Cap 23

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Na terça-feira, fui trabalhar usando calça e uma blusa de seda de mangas compridas, sentindo a necessidade de estabelecer uma barreira entre mim e o restante do mundo. Na cozinha, Sarah pegou meu rosto entre as mãos e me beijou com um carinho apaixonante. Seu olhar permanecia perturbado.

— Almoço hoje? — Sugeri, sentindo que ainda precisávamos restabelecer a

intimidade e a confiança entre nós.

— Tenho um almoço de negócios. — Ela passou os dedos por meus cabelos soltos. — Você quer ir? José pode levar você de volta a tempo.

— Eu adoraria. — Lembrei-me da agenda de eventos noturnos, reuniões e consultas que ela havia mandado para meu celular. — E amanhã à noite temos um jantar beneficente no Waldorf

—Astoria?

Sua expressão se amenizou. Vestida para trabalhar, ela parecia um tanto deprimida, apesar de absolutamente controlada. Mas eu sabia muito bem como ela se sentia.

— Você não vai desistir mesmo de mim, não é? — Ela perguntou com a voz baixa.

Levantei a mão direita e mostrei meu anel. — Você está amarrada a mim, Andrade. Pode ir se acostumando.

No caminho do trabalho, ela me sentou no seu colo, assim como na hora do almoço, enquanto nos deslocávamos até o Jean Georges. Não falei mais de dez palavras durante a refeição, que Sarah escolheu para mim e estava maravilhosa. Fiquei sentada em silêncio a seu lado, com a mão esquerda sobre sua perna firme sob a toalha da mesa, uma afirmação não verbal de meu comprometimento com ela. Conosco. Uma de suas mãos segurava a minha, quente e forte, enquanto ela conversava sobre um novo empreendimento em Saint Croix. Mantivemos esse contato durante todo o tempo, preferindo comer com uma mão só a ter de abrir mão daquele toque.

A cada hora que se passava, eu sentia o terror da noite anterior ficar mais distante de nós. Seria apenas uma cicatriz a mais em sua coleção, outra lembrança amarga que ela sempre teria, uma recordação e um medo que também seriam meus, mas que não mudariam nada entre nós. Nós não íamos permitir que isso acontecesse.

José estava a postos para me levar para casa quando o expediente terminou. Sarah ficaria no trabalho até mais tarde, e iria direto do Crossfire para o consultório do dr. Petersen.

Aproveitei o trajeto para me preparar mentalmente para mais uma semana de treinamento com Bill. Até pensei em faltar, mas no fim cheguei à conclusão de que era importante manter uma rotina. Já havia descontrole demais na minha vida naquele momento. Cumprir meus compromissos era uma das poucas coisas que ainda dependiam somente de mim.

Depois de uma hora e meia de golpes de mão aberta e trabalho de solo com Bill, eu me senti aliviada quando Caio me deixou em casa, e orgulhosa de mim mesma por ter ido treinar apesar de ser a última coisa que eu queria naquele dia.

Quando entrei no saguão, dei de cara com Mateus na recepção. — Oi. — Eu cumprimentei. — Está subindo?

Ele se virou para mim, com seus olhos brilhantes e seu sorriso aberto. Mateus tinha uma suavidade nos modos, uma espécie de ingenuidade sincera, que o tornava diferente de todas as pessoas com quem Camilla já havia se relacionado. Ou talvez eu devesse dizer apenas que Mateus era, normal, algo raro tanto na minha vida como na de Camilla.

— Camilla não está. — Ele disse. — Ninguém atendeu ao interfone. — Você pode subir comigo e esperar lá. Não vou sair mais hoje.

— Se você não se incomodar. — Ele foi junto comigo quando acenei para a menina da recepção e tomei o caminho do elevador. — Eu trouxe uma coisinha pra ela.

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