Capítulo 18

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*Um leve gatilho associado a suicídio, ou morte *

Com os dois lá fora, eu me voltei a sentar na cadeira, limpando as lágrimas que escorriam do meu rosto.
Todos eles junto com Ruben naquele caso vieram até mim saber como eu estava.

— Nos desculpe, ele não volta a pôr aqui os pés — disseram tanto, Fernando como uma das mulheres, a que fazia a maioria das minhas tatuagens.

— Me desculpem, eu não devia ter reagido desta forma, eu fingia melhor... — eu disse abaixando o rosto e deixando as lágrimas caírem, acho que os anos em que eu fingi estar bem, me fez mais tarde quase explodir.

— Fingiu tão bem, que durante anos eu nunca suspeitei — disse a minha mãe com preocupação, de certa forma como se culpasse de não me ter protegido.

— Deve ter sido algo muito grave, mas guardar tudo para si não faz bem — disse Fernando do meu lado.

— Foi sim, ele é um monstro, um cara que faz uma coisa dessas a uma garotinha...- ia dizer Rúben.

— Por favor, Rúben não — eu disse, não queria mais pessoas sentindo pena de mim.

— Tudo bem — disse ele.

Vi Fernando se afastar de mim, eu talvez sentisse algo por ele desde a primeira tatuagem que eu fiz e que falei com ele, mas como eu não tinha ninguém há muito pensei que era apenas carência.

Instantes depois Fernando estava no balcão, ele parecia falar com alguém e parecia também irritado.

— Não quero saber, eu pago o que for preciso — dizia ele.

Levantei-me algo dentro de mim, dizia que ele não ia fazer algo bom.

— Não está fazendo o que eu penso que está fazendo né? — perguntei quase irritada com ele, sabia que ele só tinha sabido ou imaginado o que o cara me tinha feito á poucos minutos, mas algo me dizia que Fernando ia mandar matá-lo e eu não queria que ele sujasse as mãos de sangue.

— Não sei do que está falando, estou apenas tratando de negócios — disse ele, mas eu sabia pela sua cara que estaria mentindo, via se bem no seu rosto.

Voltei para junto da minha mãe, a íris, a mulher que fazia a maioria das minhas tatuagens me perguntou: — Você tem alguma ideia para nova tatuagem?

— Algumas — eu respondi.

— Imagino como é difícil para você, vejo o seu olhar vazio, o mesmo olhar que a minha irmã tinha antes de se suicidar, e alguém lhe fez mal. Não é como uma rejeição, é fazer uma pessoa se sentir culpada — disse ela e eu soube naquele momento que ela sabia o que tinha acontecido.

— Me diz as suas ideias — pediu ela.
— Eu queria fazer duas grandes, mas não tenho dinheiro ainda — respondi.

— Não se preocupa, essas, nós pagamos é como se você fosse um cliente VIP, e as outras você paga metade — disse ela, mas logo foi interrompida por Fernando.

— ... 25% — disse ele.

— Não precisa, quando eu tiver dinheiro eu pago — eu disse, pois não queria que eles tivessem fazendo isso por pena.

— Não é pena ouviu, só queremos ajudar de alguma forma nos fala.— disse ela quase como se soubesse o que eu estava pensando.

— Uma delas é com um lobo, pequeno, como uma cria olhando um lago ou uma poça de água e vendo um lobo mais velho, como se ele estivesse vendo que era muito mais velho interiormente, como se tivesse passado muito — eu disse, explicando.

— Hum adoro a ideia, você tem alguma foto que eu possa ver? — perguntou Iris.

Peguei o meu celular e o abri numa pasta e mostrei a foto para ela.
— Você quer ela assim ou vai querer alterar algo? — perguntou ela.

— Estava pensando em colocar uma frase de superação por baixo — eu disse quase chorando de novo e baixando o olhar.

— Hum ok, deixa eu ver o que encontro — disse ela saindo e logo indo buscar o seu tablet.

Iris logo voltou e me mostrou algumas frases, a que me chamou mais a atenção foi "As maiores batalhas são dadas aos melhores guerreiros".

— Adorei esta — eu disse apontando para a frase, mas eu não gostava da frase naquele tipo de letra.

𝓐𝓼 𝓶𝓪𝓲𝓸𝓻𝓮𝓼 𝓫𝓪𝓽𝓪𝓵𝓱𝓪𝓼 𝓼𝓪𝓸 𝓭𝓪𝓭𝓪𝓼 𝓪𝓸𝓼 𝓶𝓮𝓵𝓱𝓸𝓻𝓮𝓼 𝓰𝓾𝓮𝓻𝓻𝓮𝓲𝓻𝓸𝓼

Então eu escolhi um tipo de letra que eu gostei mais.

— Vai querer fazer hoje ou prefere fazer outro dia? — me perguntou a tatuadora.

— Acho que eu prefiro outro dia — eu disse mais calma a olhando, me apercebi naquele instante que nem tinha feito o piercing.

— Quer que eu faça o seu piercing agora? — perguntou Fernando perto de mim, com ele eu me sentia de certa forma mais protegida só por ele estar ali.

Fiquei ali sentada com a minha mãe esperando o homem ir buscar os utensílios para fazer o piercing, parecia uma pequena bancada lá em cima uma pinça, agulhas e o piercing ao contrário do que eu pensei eu não pude colocar de início a argola só dois meses depois a podia colocar. Ele me explicou que eu não podia fazer caretas ou mesmo me mexer, pois o furo podia não ficar certo. Ele mediu o tamanho do furo com um aparelho e administrou uma leve anestesia. Fechei os olhos e tentei não me mexer como ele disse apenas a dor não foi das coisas ou mais fáceis na minha vida. Acho que a ideia depois disso era nunca mais fazer nenhum.

— Vão fazer alguma tatuagem a alguém hoje? — eu perguntei curiosa e tentando não ligar tanto á dor .

— Sim, por acaso nós temos, é só uma não é mesmo? — perguntou ela se virando para a secretária.

— Sim, — respondeu ela.

— Quer assistir? — perguntou Iris para mim.

— Se não for incomodo. — eu respondi. Não estava querendo ir para casa e falar sobre o que tinha acontecido.

— Não será com certeza, mas nós perguntaremos á garota.— disse ela se levantando e indo lá para dentro.

— Qual o seu chocolate preferido? — me perguntou Fernando deixando-me espantada e sem entender a razão de ele ter perguntado aquilo.

— Eu gosto de serenata de amor — eu disse respondendo-lhe.

Ele logo saiu, imaginei que ele ia comprar os bombons para mim, na minha mente eu nunca tinha pensado nele assim como um cavalheiro, mas a realidade é que ele estava mesmo sendo um cavalheiro comigo. Mais tarde antes mesmo de a mulher ter chegado para a tatuagem ele voltou e trazia alguns chocolates não só serenata de amor, ele tinha os bombons mas também frutos-do-mar que são outros bombons, chocolate Milka e Kinder Bueno, daqueles que eram especiais de natal e que continuam um peluche. Fiquei olhando para ele, não estava acreditando que tinha comprado tudo aquilo para mim.

— Para você — disse ele logo me estendendo os bombons.

— Obrigada, mas não precisava —  disse, tomando o a caixinha que tinha o peluche e logo eu retirei o pequeno tigre que estava nela o abraçando de seguida.

Mais tarde uma mulher chegou, ela bateu á porta o que por um momento me assustou e me fez pensar se ele iria aparecer de novo.

Mas não, era apenas uma mulher, ela entrou e logo a tatuadora a dirigiu até ao sofá de espera, fiquei esperando ainda na entrada, passado um tempo Iris me chamou para eu assistir à tatuagem, vi ela colocar o stencil no seu braço, ao que parecia ser um leão que ela ia tatuar na mulher. Fiquei vendo, mas, ao mesmo tempo, pensando o que ia acontecer quando eu fosse embora eu queria realmente que eu não tivesse que falar depois de tudo aquilo. Após a mulher ter ido embora eu sabia que era a última cliente deles, mas a loja ia ficar aberta até à noite para qualquer futuro cliente que lá quisesse ir. Quando chegou na hora do almoço eu já estava sentindo um pouco de fome, mas não queria ir embora também.

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