15

211 24 178
                                    

Não tinha nenhum cadáver no sofá-cama hoje. Nenhum corpo vivo pela casa, também. A louça do jantar de ontem estava secando na pia, e tudo estava tão organizado e quieto quanto sempre, com o acréscimo de mais comida na geladeira e nos armários. Dei uma passeada e conheci a quadra de esportes, que também estava vazia. A área da piscina não estava diferente. Eu estava sozinha.

Escrevi mais de um dos meus artigos e participei de um facetime com uma antiga orientadora da faculdade. Mandei mensagem para minhas mães e para Bobbi. Marquei um almoço com a tia Louise. Preparando o almoço, fiquei pensando em fazer a mais para também alimentar o monstrinho que vivia naquela casa bem antes de mim, mas por sorte optei por não fazer, pois ele não apareceu. Nem durante o almoço, nem depois.

Deixei tudo que sujei novamente brilhando, e resolvi passar um tempo na piscina tomando um sol para tentar — pela milésima vez — ficar bronzeada. Com muito protetor solar, é claro, porque não quero desenvolver câncer de pele, especialmente porque eu tenho muitas sardas no tronco, e uma vez li uma meta-análise que dizia que as melanoses solares têm associações — fracas, mas positivas — com carcinoma basocelular, com OR em torno de 1,5. Resumindo: perigoso.

Sempre estive de olho na porta, mas ela não foi aberta em nenhum momento; nem por Joseph, nem pelo casal que havia chegado às 9 da noite de ontem e capotado na cama, chapados — o que não os impediu de sair novamente hoje quando o sol estava nascendo; pude ouvir o som do carro acelerando do quarto, apesar do ruído forte do aquecedor.

No final da tarde, só fiquei vermelha, como sempre, e não bronzeada. Agora tenho um desenho branco de biquíni ao redor da minha pele fortemente rosada. Podemos dizer que eu fiquei com inveja da Mãe 2.

Tomei banho; digitei mais do meu artigo acadêmico, com uma toalha enrolada na cabeça; jantei sozinha, vendo Mandalorian na tevê; e estava dormindo na cama, com o celular rodando um episódio de Friends, caído perto do meu rosto, quando Joseph chegou, atravessando o escuro do quarto. Eu estava meio acordada e meio dormindo, mas lembro-me perfeitamente de sentir aquele perfume mesclado à nicotina invadindo o quarto por inteiro, assim que a porta foi fechada.

Perto do meu ouvido, Chandler Bing negava ter dito que ama a Monica Geller, naquele episódio em que ela coloca um frango cru na cabeça. Lembro-me de dizer algo como:

— Tem risoto no micro-ondas.

E ele deve ter respondido algo como:

— Eu já jantei.

Em seguida, atordoada, pensei ter visto o vislumbre de sua silhueta pegando o meu celular, bloqueando, e colocando sobre a escrivaninha (ou escrivanona); no entanto, logo voltei a fechar os olhos, derrubada graças ao sol que peguei à tarde, sentindo-me especialmente quente, só podendo ouvir a porta do banheiro ser fechada e o chuveiro ser ligado.

Essa coisa de Joseph sair sem aviso prévio e só voltar à noite aconteceu no dia seguinte, e então no outro, e no outro.

É claro que não comentei nada, afinal, não estava em posição para isso. Era sua esposa, mas não de verdade, e além disso, ele estava me deixando alimento, chaves, uma porção de remédios para dor de cabeça e uma mansão inteira à minha disposição. Ele tinha comprado as minhas férias, no fim das contas, né? Não fiquei, de todo, sem interação social, pois muitas vezes Michael e Giulia estavam em casa, conversando comigo e me convidando para sair. Nós três chegamos à conclusão de que Joseph estava passando bastante tempo com a vovó, e por isso nunca se encontrava em casa.

Num desses dias, até encontrei algumas libras dobradas na mesa de centro da sala, que supus terem sido deixadas para o caso de eu precisar de alguma coisa; não sabendo ele que havia sobrado bastante do dinheiro da dívida estudantil — que ele não acertou o valor em cheio —, e que eu estava usando-o para o que eu precisava; como absorventes, por exemplo. Planejava devolvê-lo tudo o que realmente restou ao final deste mês. As libras deixadas por ele permaneceram dobradas na mesa de centro.

meu nome (não) é Mary || joseph quinnOnde histórias criam vida. Descubra agora