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Recebi alta durante a madrugada, sendo a carona de Joseph às duas e meia, com uma bota imobilizadora no pé torcido e uma entorse de segundo grau. Um ligamento no lado interno do meu tornozelo foi rompido, o que significava que dias mais tarde eu precisaria de fisioterapia, e por enquanto só de muito descanso, cama, e gelo a cada meia hora. Que bom que posso digitar meus artigos deitada.

Minha cabeça estava quase tão pesada quanto o meu pé direito. As ruas de Londres ainda estavam tão movimentadas quanto no início da tarde, quando dirigimos até o hospital em um desconfortável silêncio; e agora vários carros passavam e pessoas bêbadas pegavam táxis na saída dos pubs. Algumas ruas cheiravam a vinho barato e chuva, e um morador de rua gritou que me amava ao me ver pela janela do carro num semáforo vermelho.

Meu motorista — o meu esposo de mentirinha que descobriu que o meu nome também era uma mentirinha — não disse nada durante a viagem. Eu cochilei duas vezes, até onde me lembro. O painel estava cheio de analgésicos e antiinflamatórios, como uma farmácia improvisada sobre quatro rodas. No banco de trás, o par de muletas cor-de-rosa com o qual Joseph apareceu de repente no hospital, horas antes dali, depois de levar Wesley e Olliver em suas respectivas casas.

Wesley e Olliver, que desafortunadamente descobriram que o nosso casamento é falso.

Não estou querendo ser dramática, mas, caralho, tudo está desmoronando. Pouco a pouco me destruindo e levando comigo tudo o que está ao meu redor, tudo que eu toco, como a porra de um tsunami. Eu já percebi isso. Agora me resta saber o que fazer. Devo nadar ou deixar ir?

Infelizmente, para dar entrada no Hospital St. Thomas, foi preciso dar informações pessoais — como "você é casada?" — para um atendente com a idade da Bobbi mascando chiclete e com cara de visível tesão para o Joseph. Se um de nós dois dissesse que sim, teríamos que sacar a certidão de casamento — certidão esta que, opa, é inexistente. Então Joseph foi sensato ao dizer que não, e entregar a minha identidade; aquela que buscou ao subir as escadas e onde viu que não tinha nenhuma Mary Dawson, enquanto Olliver e Wesley cuidavam de mim. E eles dois, meus guardiões, estavam bem atrás e ouviram isso.

Eles não disseram nada, mas me encararam com tamanha curiosidade que cheguei a me sentir um ratinho de laboratório, ao passo que os dois enfermeiros me levavam numa cadeira de rodas até uma técnica radiologista. Esse foi o primeiro momento em que fiquei sozinha desde que aqueles três homens me encontraram caída na sala de estar, pois Joseph levou os dois para longe e eles sumiram por uns trinta minutos. Fiquei repassando todas as cenas na minha cabeça, desde a briga no jardim à queda patética que me fazia esquecer da dor por um instante só para poder morrer de vergonha, todas as vezes em que eu lembrava.

Quando retornaram, eu já estava sendo avaliada por uma médica ortopedista, e todos nos entreolhamos como se estivéssemos acabando de nos conhecer. Eu estava envergonhada por ter sido descoberta, e não conseguia olhar para Joseph, especialmente temendo que ele estivesse com raiva da minha mentira — depois descobri que tudo o que ele parecia estar era confuso.

A primeira pessoa que verbalizou algo foi o Wesley, assim que a médica saiu.

— Todo o álcool do meu corpo evaporou quando eu te vi chorando perto da escada, mas... — ele soltou um suspiro pela boca. — Porra, gata, esposa de aluguel? Eu com certeza não estava preparado pra isso.

A gente riu.

Joseph ficava pairando ao meu redor como o grande protetor que, naturalmente, era. Eu me segurei nas muletas para sair da garagem e entrar na casa, mas suas mãos permaneciam estendidas, prontas para me segurar, caso eu caísse. Ele parecia cansado. Eu parecia cansada. E me sentia culpada por estar dando tanto trabalho sendo apenas uma intrusa em sua vida. Eu não queria ser um encosto, principalmente porque estava aqui, teoricamente, para ajudar.

meu nome (não) é Mary || joseph quinnOnde histórias criam vida. Descubra agora