Capítulo 10

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Primavera de 2013

A encosta está ladeada de plantas efetivamente verdes. Inflo minhas narinas, uma emoção alegre adentrando meu peito e puxo o ar fresco. Uma brisa suave balança meu lindo vestido branco e eu sorrio.

Eu amo esse vestido e... amo a primavera. Posso dizer com razão que é a minha estação favorita do ano. Não gosto nada do inverno. É o total oposto de agora. Sombrio, escuro e acrômato.

Adoro observar as cores. O quanto elas são lindas e me trazem conforto.

Abro meus braços e corro descalça pela areia. Brincando, movo-me ziguezagueando. Deixo o sorriso em meu rosto se alargar mais e mais.

Fico muito contente quando mamãe faz seus negócios na vila de Shipwreck Coast, porque assim, ela me deixa brincar perto do mar. Suas advertências voltam como um relâmpago para a minha mente.

Não se aproxime tanto do mar, eu sei que você pode nadar. Mas você não conhece a escuridão que adentra os oceanos, é inocente demais para isso... por isso eu estou aqui.

Com essa lembrança, resisto ao impulso de querer entrar na água sozinha e continuo minha corrida. Mais devagar dessa vez. O canto dos meus lábios se curva, quando os pássaros voam próximos a mim. Volto a olhar para frente e meu sorriso diminui quando vejo uma figura deitada na areia com os pés dentro da água.

Mamãe nunca me deixa falar com estranhos, ela não me deixa conversar com quase ninguém na verdade. Apenas ela e Suzzy — minha aia. Mas uma força invisível me puxa até ela e não consigo me conter. Um pouco receosa me aproximo dela. Percebo que é um garoto, não parece muito mais velho do que eu. Talvez um ou dois anos de diferença.

— Não acho que seja muito apropriado você ficar aí — digo. — Pode ser perigoso.

O garoto vira seu rosto e seus olhos encontram os meus. Ele tem grandes olhos azuis, um pouco mais escuros que os meus. Percebo que ele não parece muito feliz. Seu olhar revela um pouco de mágoa e está escuro ao redor. Me pergunto por que. Mas ele só me observa e não diz nada. Ele verifica meu vestido e então, volta seu olhar para além da imensidão do mar. Eu deveria ir embora, ele não parece querer conversar, mas ainda sinto o puxão me fazendo sentar ao seu lado.

Ele está usando roupas pretas, combinando com seu cabelo que está um pouco grande na parte de cima. Observo uma mecha cair preguiçosamente em seu olho direito e resisto ao impulso de tirá-la.

— Por que você está aqui sozinho? — Pergunto.

O menino mexe com sua mão pela areia e brinca com algumas conchinhas, focando sua atenção nelas quando me responde baixinho.

— Você também está aqui sozinha, não?

Inclino minha cabeça deixando-a tombar para o lado. Ele está certo.

— Gosto de sentir o ar da primavera. Você gosta?

Ele deixa as conchas caírem por entre seus dedos e com uma respiração profunda, volta sua atenção para mim.

— Combina com você. Mas não comigo. — Ele dá uma pausa — Porém é adorável.

Combina comigo. Sorrio para ele. Ele não retribui, mas ainda me olha.

— Acho que não disse meu nome. É... Anne.

Ele curva seus ombros e fecha seus braços ao redor de seus joelhos. Percebo suas mangas arregaçadas, mostrando um pouco da pele de seus braços. Estreito meus olhos e noto algumas cicatrizes ali. Me pergunto como ele as conseguiu. Ele percebe que estou olhando e desce as mangas para baixo, tampando suas marcas.

Coração PirataOnde histórias criam vida. Descubra agora