I.
Era difícil para a delegada explicar o porquê havia guardado aquele violão durante tanto tempo. Talvez, se questionada, nem ela saberia o que dizer. Poderia tentar justificar com nostalgia, com saudade de um passado que, por muito tempo, ela jurou que não voltaria mais.
Hoje, sentada ali em seu sofá, a mão apoiada no canto da cabeça, prestando atenção em Stenio sentado à sua frente com aquele mesmo velho violão nas mãos, ela poderia responder que mesmo sem saber havia guardado o violão para este momento.
Enquanto as palavras de "não aprendi a dizer adeus" ecoavam pela sala, preenchendo o vazio do silêncio, ela se sentia em casa. Stenio havia melhorado o canto com o tempo e ela já não poderia dizer que ele cantava mal pra caramba, seria mentira.
Ele cantava bem e cantava para ela.
Uma música intimamente deles.
Ela o assistia com o interesse de quem ama, observando o cuidado com que ele dedilhava o violão, a dor presente na voz dele, a maneira como ele fez um leve "não" com a cabeça ao dizer a frase que doía, e que eles nunca foram capazes de cumprir um com o outro.
E deixo você ir.
Eles nunca haviam conseguido dizer um adeus. Todas as despedidas sempre soaram como um "até logo", ou "se cuida até eu voltar". Porque a única certeza ali era essa, eles sempre voltariam.
Normalmente, Helô ficaria confortável com isso. Era assim que eles funcionavam desde a adolescência. Ela poderia culpar a idade depois, mas descobriu recentemente uma nova verdade: ela não queria que ele precisasse voltar, porque ela não queria que fosse embora.
E a realidade disso a pegou desprevenida. Assim como o pensamento completamente maluco que invadia a mente dele.
Eu amo esse homem.
Sem meias verdades, ou frases como "eu me preocupo com você" que ela esperava que ele tivesse entendido. Mas as três palavras inteiras e juntas, que não poderiam significar além disso.
Heloísa Sampaio amava Stenio Alencar.
Mas ela ainda não conseguia dizer.
Olhando para ele, que terminava de tocar com lágrimas nos olhos, a delegada foi invadida pela urgência de tê-lo, de sentir o toque, de ser amada por ele. Queria até dizer uma frase que fosse sem sentido, mas o olhar dela já diria tudo que ele precisava saber no momento, tudo que ela conseguiria dizer agora.
Se inclinando para frente, ela tirou o violão das mãos dele e juntou os lábios deles em um beijo simples, mas completamente desesperado. Sentiu ele retribuir. E foi em busca de mais.
Ela buscava sanar a urgência enquanto ele claramente queria diminuir o ritmo, aproveitar a presença dela, aproveitar que eles estavam ali naquele momento, antes que ela o expulsasse dali, como ele achou que ela inevitavelmente faria.
Mas ela não o fez.
E foi se deitando sobre ele no sofá, sentindo o calor do corpo do ex-marido em cada pedaço seu que ela finalmente entendeu.
Eles sempre seriam completamente um do outro.
II.
Comemorar a deportação de Pilar a prisão dos membros da máfia, não eram nem de longe o motivo pelo qual Heloísa Sampaio beijava Stenio Alencar nesse momento. Ela fingia incomodo ao chegar em casa e encontrar ele ali, mas secretamente ansiava por isso.
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