Vinte e quatro

179 25 8
                                    

— Millie, podemos conversar?

Senti meu peito se torcer e retorcer quando escutei sua voz calma e baixa na porta.

— Eu vou sair — Finn me olhou com um sorriso triste e correu para fora do seu próprio quarto, me deixando sozinha com a Sink.

— Entra — Disse olhando para meus pés cobertos por meias roxas.

Sadie entrou no quarto e fechou a porta atrás de si, parando em pé por algum lugar do quarto.

— Sempre pensei que estaríamos tendo essa conversa no seu quarto, não no do Finn — Soltei uma leve risada nasal com sua fala.

— Se ainda tem medo de bonecas iria surtar no meu quarto, vai por mim, é muito melhor olhar para a coleção de barcos dele — Levantei meu rosto para encarar a decoração peculiar que meu irmão escolheu para seu quarto.

— Não vai comentar sobre eu pensar que iríamos conversar? — Sadie deu um passo em direção a cama em que eu estava sentada.

— Se eu disser que nunca pensei nisso seria mentira.

Encarei Sadie com vontade pela primeira vez, e Deus, como ela estava diferente.

— Com quantos anos está? — Perguntei analisando seu rosto com calma.

— Deveria se lembrar que eu tinha quase dezesseis a quatro anos atrás.

— Sabe, pra alguém que tem uma banda você se veste bem mal.

Ela estava com um cabelo maravilhoso, curto e ousado, mas, suas roupas deixavam a desejar muito. Me lembro de que ela era uma menina com um estilo alegre e colorido, sempre de vestidos e qualquer coisa com estampa de flores.

Mas agora ela estva usando uma calça moletom bege totalmente desbotada e uma blusa de botões amarela, que parecia de longe o dobro do seu tamanho.

Que crime.

A garota em minha frente suspirou e se sentou ao meu lado sem que eu a convidasse, mas não falei nada a respeito.

— Se eu falar que me visto assim porquê quero seria uma baita mentira — Seus olhos azuis me encararam com a mesma intensidade de anos atrás, ela me deu um sorriso simples, me mostrando seus dentes quase perfeitamente alinhados.

— É a sua vó que te obriga a usar isso? — Eu falei calmamente ainda a olhando, por pouco meu tom sai como uma afirmação.

— Brown, a minha avó morreu faz pouco mais de dois anos.

Coloquei aos mãos na boca em descrença. Eu definitivamente não sabia o que falar para a ruiva em minha frente, que ainda mantinha um sorriso no rosto.

— Me desculpa, eu não sabia — Disse ainda tampando a boca — Sinto muito, de verdade.

— Tudo bem, eu sou adulta, consigo levar isso numa boa — Sadie colocou a mão em meu ombro, tentando me relaxar, mas isso só me deixou mais tensa.

Seu toque era suave, realmente tentava me passar conforto, mas eu não conseguia me sentir totalmente a vontade com isso.

— Não tenho dinheiro para roupas novas, eu uso tudo que consigo das doações da igreja.

— Você ainda frequenta a igreja? Mesmo que você... sabe — Reprimi os lábios — Não seja mais obrigada.

  — Não tive escolha, se não fosse a igreja eu já teria morrido de fome a tempos — Ela suspirou mais uma vez.

— Sua situação está tão ruim assim? Sem querer ofender.

— Não me ofende você dizer a verdade. Minha situação poderia ser pior — Ela fechou os olhos e se deitou na cama — Eu moro em uma casa bem pequena perto do centro, divido aluguel com o baixista da minha banda.

— Vocês começaram a banda como uma tentativa de recomeço? — Perguntei com medo de estar falando besteira.

— Millie — Sadie me puxou pelo braço, me deitando na cama ao seu lado — Você sabe que eu sempre gostei de música, sempre sonhei em ter uma banda ou uma carreira solo, não comecei a banda com o intuito de apenas dinheiro. Mas sim, eu espero que isso seja um recomeço.

Me virei para a garota que encarava o teto com várias embarcações pintadas.

Ela continuava extremamente linda.

— Mas chega de falar de mim, não é mesmo? — A ruiva virou para mim, fazendo meu corpo gelar — Como está a sua vida?

  Me remexi na cama e fechei a cara, seria vergonhoso contar que me tornei aquilo que ela mais lutava contra.

— Eu sei que fez péssimas escolhas, Millie, todos nós fazemos.

— Não acho que você seja a pessoa ideal para falar de erros — passei a encarar o teto também — Eu fiquei muito abalada quando você foi embora.

Ficamos em silêncio por um tempo depois disso, desfrutando apenas dos pássaros cantando nas árvores.

Que diabos de hora é agora?

— Pensei que fosse ficar brava comigo — Sua voz saiu como um Sussurro, quase como se fosse para eu não ouvir.

— Mas eu estou brava com você, o que fez pensar que não?

— Eu entendo completamente, mas pensei que não fosse nem aceitar me ver — Eu sentia o peso que cada uma daquelas palavras carregava e comecei a me sentir um monstro por fazer alguém pensar assim.

— Sabe, até você abrir aquela porta eu pensava o mesmo — Encarei seu rosto e soltei uma risada simples junto com ela — Eu tenho minhas cotas com você, mas não acho que conseguiria te ignorar assim.

— Eu realmente queria ter falado com você antes, mas...

— Sadie, acho melhor não falarmos disso, não agora.

— Eu sei que você ficou chateada comigo e que ainda está, mas não somos mais duas crianças, e eu acho que você deveria aceitar que nada vai mudar o que aconteceu, muito menos essa conversa.

Me sentei na cama e cruzei os braços, pronta para começar uma birra, mas isso seria a mais pura infantilidade.

— Millie, minha avó tinha descoberto tudo.

.
.
.

NÃO REVISADO

Que a Igreja pegue fogo {SILLIE}Onde histórias criam vida. Descubra agora