Quarto dia: 900 mil coisas que eu odeio em você - Parte II

175 18 58
                                    


Ela já desabafou, então agora é a vez dele, talvez porque estão sozinhos ou porque só querem falar para passar o tempo, ou porque realmente querem saber um do outro ou porque a situação complicada te faz ser o mais transparente possível e te faz perder a noção de consequências de qualquer fala, você só quer falar.

Chrissy subiu os olhos azuis suaves na direção dele, queixo apoiado no joelho, íris brilhosa, pupilas dilatadas - Tudo que quiser me contar...

Eddie ficou calado por um tempo, meio perdido e tentando processar tudo isso, ainda tá preso no desabafo da garota e agora ela quer o ouvir sobre...sobre o que? Sobre a vida dele? Sobre ele? Do jeito que ele ouviu sobre a dela? Se expor como ela? De um jeito em que os dois vão guardar os segredos demoníacos da vida um do outro?

Nervoso e perdido porque ele não sabe como fazer isso, nunca contou da vida dele para ninguém, nunca teve uma conversa desse tipo com ninguém. Ele nem sabe o que falar, nunca desabafou porque sempre foi acostumado a manter tudo dentro dele e extravasar na música.

Se sente um idiota. E ao mesmo tempo...surpreso, por que Chrissy Cunningham tem interesse em saber sobre a vida dele? É uma vida de merda, e sem graça.

E para falar a verdade, só tem uma coisa que ele realmente quer contar para ela. E é essa que o apavora ainda mais. Pensar na reação dela se ele contar, ele não faz ideia de como ela vai reagir, se vai se afastar ou se vai falar que não lembra e que ele tá inventando tudo isso ou se vai lembrar que ele é o garoto grotesco das flores e se afastar e...qual vai ser a reação dele contando isso? Eddie nunca contou isso pra ninguém, nunca botou em voz alta porque ele mesmo nunca conseguiu, porque ele mesmo se obrigou a esquecer, porque ele mesmo escondeu dentro dele. Porque tem medo, porque tem...ele nem sabe dizer o que é, não sabe dar nomes para essas coisas.

Ele não é assim. É um Munson, igual ao tio, os dois são caras crus, grotescos e ignorantes no sentido de não saberem lidar com coisas sentimentais da vida e coisas que batem no peito. São caladões nesse aspecto. A vida acontece e eles só deixam.

Mas quando olhou pra ela...ah, a luz fria da lanterna refletindo no rosto dela, nos olhos azuis, no rabo de cavalo que soltou e agora os cabelos estão escorrendo feito cascatas loiras pela clavícula e os ombros. E ela tá com os olhos nele, de um jeito meio suave, não o encara, mas olha para ele, para as mãos dele, na direção do rosto dele. Tem olhos ansiosos, uma face doce, como se esperasse ele fazer o mesmo, ou para passar o tempo ou porque realmente quer conhecê-lo.

Foda-se, vão morrer ali mesmo, vai tentar. É difícil dizer "não" pra ela, e não quer receber aqueles olhos decepcionados de novo.

Não faz ideia de como fazer isso, é só conversar com alguém, mas é que a vida dele sempre foi um tópico muito delicado e ignorado para Munson falar por aí, tem vergonha do que os outros vão pensar ou se sente meio triste com isso, talvez use uma armadura pra tudo isso, e ela conseguiu a abaixar também.

- É, huh, e-eu - tentou, franziu o cenho e o rosto todo numa expressão de dificuldade, foi a vez da lanterna iluminar os olhos marrons deles, os deixando num tom marrom claro tão bonito...Chrissy percebeu que ele deu um suspiro que murchou os ombros e moveu os cabelos longos que estavam ali. Ele tem dificuldade nesse tipo de coisa ou não quer contar pra ela? - Eu, é, bom - outro suspiro, é cru demais nessas coisas, se sente meio esquisito e completamente sem jeito com essas coisas de conversar sobre a vida, ele nunca tocou tão fundo em feridas desse jeito com ninguém - Meus, huh, meus pais, el...olha, e-eu - não consegue, é difícil demais, nem sabe por onde começar - Foi mal, eu não...

- Ah - ela suspirou baixinho olhando para ele de um jeito meio compreensivo mas ao mesmo tempo curioso - É um assunto delicado?

- Não - não é um assunto delicado, mas contar para alguém é. Nunca se expôs assim, e o círculo de vida dele com os amigos e o tio e todos esses caras durões e crus por dentro, ele nunca precisou conversar de nada disso com ninguém - É que eu, eu não sei, como, é...- não sabe, suspirou de novo.

Don't You Forget About Me - Eddie Munson | finalizadaOnde histórias criam vida. Descubra agora