Xeque-mate

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Eu estou tamborilando os dedos no apoio da cadeira enquanto encaro o lado de fora: os aviões estão todos parados lado a lado e a pista cada vez mais se enche de neve. Respiro fundo, minha cabeça dói e eu estou irritada. Olho ao meu redor e a quantidade de pessoas me deixa nervosa, o aeroporto está parecendo um formigueiro e parece que não vai parar de encher. Esse pessoal não recebeu um aviso de voo adiado ou algo assim?

São quase nove da noite e eu estou aqui desde às cinco da tarde depois de quatro horas de voo vindo da Cidade do México. Eu poderia estar nostálgica olhando fotos da minha viagem divertida, lembrando das visitas a museus, restaurantes apimentados e noites calientes com Jose – o guia turístico, mas estou cansada e estressada demais para pensar nisso. "Quero minha casa", é tudo que consigo pensar.

O falatório incessante de um grupo de pessoas nas minhas costas, as vozes nos alto-falantes repetindo o tempo todo que os caralhos dos voos estão sendo adiados e o barulho insuportável de malas sendo arrastadas me fazem levantar em busca de um lugar mais tranquilo. "Café, eu preciso de um café", converso comigo dentro da minha cabeça exausta. Enquanto ando, percebo que o chão quadriculado em preto e branco quase me dá náuseas, e todo canto que eu olho parece estar preenchido com um mar de gente. Depois de muito andar por esse aeroporto imenso, eu quase ajoelho e agradeço aos céus ao encontrar uma cafeteria sem muita gente, então entro e me sento em uma das mesinhas do canto para observar o vai e vem pelo espaço. Peço um cappuccino com um lanche natural e apoio a mão no queixo, quase dormindo sentada.

O lugar tem um cheiro de café tão gostoso que até alivia o meu estresse, e está muito tranquilo comparado ao movimento de pessoas lá fora. Uma garçonete deixa o balcão e vem andando com a bandeja na minha direção, mas ela acaba desviando para a mesa ao lado da minha. Fico um pouco desapontada e pego o celular para ver o que tem de novidade, porém uma voz rouba com pressa minha atenção:

– Obrigado.

Minha cabeça faz um bum. Você já sentiu que congelou só de ouvir uma única palavra? Parece que meu corpo inteiro paralisou ao reconhecer o timbre grave da voz ao lado, a voz cujo tom eu havia me esquecido. Talvez seja só impressão, mesmo assim eu resisto em olhar a mesa à direita. Fico por alguns segundos presa nessa tensão até criar coragem de virar devagar. Deus, não foi assim que imaginei reencontrá-lo.

Meu corpo inteiro se arrepia e sinto meu rosto esquentar. Estou tão nervosa que ouço meu coração em um tum-tum-tum incessante, rápido demais. Sentado do meu lado, tão perto como desejei por muito tempo depois de vê-lo ir embora; tão perto que consigo ver um curativo em seu dedo indicador, o qual desliza concentrado pela tela do celular. Seu cabelo está cortado como o de um homem que não pode relaxar, e sua barba feita exibe por completo o rosto bonito. O tempo passou por ele: seus traços estão mais fortes e maduros. Sua sobrancelha grossa faz um belo par com os olhos escuros concentrados em alguma leitura. Desço pelo nariz charmoso e a boca entreaberta... Carlos Sainz é realmente uma coisa, é lindo como uma obra exposta no Louvre. E meu coração aperta com vontade de abraçá-lo.

Ele leva a xícara de café à boca sem tirar os olhos do celular; estou atenta a cada um dos seus movimentos como se estivesse hipnotizada. "Pare com isso!", eu penso, mas é impactante demais para simplesmente desviar. Carlos está vestindo uma calça jeans acinzentada, tênis branco e um suéter verde escuro com uma jaqueta cinza por cima. Como é possível alguém parecer tão mudado e na mesma medida também permanecer como era? A gola da jaqueta está dobrada para dentro, sinto uma coceirinha na mão que me pede para ajeitá-la e depois deixar um carinho em sua bochecha. "Ai, Deus do céu. Que isso?"

A garçonete entra em cena trazendo meu pedido e eu rapidamente desvio o olhar quando Carlos nota minha presença. Ela arruma tudo na mesa enquanto eu tento fingir que presto atenção, mas na verdade meu corpo todo está focado nele. Percebo seus olhos sobre mim, e ao mesmo tempo que quero me esconder, também quero ser o centro da sua atenção. Quero ser notada, percebida, vista! Quero que saiba que estou aqui, que sou eu. Sou eu, Carlos, você me reconhece?

Pelo telefone | Carlos SainzOnde histórias criam vida. Descubra agora