O dia havia sido tranquilo. A enfermeira que Lucas tinha contratado era um amor em forma de pessoa. Atenciosa, cuidadosa e muito dedicada. Aparentava ter não mais que quarenta anos, de estatura baixa e voz suave e calma.
Ela havia dedicado o dia a me explicar coisas que eu não fazia ideia sobre gravidez. Tudo era bem novo e muito assustador para mim. Em outras circunstâncias eu acredito que estaria lidando bem melhor com tudo isso, afinal, antes de toda essa loucura acontecer, estávamos nos preparando, ou melhor, eu estava, para gerar.
Angélica, como se denominou para mim, me levou para passear na praia, me deu refeições e vitaminas nos horários corretos e até meu banho, havia preparado. Eu estava me sentindo uma criança de sei lá, uns oito anos, com uma babá, era realmente muito doido tudo isso.
— Vou colocar uma série muito boa aqui na televisão para você, sobre algumas fases da gestação e depois você me diz o que achou.
Angélica gritou, do quarto.
Eu estava secando os cabelos com a toalha, enquanto me encarava no espelho do banheiro.
— Eu vou me traumatizar mais do que na conversa que tivemos a tarde? Por favor, diz que não.
Brinquei, saindo do banheiro e sentando na cama.
— Acho essas informações da série super leve, ruim mesmo é uma outra, que fala sobre o puerpério.
Respondeu, me encarando de relance.
— Por favor, Angélica, me deixe ter um minuto de paz.
Supliquei, novamente em tom de brincadeira e contorci a toalha, na tentativa de tirar toda água das pontas do meu cabelo.
Ela soltou uma risadinha e continuou a mexer na tv. Alguns segundos de silêncio e Lucas entrou no quarto, em disparado.
— Coloca uma roupa de frio, lá fora tá chovendo. Angélica, arruma aquelas roupas dela em uma mala que está embaixo dessa cama.
Ordenou, eufórico. Na mesma hora, Angélica começou a fazer o que ele havia mandado.
Me levantei, arqueando as sobrancelhas.
— O que tá acontecendo?
Perguntei, desviando meu olhar por cima dos ombros dele. Um batalhão de homens de preto habitava a sala. Eles carregavam algumas mochilas e estavam mexendo em um pequeno cofre que se localizava no centro da sala de Lucas.
— Não me faça perguntas, eu não estou com paciência, por favor. Só coloca a roupa de frio. Puta que pariu, você tá de cabelo molhado?
— Eu estava no banho.
Lucas se movimentada de um lado para o outro, seu olhar estava sem destino e ele parecia raciocinar muitas coisas ao mesmo tempo. A confusão mental era nítida e estava estampada em seu semblante.
— Senhor, quarenta minutos.
Um dos homens de preto falou, na porta do quarto.
— Porra!
Lucas esbravejou, socando o móvel ao lado dele e saiu, em disparado dali.
Assim que ele saiu, continuei estática e Angélica veio até mim, com dois casacos e uma calça.
— Coloca, dona Gabriela.
— Você sabe o que tá acontecendo?
— Não, mas é melhor fazer o que ele tá pedindo. Deixe-me enrolar seu cabelo em uma toalha seca, talvez assim seque mais rápido.
Por fim, peguei as vestes que ela havia me estendido e me direcionei ao banheiro novamente.
[....]
Eu nunca havia visto tantas vans pretas juntas desde o tempo da boate. Nem tantos seguranças juntos, de fato, aqui havia superado. A noite realmente estava fria e chovia bastante. Minhas mãos estavam congelando, mesmo que Angélica tivesse me agasalhado por inteira.
— Toma.
Lucas falou, entrando no carro em que eu estava, sentada no carona. Ele me estendeu uma touca e eu peguei, sem pensar duas vezes. Minhas orelhas pareciam que iam cair duras de tão geladas. Enrolei meus cabelos, que agora estavam úmidos e coloquei a touca sobre a minha cabeça.
— Obrigada.
Agradeci, enquanto ele ligava o carro.
Lucas não parava de olhar o retrovisor, nem um segundo. Apertei os olhos, tentando visualizar a direção em que ele olhava, disfarçadamente. A chuva forte que caia, estava atrapalhando o meu campo de visão. Pude perceber alguns detalhes, sem muita clareza, como: as vans ligando, uma atrás da outra, parecia que iam seguir o carro em que estávamos pois estavam posicionadas atrás dele, em fileiras. Os homens de preto adentraram nelas, pude contar uns dez ou onze por van. Também vi algumas armas e mochilas, que provavelmente carregavam coisas que eles pegaram da sala e cofre.
Eu estava tentando lidar com as mil sensações que meu corpo clamava para jogar para fora. Queria respostas.
— O que aconteceu, Lucas?
Perguntei, irritada.
Eu não era boba, haviam hipóteses perambulando a minha cabeça, ainda mais depois do que tinha ouvido na briga de Lucas e Júlia. Sabia que a motivação de tudo aquilo podia ter um nome: Gustavo e isso estava me fazendo ter um mini-ataque do coração. Meu corpo não respondia mais aos meus: "Respire, fique calma!"
Lucas, que não me respondeu de imediato e se ajeitou no banco, deu partida com o carro. Ele me encarou de relance e logo, voltou seu olhar para a estrada, pensativo.
— Vamos para outro lugar.
— Por que?
— Porque eu quero.
— Repentinamente? Sem motivos?
— Porra! O que você quer saber?
Ele gritou, batendo no volante. O carro derrapou minuciosamente e Lucas segurou firme, colocando-o em direção reta novamente. Me assustei, enquanto ajeitava-me no banco.
— Por que você tá agindo assim?
— Para de me fazer perguntas! Será possível?! Eu preciso pensar, eu preciso de silêncio.
Ele gritou novamente, na mesma hora, o celular dele, que estava sobre o porta-luvas, tocou. Encaramos juntos e ele pegou. Em seguida, Lucas desligou a possível ligação e jogou o telefone no banco de trás. Entendi que não era o momento de agir impulsivamente, eu estava lidando com um louco. Respirei fundo e a sensação de medo me invadiu. Após isso, o silêncio nos engoliu, enquanto Lucas acelerava o carro na estrada.
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La puta ll
Roman d'amourO segundo suspiro entre nós dois parecia o último. O que era real? O que era nós dois?