Lembro bem daquele momento: meu coração ficou gelado e a impressão que tive era de que ele batia bem devagarinho enquanto uma ferida se abria. Senti como se alguém estivesse me machucando. Eu saí da cafeteria com menos pressa do que o tempo exigia, como se eu não estivesse precisando correr contra os minutos que passavam, e, enquanto andava pelo shopping, o mundo parecia não ter som. Lembro como eu sentia meu peito apertado e tentava segurar as lágrimas nos olhos – sem sucesso, elas desciam com a mesma facilidade que meu sorriso abria quando eu costumava pensar em Carlos Sainz.
Parada enquanto a escada rolante descia, eu observei lá de cima os vários casais andando tranquilos pelo espaço e senti um misto de coisas: inveja, raiva, tristeza, revolta. Ninguém ali precisava ir às pressas pro aeroporto porque a pessoa que gostava estava indo embora; nenhum deles precisava esperar o dia passar para falar no telefone pontualmente às dez da noite; ninguém ali precisava sofrer tanto pela espera de um abraço. Diferente de mim, todos podiam virar pro lado e olhar pro rosto de quem eles desejavam, segurar a mão, sentir o cheiro.
Enquanto andava até a saída, percebi que nunca poderia ter um dia normal com Carlos sem precisar planejar com antecedência os detalhes: nunca poderia ir fazer compras no mercado no sábado à tarde, ligar pra ele ir me ver no meio da semana e nem tomar café na padaria na manhã de uma segunda-feira qualquer. Tudo precisaria ser calculado, planejado e agendado, e qualquer coisa que desse errado causaria um impacto no nosso relacionamento.
Dentro do táxi, eu olhava pela janela pensando que nunca me sentaria ao lado de Carlos enquanto ele dirigia para algum lugar no centro da cidade, nunca viajaríamos juntos no final de semana, nunca compartilharíamos um almoço em família. Àquela altura eu já chorava de forma intensa enquanto me dava conta do que estava vivendo. Me apaixonar por Carlos Sainz foi uma ilusão bonita e o meu sofrimento estava apenas começando.
Em um dado momento, fiquei encarando os presentes no meu colo e lembro como tudo dentro de mim estava repleto de confusão, pois parecia que eu não tinha o direito de me sentir daquela forma. Como poderia estar vivendo algo daquele nível conhecendo Carlos há tão pouco tempo, sem nunca tê-lo visto? Mas, também, e a vez que passamos o dia no mesmo espaço sem nos esbarrarmos nenhuma vez? Por que a vida nos colocou no mesmo caminho de novo depois desse desencontro? Como aquilo poderia não ser real, se a gente compartilhava de uma conexão surreal, fazendo a distância parecer um mero detalhe? Me soava um exagero, ao mesmo tempo que me enchia de conforto. Mesmo que já tenha repetido isso zilhões de vezes, aqui vai mais uma vez: nunca vou saber explicar o que aconteceu, mas foi especial.
Saí do carro contra a minha vontade quando o motorista parou na porta do aeroporto, e cada passo que eu dei também foi contra minha vontade: eu não queria estar lá. Todas as vezes que meus pés pisaram o chão e avançaram no caminho, o peso tomou conta das minhas pernas e maltratou meu coração. Eu não queria estar lá, eu não queria ver Carlos – não porque não desejava conhecê-lo, mas porque eu não queria encarar as circunstâncias. Eu não queria estar lá, não queria vê-lo sabendo que seria a primeira e a última, não queria abraçá-lo sabendo que seria só ali, próximo à sala de embarque, próximo ao avião que o levaria para longe de mim.
Lembro que fui direto ao banheiro para olhar minha situação e me vi com o rosto inchado, vermelho, os olhos enormes entregando que minutos antes eu havia chorado como um bebê. "Por que isso está acontecendo?", eu pensava. Esse foi um dos questionamentos que ficou na minha cabeça por bastante tempo depois do fim.
Sentada em uma das poltronas do saguão, eu observava o fluxo de pessoas ao meu redor enquanto aguardava a chegada de Carlos. Por um minuto, me perguntei se a gente realmente se encontraria, se ele não iria passar direto e ir embora sem falar comigo. Já fazia cerca de meia hora daquela ligação e eu estava no aeroporto há dez minutos, nesse meio tempo não recebi nenhuma mensagem de Carlos – não era um tempo longo, mas eu estava ansiosa. Tentei então me distrair com as telas exibindo os embarques e desembarques, mas foi como um soco no estômago: rapidamente identifiquei um voo para Madrid marcado para às 17h30. Eu não tinha dúvidas de que era aquele.
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Pelo telefone | Carlos Sainz
Romantizm"Carlos era observador e detalhista. A risada dele era gostosa, calma e seu sotaque me deixou a ligação inteira com um sorriso bobo no rosto. Com a luz apagada e sentada no parapeito da janela, eu desfrutei de uma longa conversa com Carlos até quase...