Capítulo um: I had a feeling so peculiar

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Minha mãe me disse certa vez:

— Você sabe que tem um lar quando vai embora e sente saudade.

Precisei ir para países e continentes diferentes até descobrir que ela falava sobre Woodvale. Eu era jovem na época, apenas 18 anos, e aos 33 anos me perguntava como demorei tanto tempo para perceber que o que procurava estava na mesma bucólica e minúscula cidade em que nasci. Os meus amigos de Nova Iorque não entenderam quando fiz minhas malas e disse que retornaria para casa, mas eles nunca pisaram nessa terra para compreender.

Woodvale era o meu lar. Sempre foi.

Cinco anos depois de retornar, eu havia me estabelecido. No domingo da manhã de 1° de outubro, estava a caminho de mais um dia de trabalho na minha própria livraria, a "My Words Worth", nome que inventei em homenagem a um dos meus poetas favoritos — William Wordsworth. As três palavras também significavam "minhas palavras valem a pena", o que se encaixava com o conceito da livraria: priorizar poetas e escritores locais, que muitas vezes não encontravam espaço no competitivo mercado editorial.

A caminhada da minha casa até a Rua Principal era de apenas quinze minutos no orvalho da manhã, com o perfume da dama-da-noite persistindo no amanhecer um pouco mais. Eu gostava de assistir ao despertar vagaroso dos vizinhos, as janelas abertas, cortinas puxadas para o lado, cachorros no primeiro passeio do dia e o aroma de café quente. Sobre o telhado ébano das casinhas, além das colinas enevoadas, o céu diurno abria-se em tons de lilás e azul-claro.

Quando alcancei o centro de Woodvale, outros lojistas como eu abriam suas lojas enquanto conversavam uns com os outros — com a fumaça de suas bocas visível no ar por um instante. Era outono, afinal. Pude ver que alguns dos postes da cidade, que eram antigos e feitos de ferro fundido com cinco cúpulas, ainda estavam acesos.

A fachada da minha livraria era verde-claro com o letreiro em letra cursiva e dourada. O interior era aconchegante, enfeitado com abóboras, pergaminhos falsos e alguns filtros de conchas pendurados no teto. Um cheiro de madeira misturava-se ao perfume das velas aromáticas de cravo e canela, e embora houvesse espaço o suficiente para circulação, havia uma bagunça estética agradável no ambiente. Pilhas de livros antigos com prateleiras separadas por gênero e ordem alfabética resumiam todo o espaço.

Era exatamente como sonhei. Tudo sobre essa pequena loja dizia "Maude Bell" e eu não poderia estar mais satisfeita. Havia um sino sobre a porta enfeitado com ramos de visco e um espelho oval antigo ao lado que usei para observar minhas roupas por um instante.

Eu vesti uma calça marrom-claro de veludo cotelê, um par de botas pretas e um suéter branco da Sinéad O'Connor. Também optei por um chapéu de crochê que eu mesma confeccionei para se parecer com um cogumelo amanita muscaria. Meu cabelo acaju estava solto e um tanto bagunçado, mas com o seu tamanho e grossura, eu com frequência me encontrava com preguiça de escová-lo.

Passei um pano nas superfícies para tirar o pó e varri a entrada da livraria. Depois que tudo estava ajeitado, me sentei atrás do balcão com uma agulha de crochê e parte do cardigã que eu estava criando. Ele era perolado, com gola azul-escuro e botõezinhos.

Alguns clientes vieram ao longo da manhã em busca de livros ruins que estavam populares na Internet. Contudo, eram rostos conhecidos, moradores da cidade. Os turistas começariam a chegar apenas mais tarde — outubro era a única época do ano que as pessoas queriam ficar aqui por mais de dois dias para aproveitar o Samhuinn.

Pouco após o almoço, eu parei o crochê e busquei o livro que estava lendo. A Vida Secreta das Árvores explicava sobre como as florestas eram superorganismos semelhantes à formigueiros, que trocavam nutrientes com outras árvores e até mesmo mantinham troncos vivos por décadas; as faias, por exemplo, bombardeavam uma solução de açúcar para troncos cortados. Era fascinante.

WOODVALE • tswiftOnde histórias criam vida. Descubra agora