hei de morrer de amar mais do que pude

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Ela se pegava cada vez mais pensando nele. Era incômodo, irritante, nada prático e absolutamente... maravilhoso. Helô tentava ainda manter a postura durona, tentava fingir no dia seguinte que absolutamente nada aconteceu, que os beijos não significaram nada, que os arrepios eram pelo vento, que a mera lembrança das mãos dele percorrendo o corpo dela em nada a afetavam.

Mas estava sendo cada vez mais difícil. E, sem perceber, ela começou a procurar mais. Se ele demorava para fazer alguma visita inesperada, ela o chamava para jantar – profissionalmente - como quem não quer nada. Ela começou, também, a sentir falta. E essa era a parte mais perigosa de todas.

Hoje, era um dos dias em que ela estava, simplesmente, com saudade. Ao contrário de Stenio que gritava aos quatro cantos que sentia a falta dela e aparecia sem mais nem menos, colocando Tim Maia para tocar na sala...Heloísa não conseguia ser assim.

Ela era vulnerável quando estava com ele, havia a segurança da vida a dois que permitia isso. Assim, com eles separados, mesmo com toda a história que os cercava, ela se continha. Se permitia os carinhos nos momentos de resvalo e fraqueza, mas não passava disso. Ela havia – a muitos anos e alguns divórcios – definido os limites dela.

Por isso, mais uma vez, ela se pegou encontrando no inquérito de Brisa a desculpa perfeita para ir atrás dele. Estava até com saudade da casa dele, afinal, tinha gostado do apartamento do advogado, embora jamais fosse admitir isso.

Ela foi até o quarto se arrumar, colocando joia por joia com cuidado, pensando nas que ele sabidamente mais gostava. Procurando na gaveta uma caixa específica, Helô encostou em uma outra no fundo da gaveta. Assim que sua mão encostou no tecido aveludado, ela reconheceu o que era. O coração apertou involuntariamente.

Se sentando na cama, ela abriu a caixinha pela primeira vez em meses. Helô costumava olhar para as duas alianças ali guardadas o tempo todo. Ela poderia tentar se enganar e dizer que eram um lembrete de erros do passado, para que ela não os cometesse de novo. Uma lembrança viva do que não fazer.

Mas ela sabia que a mentira era inútil. Sabia que abria e encarava os anéis pensando em todo o mundo de possibilidades que eles nunca souberam construir. A vida que eles nunca conseguiram levar. O amor que nunca havia sido suficiente entre eles. Olhava para os anéis como quem olha numa tela para o passado, e entre cada briga e discussão se via sentada ao lado dele no sofá, ou deitada ao lado dele na cama.

Nessa cama.

E em tantas outras antes dessa.

Porque nem tudo havia bom, mas definitivamente nem tudo havia sido ruim. E das certezas que ela tinha na vida, a mais forte é que Stenio havia levado um pedaço dela consigo quando foi embora. E esse pedaço só voltava a se encaixar quando eles estavam juntos. E ela sabia que era recíproco.

Olhas para as alianças era o hábito que ela havia mantido para tentar silenciosamente matar a saudade. Saudade do que eles um dia tinham sido, e para pensar sobre tudo que aquilo que nunca conseguiram ser.

Era agridoce. E ela nunca conseguiu parar.

Até ele voltar.

Desde a volta de Stenio, ela não havia mais aberto aquela caixinha para encarar as alianças. Hoje, ela preferia encarar...ele. Olhar no olho, sentir o calor das mãos e o cheiro familiar. Nem todas as horas, dias e meses encarando as alianças poderiam fazer jus a história deles.

Será que ele pensava nela também?

Ela sabia que a resposta era sim, ele não fazia questão de esconder. A maneira aberta com que ele a amava a deixava sem fôlego as vezes.

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