudável crescia, balançando e farfalhando ao ritmo do vento.

O pássaro sentia-se sozinho. Carregava consigo uma única coisa, que já parecia pesada demais, sua consciência.

"Avance para o Norte" A voz ecoava em seus pensamentos. "Apenas continue" era ele quem pensava agora.

De qualquer forma, o corvo albino continuou a bater suas asas, sentindo o vento lhe confortar.

Como havia dito, uma história é contada por muitos olhos, e esta caminhará por eles.

Uma manhã ensolarada sucedeu a noite de cantoria no Balde de Escamas. Olip, antes de ter ido visitar Berno e Slim, caminhara pela vila, tendo a curiosidade como sua guia. Muitas pessoas caminhavam de um lado ao outro, carregando cestos nos ombros, enxadas, caixotes e baldes d'água. O menino, após fitar o sol rapidamente, julgou que seria horário de comércio. Viu muitas lojas serem abertas, restaurantes e hotéis também. Olip passou pela estátua de pedras negras e prosseguiu na direção que Slim o havia informado.