Hak.
Não consigo dormir. Estou calmo, mas sinto o sangue das veias bater no meu ouvido. A Karen continua desacordada e eu não sei o porquê. Não posso seguir na missão sem saber o que houve com ela. E não posso pedir ajuda a ninguém.
Observo ela dos pés à cabeça, ela emagreceu, estar longe de casa, fazendo longas caminhadas todos os dias, sono desregulado, comendo nada mais do que algumas frutas. Quando a carreguei pude sentir um pouco dos seus ossos do quadril. Eu nunca tinha pegado ela no colo, mas suponho que também esteja mais leve.
Seus cabelos também mostram diferenças, não tão macios quanto antes, também ganhou muito mais volume, e sem ser penteado há dias, parece mais um ninho de passarinho.
Sua pele e unhas também sofreram aqui. Está ressecada e com as unhas quebradas. Mas não vi ela reclamar de nada disso. Ela nunca ficou tanto tempo longe da família, mas também nunca vi ela chorar. Sempre a julguei e sempre julgarei, como uma garota mimada e fraca, uma destrambelhada que cai à toa. Mas na verdade, até que ela é bem forte.
Mas o fato de ela não acordar me frustra. Respiro e inspiro fundo. Olho pra fora e vejo que alguns raios de sol estão se aproximando. Passei a noite inteira acordado, esperando ela acordar. Olho novamente pra ela e vejo um pequeno tremor nos seus olhos. Me aproximo dela, e vejo seus lábios abrirem. Seus olhos abrem lentamente até que parecem ficar em mim.
— Acordou bela adormecida?
Ela tenta falar, mas está rouca, ela limpa a garganta e olha ao redor. Parece estar confusa.
— Você saiu da casa e depois desmaiou...
— Ah...
— O que aconteceu?
Ela faz uma careta de dor e põe a mão na cabeça.
— Preciso... De água... — ela sussurra e parece precisar de um certo esforço pra isso.
Pego o cantil de água e ajudo ela a levantar a cabeça, ela geme de dor e respira fundo, com muito esforço ela levanta um pouco a cabeça, alcanço meu saco de dormir e ponho debaixo da cabeça dela. Encosto o cantil na boca dela e inclino para que ela possa beber. Ela toma alguns goles de água e então afasto o cantil.
— Obrigada... — ela fecha os olhos.
— Não durma de novo!
— Tudo bem... Preciso de um banho frio...
— Você quer ir até o rio?
— Sim...
— Não consegue levantar, né?
— Acho que sim...
Ela levanta um pouco a cabeça, mas volta a tombar no travesseiro improvisado. Ela geme de dor outra vez. Coloco um braço debaixo do pescoço dela e outro braço embaixo dos seus joelhos, levanto ela cuidadosamente.
— Ah... Isso dói pra caramba...
— Aguenta firme, vou levar você até lá.
Enquanto saio da caverna ela esconde o rosto no meu peito. Sinto sua respiração em minha pele. Ela deve estar bem mal...
— Não durma.
— Tô me escondendo do sol.
— Tá bom, mas não durma de novo.
Carrego ela até o rio, sempre conferindo se ela está dormindo. Ao chegar no rio, ela vira o rosto pra água.
— Me ajuda. — ela diz e abaixa o zíper do macacão.
— O quê? — minha voz soa mais alto.
— Ai!
— Desculpe... Mas, te ajudar a tirar a roupa?!
— Não posso entrar na água vestida...
Ela desce o zíper e então vejo seu sutiã de cor bege. Embora seja um tom claro, parece muito escuro comparado a sua pele branca. Com esforço ela tira as mangas do macacão.
— Me ajuda com a parte de baixo.
— Ah... Não sei se...
— Hak, se eu abaixar a cabeça vou servir mais dor, não é nada demais, estou de calcinha... aposto que você já viu muitas mulheres muito mais nuas que isso.
— É mas...
— O quê? — ela faz outra careta de dor e parece querer segurar a cabeça.
— Aaah... Vamos lá, se apoia em mim... Isso vai ser muito estranho...
— Eu sei... Mas preciso de um banho...
Me abaixo e ela põe as mãos nos meus ombros, tento não pensar na posição que estamos. Seguro o macacão e desço ele pelas suas pernas. Sua calcinha também é bege, mas tenho não olhar para ela. Tento não respirar. Tento não pensar. Um movimento errado e eu estaria fazendo besteira. Ela levanta uma perna para que eu possa tirar o sapato. Sinto o sangue martelar no meu ouvido. Retiro o sapato e a calça de ambas as pernas. Levanto rapidamente e ajudo ela a ir até o rio. Ela mergulha e fica alguns segundos sob a água. Aproveito para respirar novamente.
Ela emerge da água de olhos fechados, ver ela fazer isso faz minha imaginação pipocar. Suprimo todos pensamentos.
— O que aconteceu? — repito a pergunta que tinha feito antes, primeiro porque estou curioso, e segundo, porque quero distrair minha cabeça... Minhas duas cabeças...
— A voz do cara saiu engraçada e eu ri. Eles vieram para o quarto em que eu estava e então eu tive que agir.
— E o que você fez, exatamente?
— Falei com eles telepaticamente.
— Ok... Estou ouvindo...
— Eu disse que quem riu dele foram os dois caras. Não sei se ele acreditou, mas o choque da ligação psíquica apagou eles. Eles devem acordar com uma dor de cabeça horrível.
— Foi um bom plano...
— É... Mas estar conectado com os três assim me deu uma dor de cabeça horrível.
— Mas tu conversa com a Luise e Maggie telepaticamente e nunca desmaiou.
— É porque meus poderes estão limitados, lembra?
— Hmm... É verdade. Tá melhor?
— Sim, a água ajuda.
Ela mergulha mais uma vez e desvio o olhar.
— Quer entrar na água também?
— Com você?
— O que é que tem?
— Não sei...
— Você não gosta de banho... Eu entendi. — ela ri baixinho.
— Não acho que é uma boa ideia, Karen.
— Tô te chamando pra entrar na água, pra espairecer, relaxar, porque você tá com uma cara horrível, tá parecendo um defunto... — a gente ri e ela volta a falar — Eu sei que você não tá legal e nadar pode ajudar. — ela fica com uma expressão séria — Não tô tentando te seduzir.
— Não que você fosse conseguir.
— Não que eu queira tentar.
Solto uma gargalhada. Eu realmente me sento cansado, mas não quero arriscar entrar na água com a Karen agora, se eu me aventurar muito, nem a água fria me ajuda.
— Vou sair um pouco... Pra achar algo pra gente comer, se precisar de algo é só gritar.
— Contanto que não seja outro lagarto, eu agradeço.
Dou um meio sorriso e fujo dali. Vou na direção de árvores que tinha frutas grandes. Sinto uma excitação ao lembrar de que eu estava de joelhos na frente da Karen, eu merecia um troféu por isso.Colho algumas frutas e então sento no galho pra relaxar. Acho que... Na verdade tenho certeza, que eu nunca senti tanta atração pela Karen. Sempre vi ela como a filha chata do Josh, trocamos insultos desde que nós nos conhecemos. Sempre achei ela uma pessoa muito irritante e patricinha, que parece gostar de se meter em encrencas. A filha rebelde. Apesar de ser líder de torcida e usar aquela saia curta, nunca senti desejo. Boa parte dos caras do lugar onde estudo queriam pegar ela, o Kieran já tinha pegado. Mas eu, nunca quis.
Mas por algum motivo, talvez o fato de estar preso com ela no meio do nada, de ver ela nua durante o banho, e de tanto convívio, e ainda digo mais, o fato de o sol ter queimado alguns dos meus neurônios. Eu senti uma atração.
Como faço pra me livrar disso? É com a Karen!!!Karen.
Acho que nunca senti uma dor de cabeça tão forte. Quer dizer, até já senti, quando caí do prédio e me esburrachei no chão. Mas essa dor é bem diferente. Fico grata pelo Hak ter me trazido até aqui. Jurava que ele me deixaria lá e pularia fora.
Me sinto melhor em estar na água. A dor aos poucos vai se dissipando. Hak disse que ia colher frutas mas acho que aproveitou pra dormir, não culpo ele, deve estar com sono. Estava brincando, mas estava sendo sincera quando disse que ele estava parecendo um defunto. Eu mesma me sinto cansada, não importa o quanto eu durma. Saio da água e sento na pedra, está um pouco quente mas eu preciso me secar. E nada melhor do que o vento.
Sinto um pouco de fome e lembro do pão. Sei que quando acordei vi que estava na caverna. Eu tinha conseguido trazer. Outra ideia me vem a mente, e se o Hak foi lá pra comer o pão sem mim? Acho que esse é o tipo de coisa que eu faria.
Não sei quanto tempo se passa, mas sinto que estou sequinha. Visto o uniforme já me sentindo restaurada. Eu não estou cem por cento, mas estou muito melhor. Hak retorna com algumas frutas nas mãos.
— Viu que eu trouxe pão?
— Você roubou comida, Karen.
— Admite que tá feliz com meu crime.
— Não. Quer uma?
Afirmo com a cabeça e ele me entrega algumas. Como e me sinto parcialmente satisfeita.
— Preciso dormir...
— Achei que você estivesse dormindo.
— Eu fui pegar frutas.
Levanto e começamos a andar em direção a caverna.
— Mas então? Descobriu algo importante com o cara?
— Sim, ele tem um telefone! Ele fez uma ligação pra um tal de Erik. E parece que em poucos dias ele vai ver esse Erik, então temos que voltar pra lá depois, pra acompanhar ele.
— Espero que não seja tão longe...
— E o que tu achou na casa, além de comida?
— Parece uma casa comum, sala, cozinha, quarto e banheiro. Tem muitos livros e caixas. E muita comida na cozinha, ele não vai sentir falta de um pãozinho...
Chegamos na caverna. Entramos e arrumamos os sacos de dormir.
— Você roubou um pacote de pão, Karen!
— Ele não vai sentir falta.
— Você não tem limites.
— Não! — digo sorrindo — Vamos dormir então...
— É.
Nós nos viramos e mantenho os olhos abertos.Enquanto o sono toma conta de mim, reflito sobre estes últimos acontecimentos. Parece que finalmente estávamos dando um passo a frente. E até que não me saí tão mal.
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O doce sabor dos insultos
RomanceKaren e Hack nunca se deram muito bem. Um cara retardado que sempre surge do nada, pensa ela. Uma garota chata que cai do nada, pensa ele. Mas, uma importante missão do chefe da agência, envia ambos para longe do conforto, e colocando-os para trabal...