Natal! A melhor época do ano. No meu caso é a pior. Como as pessoas podem falar que o Natal é bom, se reúne toda a família?
Faz tempo que eu não sei o que é reunião de família. Depois que os meus me mandaram estudar em um internato, eu nunca mais voltei a vê-los todos juntos. Eles me deram a liberdade de escolher para onde eu iria nas férias e nunca que eu escolhi voltar para casa. Mas parece que dessa vez eu estou sendo obrigado a voltar e nem imagino o porquê. Para ser sincero eu não estou querendo voltar para casa, mas se eu não voltar, é capaz de os meus pais bloquearem os meus cartões. Então, eu já estava na sala de espera do aeroporto esperando o horário do meu voo. E como eu sou esperto, programei a minha chegada para as dez horas. Duas horas antes do Natal, para evitar o estresse. Não pense que só porque minha família é rica, que eu não tenho tios chatos, primos insuportáveis... A única pessoa que salva é a minha vó, sempre me deixa em paz, nunca diz que eu estou errado e sabe ser carinhosa na medida certa. Eu meio que estava um pouco empolgado para vê-la, mas ao mesmo tempo eu queria comprar uma passagem para outro lugar e fugir de tudo isso.
Desbloqueio o meu celular e começo a ver as fotos do Natal anterior, que eu passei em Singapura com os meus amigos. Isso que é bom, ir para um lugar desconhecido com os amigos. Se bem que eu nem sei se "conheço" mais a minha família. Posto uma das fotos no Instagram.@im_otto This WAS Christmas 🌲
...Começam a chamar; está na hora do meu voo. Guardo o celular e levanto como todos que ali estavam. Dirijo-me a cabine. Estava chegando cada vez mais perto dos meus estresses.
A viagem foi tranquila. Havia apenas uma coisa me incomodando, a criança que sentou ao meu lado que não parava de falar, chorar e de pedir as coisas para a mãe. A minha vontade era de trancar ela no banheiro. Nem com o meu fone de ouvido no máximo conseguia abafar a voz daquela criança.
Parado na saída do aeroporto, espero pelo meu pai que se propôs a vir me buscar mesmo sem que eu pedisse. Me pergunto que horas ele vai chegar. Pois já estou parado faz meia hora e nada dele chegar e nem mesmo atender ao telefone. Ninguém atendia. A festa deve estar boa e esqueceram completamente de mim.
Como odeio esperar, pego um taxi que estava ali na frente. Ele coloca a minha mala no porta malas e eu entro no carro.
– Leblon? – ele pergunta novamente.
– Yes! – respondo em inglês no automático.
– Ok! – ele começa a dirigir - fique a vontade. Se quiser tem bala, água, se estiver com calor...
– Só quero que você pare de falar.
Me encarou pelo espelho retrovisor interno e logo manteve seu olhar na roda. O resto da viagem foi um silêncio. Como no avião não foi nada silencioso, eu só queria um pouco de silêncio antes de chegar em casa. Do nada o motorista começou a acelerar. Agora eu não sei se é por que ele queria que eu saísse o mais rápido possível do seu carro ou por que a rua estava vazia. Olho para o celular e já estava cheio de mensagem no grupo da família e dos amigos, os dois perguntando onde eu estava. Agora que a minha família lembrou que eu existo? Bloqueio e não respondo nenhum dos dois.
O motorista estaciona e eu nem havia percebido que havíamos chego. Saio do carro e ele não sai para ajudar com as malas. Depois de ter tirado as duas, fecho o porta malas e ele põe o pé no acelerador. Balanço a cabeça negando e olho para cima. Duas pessoas estavam na varanda, mas eu não consegui identificar quem. Vou andando até a portaria com as duas malas e o porteiro faz o serviço dele.
– O senhor precisa de ajuda?
– Não! – passo direto.
Aperto o botão do elevador e sou obrigado a esperar ele chegar. Quando isso finalmente acontece a porta se abre e o meu pai estava lá dentro.
– Agora? – nego com a cabeça.
– Perdi o horário.
– Como sempre!
Fiquei parado encarando-o e indignado. A porta do elevador começa a fechar. Meu pai coloca a mão interferindo o seu fechamento, eu entro e fico parado ao seu lado. Eu não sei dizer o que eu estou sentindo no momento. É difícil ver meu pai de novo depois de muito tempo, digo, pessoalmente.
Ele me encara com o olhar de quem estava lendo a minha mente e eu só queria esconder que eu ainda não escolhi a faculdade que eu quero fazer.
– A casa está cheia - ele diz tentando puxar assunto – sua vó não para de perguntar sobre você.
– Hmm!
- Após esses anos todos, eu espero que você tenha mudado – disse em um tom ríspido – comporte-se! – agora soou ameaçador.
- Como você quiser!
A porta do elevador abre em nosso apartamento e eu sou o primeiro a sair. A primeira pessoa que eu mantive contato visual foi a minha mãe. Ela estava conversando com uma de minhas tias e assim que me viu, gritou. Quase deixou a taça de vinho cair e veio correndo em minha direção. Dou um passo para trás e o meu pai passa na minha frente com as malas, impossibilitando a passagem dela. Depois de ele ter passado, não há para onde correr. Ela me abraça e eu apenas a afasto.
– Eu sei que você não gosta de abraços, mas eu não consegui resistir – ela passa a mão no meu cabelo – como você está? Como foi a viagem? Vamos, todos estão esperando você!
– Mãe! – eu reclamo.
– O quê? – ela me olha com uma cara de quem não estava entendendo.
– Calma!
– Ok! – ela respirou fundo - agora venha.
Deixei a mala ali na entrada e fui acompanhando ela até a sala de jantar. Havia apenas algumas crianças na sala quando passamos por lá e eu não lembro de nenhuma delas. Quando chegamos na cozinha, estavam todos em seus respectivos lugares, todos me encararam e abriram um sorriso.
– Vai pelo menos apertar a mão de cada um. – meu pai diz sussurrando no meu ouvido.
Se eu já estivesse aqui eu não falaria com ninguém, eles que deveriam falar comigo. Mas como esse não é o caso, passei por cada um apertando a mão. Quando chego na minha Vó, ela abriu um sorriso e pediu um abraço. Eu não podia negar um abraço na vovó. Abaixei e abracei-a.
– Como você está? – ela pergunta.
– Estou bem! – menti – E a senhora?
– Melhor agora. Estava morrendo de saudades! – ela diz segurando a minha mão.
– O que vocês estão fazendo aqui, se só pode comer depois de meia noite? – pergunto.
– Liberei só alguns aperitivos. – diz minha mãe dando um gole em sua taça – Eles conseguem sobreviver com isso até meia noite.
Olhei para mesa e havia queijo, presunto, alguns salgadinhos, entre outras coisas. Desde quando minha é pobre para servir isso? Não via a hora de chegar meia noite para comer comida de verdade. Me solto de minha vó e vou andando até a minha mãe.
– Vou tomar banho, daqui a pouco eu volto.
– Ok! – ela parecia estar feliz – a Zara está ansiosa para te ver.
– Ela veio? – perguntou meio surpreso.
– Ela está aqui desde o começo de dezembro. Ela e o namorado dela – a encarei de lado.
Namorado? Desde quando a Zara namora? Enfim, não tenho nada a ver com isso.
– Depois eu procuro por ela – digo me afastando.
Volto para a entrada e pego a mala que o meu pai não levou ao meu quarto. Subo a escada, ando pelo corredor e passo pela porta do quarto da Zara. Fiquei tentado a abrir, mas isso pode esperar. Abro a porta do meu quarto e estavam todos lá. Zara, o possível namorado, Félix e Selena. O namorado estava sentado em uma poltrona enquanto o resto estava deitado em minha cama.
– Já era hora! – diz Zara levantando de minha cama e se aproximando de mim – você não vai abraçar sua irmãzinha? – pergunta estendendo os braços para eu abraçá-la.
– Não sabia que você viria.
– Se soubesse, teria vindo antes, certo? – ainda estava com os braços abertos.
– Nem teria vindo – ela ri.
Coloco as malas em um canto e abaixo os braços dela, fazendo a rir novamente. Encaro os três que sobraram, um que estava na poltrona e dois que estavam deitados em minha cama.
– O que vocês dois estão fazendo aqui? – pergunto.
– Estávamos esperando por você enquanto matávamos a saudade – Selena responde e logo solta o famoso sorriso sarcástico dela.
– Ok! – assenti – eu estou aqui agora, saiam! – digo para os dois que logo levantam da cama – You too! – encaro o namorado da minha irmã.
Ele levanta e os três passam por mim, Félix e Selena resmungando por eu ser um extremo idiota. Sobrou apenas a Zara no quarto e ela estava na minha frente, me encarando.
– Otto, Otto, Otto... – respira fundo – se você quiser que essas férias sejam um inferno, é só me avisar – eu ri.
– Baby, eu já caí do cavalo faz muito tempo – sorri de lado – estou doido pra te ver caindo também.
– É esse irmão que eu amo! – abriu um largo sorriso e bateu duas vezes em meu peito – Te amo! – disse saindo do quarto e eu fechei a porta.
Eu e Zara sempre tivemos uma relação difícil de ódio e ódio. Sempre um tentando ser melhor do que o outro, sendo que ela sempre precisou mais da atenção dos nossos pais do que eu, pois eu sempre fui melhor sozinho. Bom, já da pra ver quem hoje se deu melhor e quem se fodeu. Enquanto eu tinha que ir obrigado a um internato fora do país, a Zara pode escolher para onde iria e continuou com uma relação boa com os nossos pais.
Jogo a minha mala no chão e abro para pegar a roupa que comprei para usar hoje. Abro meu armário, pego uma toalha e vou para o banheiro. Haviam vários produtos novos aqui e eu nem precisei pegar os meus na mala. Tiro a roupa, entro no box e tomo banho. Depois saio do box, coloco a roupa, escovo os dentes, penteio o cabelo, mas depois acabo bagunçando ele. Volto para o quarto e abro a minha outra mala para pegar os presentes que eu comprei apenas para a minha mãe, minha vó e para o meu pai. Não sabia que a Zara estava aqui.
Desço e coloco eles na árvore. Félix e Selena agora estavam sentados no sofá. Quando eu passei eles me encararam com a mesma cara de quando saíram do quarto. Após eu colocar os presentes dou uma volta e subo novamente. Vou para a varanda e apoio os meus braços no vidro olhando para o mar.
– Começamos do jeito errado – diz Félix – vamos recomeçar?! – sorriu – Como você está?
– Como você está? – perguntei antes de responder.
– Pra ser sincero, entediado – assenti.
– O mesmo!
– Tentando puxar assunto com esse arrogante? – Selena pergunta se aproximando.
– Fuck you! – digo.
– Não falei, arrogante! – eles riem.
– Vocês podem me dar licença? Estou querendo ficar sozinho.
– Claro! – disse Selena – Mas só depois de responder uma coisa.
– Como é ser rejeitado pelos pais? – Félix pergunta.
– Jura? Quantos anos vocês tem?
– Acho que treze! – diz Zara aparecendo sozinha – Seleninha, você já foi melhor!
Selena revirou os olhos e continuou me encarando.
Zara e Selena também vivem se estranhando, por mais que não se desgrudem. Elas se amam, mas também sempre houve a competição. Quem é mais bonita? O namorado de quem é mais bonito? Quem tira as melhores notas? O cabelo de quem é mais macio e bonito? E por ai vai. E na minha opinião, a Zara sempre foi a melhor em tudo. Pois a Selena é apenas uma sombra dela.
– Sério! Você foi mandado para a Europa anos atrás e não havia voltado até hoje – Félix continuou – os seus pais não gostam de você.
– Veja os nossos, nunca fizeram isso conosco – Selena ri.
– Então primo, como você se sente?
Zara ficou parada, me encarando e esperando uma resposta também.
Esse foi um dos motivos de eu não querer vir. Minha família só sabe me estressar e eles sabem fazer isso direitinho. Olho para os três e eles ainda estavam esperando uma resposta. Com certeza eu não iria dar, mas não podia deixar isso passar batido, pelo menos não com ele.
– Quer saber mesmo?
– Sim! – Félix balança a cabeça.
Eu o empurro na piscina e a Selena começa a gritar. Pego ela pelos braços e quando eu ia empurra-la também, os nossos pais chegam e perguntam o que estava acontecendo. Na verdade, a nossa família toda havia subido.– Félix se tacou na piscina e a Selena começou a gritar, pois molhou um pouco os pés da princesa. E o Otto só foi ajudar ela a sair dali – diz Zara com um tom de voz convincente e um plano de fuga rápido.
– Mentira! – diz Selena.
– Isso é verdade, Otto? – meu pai pergunta.
– Sim, senhor! – assenti.
– Ok! – minha tia me encarou meio desconfiada – Félix, entra e vai trocar de roupa, agora! – a mãe dele o obriga.
Logo todos começaram a descer um por um. Ficou sobrando apenas eu e a Zara. Ela sentou em uma cadeira e fez sinal para que eu sentasse ao seu lado. Eu a "obedeci" e ela erguei seus ombros, respirou fundo e fez a carinha meiga só que não tão meiga assim de quem estava ganhando a guerra.
– Na próxima, da um soco na cara dele e puxa o cabelo da Selena – piscou de um olho – eu não suporto esses dois. – Revirou os olhos – E quando você se tornou esse frouxo que não tem a resposta certa na ponta da língua?
– Olha o que eles acabaram de falar. Parecem duas criancinhas de dez anos! – ela assentiu – Você acha que eu vou dar atenção pra eles? I have better things to do!
– Você está certo. – Ela levantou – Porém, não existe nada melhor do que uma vingança.
E ainda pensam que ela é melhor do que eu. Mal posso esperar pra ela se ferrar, assim como eu me ferrei no passado.
No meio do caminho ela perguntou se eu não iria me juntar a eles e eu fui. Chegando na sala, a maioria estava lá enquanto minha mãe falava algo sobre "os bons e velhos tempos", fiquei com sono só de ouvir ela falando o quanto a Zara era uma bebezinha linda. Sentei no sofá ao lado da Zara, que entrou na conversa sobre os bons tempos também. Essa garota é muito falsa.
Peguei meu celular e comecei a responder quem havia me mandado mensagem. Entrei no Instagram e vi que meus amigos tinham ido passar o Natal na Noruega. Enquanto isso, eu estou aqui no Leblon. Bloqueio o celular e encaro quem estava falando, sem nem mesmo prestar atenção na conversa.
A hora passou se arrastando, mas passou. Faltavam três minutos para meia noite, e como tradição todos se juntaram a mesa para a oração da minha Vó. Ela orava o Pai Nosso e Ave Maria, enquanto todos fechavam os olhos e oravam juntos com ela, eu ficava de olhos abertos, junto com a Zara. Eu não sou muito fã desse negócio de oração e agradecimento divino, então, não faço questão. Já a minha irmã, não faço ideia do motivo de ela ficar com os olhos abertos.
Após a oração, todos estavam se abraçando e desejando Feliz Natal. Enquanto eu só apertava a mão deles. Quando todos se cumprimentaram, fomos para a sala, para a troca de presentes.
Peguei os que eu comprei e dei para minha mãe, minha vó e meu pai. Minha mãe arregalou os olhos e disse que não esperava por aquilo, meu pai apertou minha mão e minha vó sorriu e agradeceu.
– Cadê o meu? – Zara perguntou um pouco decepcionada.
– Eu não sabia que você estaria aqui, sorry! – dei de ombros.
– Se você ao menos se informa-se... – bufou – eu te trouxe um presente, seu jackass – disse entregando-o para mim.
– Thank you!
Era um tênis preto da Nike. Agradeci novamente e tirei 50 euros da carteira, dando-o para ela logo em seguida.
– Só pra não dizer que não te dei nada.
– Asshole! – ela riu e me abraçou.
Eu ganhei perfume, tênis, blusas, relógio e óculos. Parece que minha mãe não conseguia decidir o que me daria. Após tantos anos ela deve ter ficado nervosa.
– Eu queria um minuto da atenção de todos! – diz minha mãe – Eu quero agradecer a todos por virem de novo. E esse ano está mais especial, pois após muito tempo eu consegui juntar os meus dois bebês! – eu e Zara nos encaramos com um olhar de vergonha.
Os meus parentes bateram palmas para não deixar ela sem graça.
– Agora, o momento em que todos estavam aguardando. O jantar está na mesa! – disse bem animada.
– Graças a Deus, não aguentava mais comer petiscos – a mãe do Félix bufou.
Fomos todos para a mesa comer. Eles estão contando histórias e rindo, enquanto eu apenas como. Eu sou o único que não estou feliz aqui. Agora eu não sei se é porque eles são chatos ou porque eu vim com a ideia de que isso seria chato.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Novo Clássico
RomanceO novo clássico gira em torno da vida de três jovens adultos. Com suas vidas distintas, acabam descobrindo algo que jamais passaria pela cabeça de cada, fazendo assim com que suas vidas desse uma reviravolta.