6 - Amor e Amizade

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Beatriz

Chego em casa ainda absorvendo as surpresas de hoje. Quanta coisa boa numa única tarde! Só o fato de não ter ido à terapia, já era o suficiente para salvar o meu dia. Aí o Carlos aparece com essa missão linda de cuidar da Alícia, nossa protagonista e em seguida ele vem com a loucura de me tornar protagonista também.

Não sei se em outras circunstâncias eu teria aceitado embarcar nessa história. Provavelmente não. Mas o Carlos agiu pelas minhas costas, armou um plano, me enredou! Pegou uma criança linda de sorriso doce e olhos tristes para trabalhar comigo. Como dizer não para aqueles olhinhos? Pelo visto, essa novela será o melhor trabalho de todos os tempos, é uma pena que ainda faltam três semanas inteiras para as gravações começarem.

No dia seguinte, minha psicóloga me deixa duas mensagens no celular, na parte da manhã. Ignoro o máximo que posso, mas na hora do almoço ela me liga, perguntando quando poderei ir.

Ela tem essa audácia toda porque da última vez que me deu um "surto", minha mãe me trouxe ao Rio, me obrigou a caçar um profissional dessa área porque eu já havia abandonado cinco terapeutas em menos de dois anos. Eu não sou louca e o que eles chamam de surto, eu chamo de saudade, desespero, agonia ou tudo isso junto.

A primeira vez que tive um "surto", eu estava em Nevile, fui passar alguns dias lá depois de dois anos morando aqui. Nessa época eu já tinha certeza que o Daniel forjou aquele laudo para me fazer acreditar que minha filha está morta.

Em meu segundo dia lá, eu e meus amigos estávamos numa praça, perto da praia quando vi uma babá cuidando de uma menininha linda, de cachinhos dourados e olhos claros. Não resisti e me aproximei, brinquei com a criança, a peguei no colo e quis conferir se ela tinha alguma cicatriz no peito. A babá ficou enlouquecida, tomou a menina dos meus braços, aflita. Não a condeno. Ela estava coberta de razão, eu sei. Mas eu também tenho as minhas. Marcelo logo veio atrás de mim, se desculpou com ela, disse que eu tinha passado por um trauma muito grande. A mulher ficou mais calma e me deixou ir embora sem alvoroço.

Quando minha mãe soube disso, ficou preocupada com minha saúde mental. O Bernardo estava na praça com a gente e acabou contando para ela. Tentei me justificar, mas ela nem quis ouvir. Voltei ao Rio e para ela não me encher mais, prometi arrumar um psicólogo. Arrumei. Mas o cara parecia estar em outro planeta enquanto eu falava tudo o que me afligia. Resultado: Abandonei depois da quinta sessão.

A segunda vez foi na virada do ano. De novo eu estava em Nevile. É que nada me convence que eles foram para a Europa definitivamente. Sempre penso que eles voltaram depois de algum tempo ou que voltam periodicamente. Já procurei a filial da empresa que eles tinham em Neville, mas não existe faz anos. Na verdade, não existe nenhuma sede ou filial no nome do Daniel. Também já tentei procurar algo no nome da mãe dele, mas não achei nada.

O fato é que mais uma vez eu vi uma criança com as características dela e me aproximei. Eu tinha que vê-la de perto para ter certeza de que não era ou que era, sei lá. A menina chorou muito quando a peguei no colo. Ela deveria ter uns dois anos e meio, idade da Brenda na época. Quase fui parar na delegacia aquela noite. Se a Flavinha não estivesse comigo e não me tirasse de cena, eu teria passado o réveillon na cadeia. Não adiantou nada eu tentar explicar para todos que eu não queria sequestrar a criança. Eu só queria de novo ter certeza de que ela não tinha uma cicatriz bem no meio do tórax. Depois desse segundo episódio, eles nunca mais me deixaram sequer um minuto sozinha quando eu estava em Nevile. Morriam de medo que eu entrasse em roubada. Bernardo chegou a morar no Rio comigo durante alguns meses. E o Marcelo também fazia malabarismos para passar algum tempo comigo. Então eu me controlava para não apavorá-los. Mas continuava buscando por ela em cada criança que via na rua e que de algum modo, me fizesse lembrar dela.

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