Michele

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A semana foi passando e o pessoal aqui do trabalho e do corredor não paravam de falar sobre "o velho rico que sustenta a Michele".

As meninas ficaram zoando, jogando elogios dele pra mim, mas não fiquei estressada nem nada, entrei na onda e concordava; o Edgar é só meu mesmo kkkkk Por mais que às vezes ele vacile legal comigo. Inclusive o dia no bar só confirmou isso. Enfim...

Hoje eu estou muito aquele meme "a putinha está terrivelmente cansada" o que não é do meu feitio e o povo está percebendo isso, eles vem me perguntar o que está acontecendo e eu respondo que 'nada', pois nem eu mesma sei o que está acontecendo. Talvez eu apenas precise fumar um balão ou de uma folga; ou talvez fumar na folga enquanto arrasto o cu na pista de dança kkkkk Mas se eu continuar com essa energia, vai ser foda.

Deu meu intervalo e eu nem com fome estava, só quero fumar para relaxar. Chamei o Rasta pra ir comigo e ele aceitou, óbvio kkkkkk Subimos e eu acendi enquanto o Rasta estava sentado comendo sua marmita, que só de olhar me deu um embrulho.

Rasta: Qual foi da tua hoje? – perguntou me encarando debaixo e eu continuei olhando para o horizonte, sem ter o que dizer –
Michele: Cansaço por causa da rotina – minto –
Rasta: Deixa de caô, tu é ligada nos duzentos e vinte, pô – sorri de lado e dei um trago.

O silêncio reinou e o meu celular começou a vibrar no meu bolso. Peguei na esperança de ser o Edgar para me tirar dessa vibe deprê e é um numero desconhecido. Fiquei encarando e relutei antes de atender porque se for cobrança vai baixar mais ainda o meu humor kkkkkk af Levei o aparelho até o meu ouvido.

Advogado: Boa Tarde! Falo com a Michele Tavares? –
Michele: A própria. Com quem falo? – pergunto jogando a ponta no chão e pisando –
Cláudio: Tudo bem, Michele? Aqui é o Cláudio Montenegro, advogado da família Galvani. Poderíamos nos encontrar para conversar?
Michele: Desculpa?! – arqueio as minhas sobrancelhas – Família Galvani? Quem são esses e o que você quer comigo? –
Cláudio: É a sua família biológica. – fico imóvel, continuo olhando para o horizonte e meu cérebro para – nós temos algumas questões a resolver.
Michele: Eu... Eu... – gaguejei – Eu posso te ligar em outro momento?
Cláudio: Claro! Me ligue no momento em que você quiser nesse mesmo número. Boa tarde! – não o respondo e desligo o celular, abaixando minha mão lentamente –
Rasta: Qual foi? – ele me encara com uma feição estranha – tá tudo bem? Você está com uma cara estranha... Michele! – falou um pouco mais alto e eu voltei a mim –
Michele: Tudo certo! – assenti – Vou descer, vai continuar ai? –

Negou e desceu comigo.

No caminho até a loja não consegui parar de pensar sobre. Como assim "sua família biológica"? Peguei meu celular e escrevi uma mensagem para a minha mãe "Precisamos conversar quando eu chegar em casa" mas eu apaguei, pois acho que esse assunto não seja algo para ser discutido pelo celular, vou ter que esperar chegar em casa para confronta–la.

Lola: Mi, tá tudo bem? – escuto alguém falar, mas não dou a mínima e passo direto.

Que merda de dia é esse?

O dia foi passando e eu mais aérea que nunca. Não consigo parar de pensar sobre e parece que a hora não passa. A todo minuto estava checando o horário e mentindo para o pessoal sobre o real motivo de eu estar assim, então logo surgiram especulações do tipo: ela levou um pé na bunda do coroa. E eu estou pouco me fodendo para isso, acho que se o Edgar tivesse acabado, com seja lá o que estamos tendo agora, seria menos... não sei, parece que eu perdi meu chão com essa notícia.

A hora finalmente passou e no final perguntaram se eu queria sair para um barzinho beber com eles, mas não tem condições nesse momento. Então eu apenas recusei e saí varada. Chegando à parte externa do shopping eu pedi um moto uber, pois não tem cabimento eu encarar ônibus uma hora dessas. Entro no meu prédio sem falar com o porteiro e assim que chego no meu andar, abro  porta rapidamente.

Michele: Mãe! – grito andando pelo apê. Ela não está –

Sento no sofá e pego o meu celular. Penso novamente em mandar mensagem para ela mas me contive, de novo. Continuo sentada a sua espera enquanto fico cutucando a minha unha e batendo minha perna. Pensei em ir tomar banho ou comer, já que não comi nada o dia inteiro, mas não tenho força e nem vontade para comer nada agora. Levanto do sofá e começo a andar de um lado para o outro, nunca que tive uma ansiedade fodida igual esse. Escuto a porta destrancar e encaro a porta abrindo com a minha mãe entrando logo em seguida.

Michele: Como assim eu sou adotada? – pergunto e ela arregala os olhos –
Lena: O quê? – começou a se aproximar de mim – Quem te contou isso?
Michele: O advogado da minha "família biológica" – digo fazendo aspas –
Lena: Eu sou a sua mãe! – agarrou meus braços e encarou meus olhos – Eu sou a sua família. Ninguém vai dizer o contrário e ninguém vai te tirar de mim – me abraçou e eu retribui –
Michele: Mesmo assim, eu quero saber a verdade.
Lena: Eu nunca imaginei que esse dia fosse chegar – foi se agachando para sentar no sofá e eu sentei junto. Suas mãos estavam tremendo e o corpo inteiro estava na mesma frequência – Mais nova, eu tentava de todas as formas ter um bebê e eu não conseguia. Eu cheguei a ter um, mas o perdi – lágrimas caíram de seus olhos e eu limpei – Eu tive uma fase depressiva e o seu pai era muito forte por nós dois – assenti – Então, chegou um momento em que eu retornei a igreja, fui buscar a Deus para que ele pudesse me abençoar e o pastor que sabia da minha história me ofereceu um bebê. O meu milagre. Eu não pensei duas vezes e aceitei – mais lágrimas caíram de seus olhos, eu continuava engolindo seco – Você era tão pequenininha. Tinha meses de nascida ainda. Eu cuidei de você, ok? Você é minha. – me abraçou novamente e uma lágrima caiu –
Michele: Por que você nunca me contou? – neguei com a cabeça por causa da pergunta idiota – O que será que essa família está querendo comigo? –
Lena: Eu não sei. – negou – Já se passaram tantos anos. Eu pensei que esse dia nunca chegaria! – repetiu – Eu não vou te proibir de ter contato com eles. Você já é grandinha, faz o que quiser com a sua vida – sua voz estava trêmula – só não esquece de mim. Não esquece que eu sou a sua mãe –
Michele: Jamais! – agora eu que abraço ela.

Ficamos mais um tempo tendo essa conversa e eu finalmente tomei coragem para tomar banho. Liguei o chuveiro e fiquei imóvel enquanto a água quente escorria pelo meu corpo. O que será que essa família quer comigo? Será que eu tenho irmãos? Por que eles estão me procurando só agora? Eu tenho que marcar esse encontro com o advogado para ontem e tirar essa história a limpo.

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