A estranheza é o ponto, a ponte que fará possível o tráfego dentre o real e o impossível, o verdadeiro e o inverossímil, o puro e o destoante, o perfeito e o desagradável, o lúcido e o ordinário, da rocha para as estrelas. Está é a beleza da história, do processo, da jornada contada, o caminho torna-se mais lindo se analisado por outros olhos, vozes e seres.
O leitor encontra na narração uma pedra em seu caminho, que talvez atrapalhe sua condução de chegar ao enfim destino, que talvez o atrapalhe de desfrutar das mais inóspitas, únicas, interessantes, arriscadas e extraordinárias aventuras que esta revolução aborda. Retiremos a pedra do caminho e então o caminho para a alma estará livre e aberto para contemplar todos os ensinamentos das vozes, mentes e seres.
Pôde ser notado que o narrador absteve-se de sua voz, e se afastou do palco para contemplar, junto aos demais, a narrativa tão importante. A verdade é que muitas das grandes histórias, das mais verídicas às mais fantasiosas, têm o ponto de conflito entre o verossímil e o não. Entre o coeso e o louco. O narrador, assim como vos escreve, também recebeu o que narra através da narração. Não devemos confiar no narrador, e sim na essência do que está sendo narrado. Portanto, o que vier a ser revelado, será, e o que precisar ser ocultado, será, pois o objetivo único de uma história é o afago da mente. O temporal de contemplação que recebe é o que fará da história uma boa história.
Ao olhar para o céu, os olhos enxergarão algo a mover-se pelo firmamento azul, com penas brancas batendo num ritmo lento. Sobrevoando a superfície azulada, um corvo albino fazia-se presente acima do mar. As nuvens brancas como as de verão se espalhavam pelo céu como fumaça fina. Na paisagem não havia nada a dar-se grande importância, exceto o único ser que movia-se com solitude pelo ar.
Não posso me esquecer. Ele pensava, com um esforço equivalente a carregar toras de madeira nos braços
O ser prosseguia para o Norte, e após ter avistado um conjunto de arquipélagos, e depois uma praia, sentiu-se ligeiramente aliviado.
Lembre-se!
Ele continuou por mais alguns metros, agora acima da ilha, até encontrar uma pequena e feia vila. As casas eram baixas, havia lojas de pesca e hotéis para todos os lados, tinha uma fonte de pedra negra, um bar moderadamente grande, algumas torres de observação e, o que o fez ficar mais intrigado, um muro de pedras negras que protegia toda a vila por terra.
Decidiu se aproximar e pedir por informações, com muita relutância.
— Continue para o Norte, talvez leve alguns dias, mas você com certeza saberá quando chegar lá — Disse um homem muito baixinho e careca.
A voz no sonho ainda o martelava no fundo da cabeça. Extremo norte. Não sabia se continuava naquela vila, ou se prosseguia. O sentimento sólido dentro de si, de dever, o fez continuar. Sem se despedir do homenzinho esquisito, ele partiu em direção ao Norte, podendo enxergar com facilidade o relevo estranho da ilha. As planícies mesclavam-se com florestas, as florestas mesclavam-se com as praias, e depois até algumas colinas surgiam.
Não posso me esquecer.
Sentia uma grande culpa pesar os pensamentos, mesclando-se com grandes dúvidas que floresciam ali. Ainda não sabia, e nem um palpite tinha, de como havia se tornado isto. Não conseguia se lembrar do que havia acontecido, apenas tinha a sensação de que algo muito importante, estressante e grandioso o acometeu, talvez não de forma boa, ou ruim.
Encaminhava-se para um destino que nem ao menos sabia dizer se era perto ou longe, sentindo o peso da culpa e da dúvida mesclarem-se num amálgama agonizante.
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Além da Coroa e do Nevoeiro [CONCLUÍDA]
AventuraO que a perda de um ente querido pode causar a um ser humano? Olip Maut, um menino de 12 anos, precisa lidar com as consequências da morte de seu melhor amigo, e enquanto isso, Olip irá trilhar um caminho por um mundo inteiramente novo e, por ve...