Vinte e seis

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Coloquei um cigarro na boca mas não o acendi.

Eu estava na mesma tábua de madeira que eu e Sadie fizemos de prancha a algum tempo atrás, exatamente onde ela parou quando atingimos uma pedra.

Je eram quase duas da tarde, o sol estava fazendo seu trabalho, quase acendendo meu cigarro apenas pelo seu próprio calor.

Eu não fazia ideia de para onde deveria ter ido procurar pela ruiva, então estava torcendo que ela ainda viesse a esse lugar para pensar, estava esperando que ela me encontrasse.

— Está perdida? — Dou um sorriso quando escuto exatamente o que me mantinha esperando a várias e várias horas.

— Talvez um pouco — Não me virei, mas sabia que Sadie estava ajoelhada atrás de mim.

Me surpreendi quando sua mão apareceu e acendeu meu cigarro com um pequeno isqueiro.

— Você anda fumando? — Perguntei assoprando fumaça para o mato.

— Continuo detestando quem faz isso.

— Não respondeu minha pergunta.

A de olhos azuis se sentou perto de mim. Ela estava fora da madeira, sentada bem em uma pedra.

— Eu não fumo — Ela arrancou o cigarro da minha boca — E acho que você não deveria também.

Eu fiquei quieta esperando o momento que ela colocaria o maço na boca e o tragasse como de costume, mas ela não fez isso.

— Está se matando — Me devolveu o cigarro.

— Não vai me impedir? — Olhei para ela com uma sobrancelha erguida.

— Você já não é mais uma criança — Sink em um segundo estava me olhando com um sorriso convencido, e no outro estava arrancando aquilo de minhas mãos e atirando no mato.

— Pensei que eu já não fosse mais uma criança — Sorri sem mostrar os dentes e me joguei de costas na grama feia e seca.

Ficamos em silêncio por um tempo, não era um silêncio ruim, eu estava me sentindo muito bem apenas ouvindo sua respiração e as folhas se remexendo com o vento.

— Me desculpa ter criado aquele clima na sua casa, espero que tenha ficado tudo bem entre você e sua mãe.

— Ah, tudo bem. Eu não moro mais lá — Repondi olhando para o céu, sem dar a devida atenção ao assunto.

— Como assim? Onde você mora agora?

Encarei a ruiva com sorriso — Eu moro em todo lugar.

Ela fechou os olhos e respirou calmamente algumas vezes antes de prosseguir ainda sem abrir os olhos.

— O que você fez, Brown?

— Acertei minhas contas com ela, Sink.

Ficamos em silêncio outra vez, mas senti que a Sadie estava um tanto quanto desanimada com o rumo que a conversa tomou.

— Ei, tudo bem? — Me sentei novamente e coloquei minha mão direita em seu ombro.

— O que aconteceu depois que eu saí?

Comecei a arrancar alguns matinhos do chão enquanto pensava na melhor forma de dizer que me assumi e me expulsei de casa em questão de minutos.

— Bom... — Soltei uma risada nasal — Meio que minha mãe ficou um pouquinhozinho brava com você já que você... gosta de meninas.

Olhei para a ruiva que estava em silêncio com os olhos arregalados.

— E eu meio que te defendi e assim acabei assumindo que gostava de você.

No mesmo instante Sink se engasgou com o nada e começou a tossir desesperadamente.

— Você está bem? — Ameacei levantar quando a outra ficou de pé e começou a girar quando tossia.

— Sim — Fez uma pausa — Eu estou bem.

Sadie se sentou novamente ao meu lado e me encarou espantada por tempo mais que o necessário.

— Você quer me dizer alguma coisa? — Indaguei quando comecei a me assustar.

— É só que... — Seu olhar se tornou amedrontado e inseguro — Você gostava de mim?

Quem estava espantada agora era eu, me lembro bem do dia em que ela me disse que iria se mudar, Sadie e Carlos estavam juntos, ele contou sobre a música para ela.

— Sadie — Ri de desespero — Você já sabia.

— O que? — A garota soltou uma lufada de ar — Eu sabia?

— Você não sabia?

Ficamos as duas em silêncio, com os olhos arregalados e corações disparados. Eu me sentia com os 14 anos outra vez, voltando no dia em que peguei meu ukulele e declarei meu amor em forma de música.

— Eu não fazia ideia disso. Se soubesse jamais teria...

Sadie deixou a frase interminada, talvez não sabia do meu conhecimento sobre o que aconteceu naquele dia.

— É verdade que você foi internada? — Perguntei tímida enquanto estalava meus dedos.

— Era exatamente sobre isso que eu ia te falar naquele dia — Ela parou por um momento — Millie.

Olhei para a de olhos azuis que me encarava séria.

— Eu estava tentando me despedir.

" Eu não vou poder falar com você tão cedo se não for agora."

Me lembrei do momento que escutei isso pela primeira vez, a sensação de abandono que senti ficou marcada em meu peito desde aquele dia. Como eu pude ser tão burra de não a deixar explicar direito?

— Deveria ter se explicado melhor naquela hora, eu nunca iria imaginar isso — Me levantei ficando em pé na velha tábua.

— Eu não sabia como dizer que ia ser internada por ser lésbica sem dizer que te amava — Ela ficou em pé também, começando a nivelar sua voz com a minha.

— Isso não importa agora, não nos amamos mais — Disse colocando um basta no começo de uma possivel discussão.

Sadie ia abrir a boca para falar alguma coisa mas desistiu, focando apenas em me encarar com um olhar perdido.

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NÃO REVISADO

Que a Igreja pegue fogo {SILLIE}Onde histórias criam vida. Descubra agora