33. Assuntos Familiares

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O sonho começa como sempre. Castiel sabe que esta não é a vida dele, que não são seus olhos que ele está vendo, mas isso não parece importar. Aquela solidão fria e morta ainda o corrói. Ele está sozinho há tanto tempo. Ao seu redor estão os rostos vazios de pessoas que ele conheceu, e ela está morta, e nada realmente importa mais.

Ele está naquele carro velho de novo, aquele que cheira a poeira, podridão e fumaça de fábrica, dirigindo por esse longo trecho de estrada. Não há ninguém aqui com ele. Todo mundo que ele conhece, todo mundo que ele já conheceu, está atrás dele, desaparecendo lentamente no retrovisor.

Ele sente frio. O frio começa nas pontas dos dedos dos pés e das mãos, como queimaduras de frio. Ela se espalha por suas veias e tendões e preenche todo o seu corpo lentamente, como um navio afundando. Quando finalmente enche seu coração, Castiel mal sente mais o frio, ele está tão entorpecido. E talvez isso seja bom, esse entorpecimento. Talvez isso signifique que ele não precisará mais sentir aquela solidão horrível.

Quando ele acorda do sonho no meio da noite, Castiel não grita, nem se sacode. Ele apenas... abre os olhos. O frio não desaparece por um tempo, e ele fica lá congelado em sua cama apenas olhando para o teto. Se ele tivesse a presença de espírito para ter medo, ele teria, mas por enquanto, tudo o que ele sente é nada.

***

Apesar de a Cidade Fantasma estar em uma clareira, sempre parece mais frio aqui do que no resto da floresta. Há algo na maneira como as vinhas mortas se enrolam nas bordas enferrujadas dos velhos vagões, na maneira como o vento nunca atinge todos os cantos e recantos, na maneira como a tinta descasca do metal em pequenas lascas sujas, que dá a Castiel aquele sensação de frio na nuca como se estivesse prestes a ser assassinado.

Claro, pode ter algo a ver com o fato de que uma das experiências mais terríveis de sua vida aconteceu aqui, mas principalmente é apenas um sentimento.

Castiel não sabe o que está fazendo aqui.

Já se passaram alguns dias desde que Cas soube o que aconteceu entre Dean e Alastair, e ele não conseguiu parar de pensar nisso.

Ele está puto. Ele tem todo o direito de estar com raiva, mas esse nível de raiva o perturba um pouco, porque ele nunca foi uma pessoa particularmente emotiva em nenhum nível. Ele sente as coisas, geralmente, com um senso de clareza opaco que lhe dá tempo para processar suas emoções e guardá-las onde não possam ser encontradas. Mas ele está tão bravo com o que Alastair fez. Não apenas sobre agredir Dean — embora seja a maior parte — mas também sobre a persistência implacável de Alastair. Como se ele tivesse o direito de mexer com Dean e Castiel do jeito que ele fez, depois de tudo que ele já fez para foder suas vidas.

O fato de Alastair claramente não ter remorso ou mesmo compreensão do dano que causou diz a Castiel que Alastair é completamente mentalmente instável ou simplesmente não é humano.

Dean e Cas tiveram apenas mais uma breve conversa sobre o que aconteceu com Alastair. Embora Dean não tenha falado muito, Castiel descobriu que o ataque ocorreu na Cidade Fantasma, e que o chão daquele vagão esquecido por Deus ainda está manchado com o sangue de Dean. Ele também descobriu que Alastair tentou atacar Dean novamente naquela noite na festa mais recente de Bella Talbot em Johnson. Faz sentido agora porque Dean estava tão chateado quando eles partiram naquela noite.

Após a breve conversa sobre isso, Dean se fechou mais uma vez, e eles não falaram sobre isso desde então.

E agora Castiel está aqui. Cidade fantasma. Ele nem pretendia vir aqui. Seus pés decidiram carregá-lo nesta direção hoje depois da escola, em vez de em direção a sua casa, onde ele deveria estar em uma tarde de quarta-feira, esperando Dean terminar sua sessão com Cara e saindo com Anna, Jesse e Missouri. Não aqui. Não nesta clareira abandonada cheia de vagões de trem esquecidos.

hautley's bend || DESTIELOnde histórias criam vida. Descubra agora