Era a quarta vez em cerca de duas semanas que Helô passava por aquele restaurante. Era a terceira vez que ela via Stenio almoçando com a mesma mulher. Ela havia percebido que ele estava indo cada vez menos até a casa dela, que as visitas eram menos frequentes... não que ela sentisse falta porque ela certamente não sentia... sentia?
Por mais que tentasse disfarçar e fingir que não, o incômodo no peito apertava. Incomodava. Marcava sua presença. Se fazia sentir.
Não era necessariamente ciúmes, embora tivesse uma pitada disso em seu interior. Era mais a dor de perceber que algo poderia estar, de fato, terminando entre eles. Ela não gostava da sensação.
Virou a rua rapidamente, antes que ele pudesse vê-la, mas a visão da cabeça dele caindo para trás em uma gargalhada com algo que a mulher havia falado a perseguiria por vários dias, ela tinha certeza.
E perseguiu.
Três dias haviam se passado e ao ver Stenio entrando na delegacia ao lado de Moretti para, mais um dos infindáveis depoimentos, ela precisou respirar fundo. Ele estava tão bonito. Como isso era possível?
Os comprimentos foram formais – formais até demais - para ela. A conversa profissional e até as interrupções de Stenio pareciam maia respeitosas, com tom de profissionalismo. Ela definitivamente não gostava da sensação.
- Então é isso, se eu precisar de algum esclarecimento, eu chamo vocês de volta. – disse ela pegando os papéis do depoimento assinados por Moretti, se despedindo de ambos com um aperto de mão.
- Stenio? Posso falar contigo um minuto? – perguntou ela rapidamente antes que ele saísse.
Observou Stenio a olhando com olhar confuso, fazendo em seguida um sinal para que Moretti fosse na frente.
- Diga, Helô... – respondeu ele se sentando, observando Yone sair do ambiente deixando os dois sozinhos.
- Eu precisava falar uma coisa com você – ela olhou para ele, se sentando na cadeira de delegada - será que podemos jantar ou algo do tipo?
- Hoje? – ele olhou para ela confuso. Helô querendo marcar um jantar?
- Tu não pode?- a irritação presente na voz dela. Stenio não costumava dizer não para ela.
- Eu tenho um compromisso, na verdade – ele olhou para ela, uma certa tristeza presente ali, quase palpável - Olha, Helô... eu já te disse que esse inquérito da Brisa não tá comigo, já te disse o conteúdo dele, e não tem mais nada que eu possa fazer pra te ajudar nisso.
- E por que você acha que é sobre isso que eu quero falar?- questionou ela juntando as mãos, se encostando na cadeira.
- E não é sempre sobre isso, Helô? Pra que mais você me procura? – ele olhou para ela desfiando uma resposta diferente, uma resposta que ele tanto queria ouvir - Se for sobre isso, eu não posso te ajudar. Agora se for sobre algo diferente...
Houve um momento de silêncio entre eles. Stenio esperando Helô ter a coragem de dizer que não era sobre isso...ele queria tanto que não fosse sobre isso. E Helô, olhando fundo nos olhos dele, tentando criar a coragem de dizer que não era profissional. Que era sobre eles.
Por que para ele era sempre tão fácil?
- Não – ela completou, olhando para baixo, sem coragem de encará-lo novamente - era sobre isso mesmo.
- Sempre é – o riso dele era triste, ele também olhava para baixo antes de se levantar caminhando até a porta - Tchau, Helô.
Ela tentou responder, mas ele não aguardou a resposta. Helô ficou encarando Stenio seguir para a saída, andando pelo corredor, sem nunca olhar para o lado.